Investigado em múltiplos inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tem demonstrado força nas ruas, como ficou claro no ato em apoio a ele realizado em São Paulo, e no Congresso, onde os partidos de esquerda são minoritários, mostra reportagem de Daniel Pereira, na revista Veja. Pautas caras ao capitão, usadas conforme a publicação, para arregimentar a sua base popular e fustigar o governo Lula, têm avançado sem que haja resistência de aliados do atual mandatário, inclusive do PT.
Na última quarta-feira, 20, a Câmara dos Deputados aprovou projeto que extingue a saída temporária de presos em regime semiaberto, exceto, em casos bem específicos, para estudar. Relatado pelo deputado Guilherme Derrite (PL-SP), que se licenciou do cargo de secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo só para participar da sessão, o projeto foi aprovado em votação simbólica, que é usada quando há amplo apoio à iniciativa e os congressistas não fazem questão de registrar seu posicionamento no painel eletrônico.
Líder do governo na Câmara, o petista José Guimarães nem fez uso da palavra durante a discussão do texto, terceirizando a missão para o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), autor do projeto original, apresentado em 2011. Tanto Lula quanto o PT não são favoráveis à restrição às chamadas saidinhas, que dificultaria a ressocialização de presos. Mas, como a segurança pública está no topo das prioridades da população, segundo pesquisa AtlasIntel, o governo preferiu até aqui — com medo de perder popularidade — fugir do debate do tema.
Na Câmara, Guimarães declarou que o projeto das saidinhas não era um assunto do governo. No Senado, onde a matéria também foi aprovada por larga maioria de votos, o líder da tropa de Lula, Jaques Wagner, também lavou as mãos e liberou a bancada a votar como bem entendesse. Caberá ao presidente agora decidir se sanciona o projeto ou se veta. Não será uma decisão fácil.
Setores do governo consideram a restrição à saidinha “populismo penal”, mas têm consciência de que, se houver veto, este será usado pelos bolsonaristas nas redes sociais como evidência de que o PT defende bandido. A questão não é simples assim, mas a honestidade intelectual não faz parte da guerra de narrativas.
Agenda indigesta
Lula gostaria de não lidar com pautas desse tipo, mas ele não terá refresco. O Senado está prestes a aprovar uma proposta de emenda constitucional (PEC) que criminaliza a posse e o porte de qualquer quantidade de drogas. Assinada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a PEC é uma reação a um julgamento em curso no STF que caminha para descriminalizar o porte de pequena quantidade de maconha para consumo próprio.
A proposta já está em discussão no plenário, onde deve ser aprovada com folga. Historicamente, o PT é simpático à descriminalização de certas drogas e alega por exemplo que, com base nas regras atuais, a polícia só prende usuários pobres e pretos, que, ao serem encarcerados, trocam a condição de usuários pela de mão de obra do crime organizado.
O tema é polêmico, e Lula, conhecido pelo pragmatismo, não quer o governo envolvido no debate. Com a popularidade em queda, ele quer evitar a pauta de costumes e os riscos de desgaste que ela representa.