eis suspeitos de espionagem foram presos pelas autoridades alemãs em menos de uma semana. Serviços de segurança da Alemanha veem elo com a guerra da Ucrânia, interesses econômicos e ofensiva contra a democracia.A assessoria de imprensa do Ministério Público Federal da Alemanha está muito ocupada ultimamente. “Prisão por suspeita de atuação como agente de serviço secreto” apontou o título de um comunicado à imprensa divulgado na terça-feira (23).
Era exatamente o mesmo título usado em um comunicado divulgado no dia anterior. Em ambos os casos, os quatro suspeitos envolvidos – três homens e uma mulher – foram acusados de espionar para a China. Um dos casos chamou a atenção por envolver um assessor de um eurodeputado de ultradireita.
Em 18 de abril, já havia sido a vez de as autoridades alemãs anunciarem a prisão de dois homens, acusados de planejarem ataques a alvos militares na Alemanha a serviço da Rússia. Neste caso, a ação foi anunciada com o título “Prisões por atividades de agente de inteligência e associação à organização terrorista estrangeira ‘República Popular de Donetsk’”, em referência ao estado fantoche criado pela Rússia no leste da Ucrânia em 2014 e que foi ilegalmente anexado por Moscou.
Revelações não são uma surpresa
As prisões geraram forte repercussão no meio político e na mídia da Alemanha. “Precisamos finalmente encarar que essa é uma ameaça muito séria e muito real à nossa segurança”, disse o deputado federal Konstantin von Notz, do Partido Verde, e que chefia a Comissão Parlamentar de Controle dos Serviços de Inteligência. “Devemos agir de forma rápida e decisiva, tanto nos procedimentos judiciais quanto na descoberta das estruturas e redes.”
Thomas Haldenwang, presidente do Departamento Federal para a Proteção da Constituição (BfV) – principal agência de inteligência interna da Alemanha, disse em entrevista à DW que isso já está sendo feita: “Nós iniciamos essas investigações – e, quando as evidências ficaram claras, pudemos entregar os casos à polícia e ao Ministério Público”.
As recentes revelações sobre espionagem estrangeira na Alemanha não surpreenderam o chefe do BfV. Sua agência já havia alertado em um relatório publicado em 2023 do que a China era capaz. “As ambições globais da China estão sendo perseguidas para obter cada vez mais poder, e é de se esperar que ela intensifique ainda mais suas atividades de espionagem, bem como busque influenciar atores estatais”, dizia o documento.
Haldenwang também havia falado sobre a ameaça potencial em um simpósio organizado pelo BfV em Berlim, que ocorreu no dia da prisão de três suspeitos de espionagem. Na ocasião, respondendo a uma pergunta da DW sobre a estratégia de espionagem do país, ele disse: “A China quer ser a potência política, militar e econômica número um do mundo até 2049 – esse objetivo está sendo perseguido continuamente – por meios legais, mas também por meios ilegais”.
Alvos: universidades e empresas
A presença de estudantes chineses em universidades alemãs é também um campo fértil para a espionagem. “Essas pessoas são obrigadas a passar informações para o Estado”, aponta Haldenwang. A ministra alemã de Educação e Pesquisa, Bettina Stark-Watzinger, também leva a sério esse alerta: “Não devemos ser ingênuos em nossas relações com a China”, diz a política liberal, que aponta ainda que é necessária uma „avaliação ainda mais crítica dos riscos e benefícios da cooperação, especialmente na ciência e nas universidades”.
Essa também é a opinião do BfV ao analisar a cooperação econômica com a China. A formação de joint ventures e investimento direto chinês na Alemanha têm como consequência a vinda de executivos e outros funcionários da China à Alemanha, aponta Haldenwang, do BfV, que identifica nisso uma porta de entrada potencial para a espionagem: “Os segredos comerciais também podem chegar à China”.
Um espião no gabinete de um político da AfD?
A prisão de um suspeito de atuar como agente chinês nesta terça-feira, no entanto, envolveu diretamente o campo da política alemã, e não o da ciência ou dos negócios. Jian G. era um colaborador próximo do eurodeputado Maximilian Krah, um membro do partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD).
A AfD, que no momento está sendo monitorada em todo o país pelo Departamento Federal para a Proteção da Constituição por suspeita de extremismo, também é rotineiramente de manter laços estreitos com a Rússia.
Entretanto, de acordo com as descobertas dos serviços de inteligência, os motivos da Rússia para espionar a Alemanha são diferentes dos da China. “Devido à guerra conduzida pela Rússia, seria negligente não presumir a capacidade e a disposição de seus serviços de inteligência para conduzir operações complexas na Europa”, apontou Haldenwang. No ano passado, serviços de inteligência alemães já haviam revelado outros suspeitos de espionarem para Russia.
O chefe da inteligência doméstica prevê que a espionagem russa continue a aumentar e que ocorram novas tentativas de recrutamento na Alemanha. Logo após o início da guerra da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, a Alemanha expulsou cerca de 40 agentes suspeitos que atuavam na embaixada russa em Berlim.
Desde então, surgiram relatos de tentativas de Moscou de recrutar russos que vivem na Alemanha. “Mas, até agora, essa comunidade tem se mostrado muito resistente”, diz Haldenwang. Entretanto, há também casos isolados de pessoas desse círculo que são altamente simpáticas a Putin e à Rússia. “Nesse sentido, pode haver uma reserva de pessoas disponíveis aqui que também estão preparadas para agir em prol dos interesses da Rússia.”
Ministra do Interior elogia autoridades de segurança
Após a prisão sem precedentes de seis suspeitos de espionagem em seis dias, a ministra do Interior da Alemanha, Nancy Faeser, fez um balanço positivo: “Nossas autoridades de segurança, sobretudo o Departamento Federal de Proteção à Constituição, reforçaram enormemente as medidas de combate à espionagem. É assim que nos protegemos contra as ameaças híbridas do regime russo, mas também contra a espionagem da China. Os sucessos investigativos atuais demonstram isso”.