O presidente Lula (PT) começa o segundo semestre com uma série de desafios para manter a sintonia com a esquerda.
A relação com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), a cobiça do centrão por ministérios comandados por mulheres e a sucessão de Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal (STF) representam temas espinhosos que podem frustrar a base mais fiel do petista.
A recente invasão de terra pelo MST na segunda-feira (31) sob a acusação de que o mandatário não cumpriu de acordo Matheus Teixeira e Marianna Holanda, da Folha, um acordo firmado em abril foi uma das mostras de que Lula enfrentará percalços até com o eleitorado que não se distanciou dele nem no momento mais difícil de sua trajetória política —a prisão no âmbito da Lava Jato. O MST desocupou a área no mesmo dia.
Nesta quarta-feira (2), o ministro Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário, chamou a ocupação na fazenda da Embrapa em Petrolina (PE) de protesto e disse que os integrantes do movimento estavam “ansiosos”.
O movimento historicamente foi próximo a Lula e ao PT, mas desde o início do ano tem ampliado as invasões. Interlocutores do petista reagiram mal. Eles alegam que o movimento não teve paciência com o governo federal.
Integrantes do MST, porém, lembram o histórico da entidade na defesa de Lula, refutam o argumento governista sobre a lentidão do aparato estatal e cobram empenho do presidente para atender suas demandas.
Outro teste com o campo progressista diz respeito à negociação para ampliar a presença do centrão no Executivo. O PP e o Republicanos articulam nos bastidores para assumir ministérios que atualmente são ocupados por mulheres. Dessa forma, Lula terá que encontrar uma forma de abrir espaço para novas siglas no Executivo sem reduzir a participação feminina na Esplanada, caso não queira enfrentar críticas de sua base.
Desafio parecido ele terá na escolha da segunda vaga no STF que será aberta em seu mandato. Os candidatos preferidos de Lula são homens, mas ele enfrenta pressão para substituir a ministra Rosa Weber, que se aposenta em outubro, por outra mulher para não diminuir o número de mulheres na corte.
A representação feminina no tribunal é baixa: atualmente são 2 mulheres e 9 homens.
A avaliação de interlocutores do Palácio do Planalto é que os quatro nomes que despontam na frente para o posto são homens.
Os ministros da Justiça, Flávio Dino, e da AGU (Advocacia-Geral da União), Jorge Messias, são vistos como favoritos no entorno de Lula. Isso porque o presidente costuma afirmar em conversas reservadas que pretende escolher alguém com quem tenha relação direta e não precise de intermediários para manter contato.
Outros dois que estão no páreo são o presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Bruno Dantas, e o corregedor nacional de Justiça, Luís Felipe Salomão. Eles tentam se viabilizar na disputa por terem melhor relação com o Congresso.
Recentemente, a pressão pela escolha de uma mulher aumentou. A campanha inicialmente era para que Lula aumentasse a participação feminina na cúpula do Judiciário, mas isso não é mais possível porque na primeira vaga aberta ele indicou seu advogado e amigo pessoal, Cristiano Zanin.
Agora, a pressão é que ele ao menos não reduza a representatividade do tribunal, que já é majoritariamente branco e masculino.
Pessoas próximas de Lula afirmam que o problema é que não há nenhuma mulher que tenha a relação de confiança com o chefe do Executivo que ele quer para o cargo.
A lista de candidatas contém a ministra do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Regina Helena Costa, a desembargadora do Tribunal Regional Federal da 2ª Região Simone Schreiber e as advogadas Dora Cavalcanti e Flávia Rahal.
Em outra frente, uma das maiores dificuldades de Lula será para firmar acordo com o centrão e fidelizar a base no Congresso Nacional. A expectativa é a de que, nessas primeiras semanas de retorno do Legislativo, o chefe do Executivo bata o martelo sobre novas mudanças no ministério.
O problema é que a pressão de partidos do centrão por mais ministérios poderia custar ao mandatário o número recorde de mulheres no primeiro escalão.
Depois de uma novela de mais de um mês, o petista oficializou a segunda troca de seu governo, ao demitir Daniela Carneiro e nomear Celso Sabino no Turismo. Com a mudança, há 10 mulheres nos 37 postos da Esplanada.
O patamar é o mesmo do recorde anterior, da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Mas a cobiça do centrão tem mirado outros cargos ocupados por ministras.
Está na mira do centrão o ministério da Ciência e Tecnologia, hoje chefiado por Luciana Santos. Nessa hipótese, a presidente nacional do PC do B não deixaria o governo, mas iria para o Ministério das Mulheres, que hoje está sob o comado de Cida Gonçalves.
Também está na mira das legendas a presidência da Caixa, sob o comando de Rita Serrano. Essa troca é vista como iminente, de acordo com auxiliares palacianos.
Os dois principais nomes do centrão já tratados no governo como ministeriáveis são os dos deputados André Fufuca (PP-MA) e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE).
Numa reação às críticas pela diminuição da participação feminina nesses cargos, o centrão passou a cogitar indicação de mulheres para os postos.
Diante disso, ganhou força o nome da ex-deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) para assumir a presidência da Caixa Econômica Federal.
Margarete ganhou projeção no Congresso pelas mãos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ele a designou para relatar importantes projetos, entre eles o que enterrou a Lei de Segurança Nacional e o que altera toda a legislação eleitoral.
Ela acabou não conseguindo se reeleger em 2022 e hoje é diretora de Administração e Finanças do Sebrae.