Ex-governador de Minas Gerais, ex-senador, deputado federal e candidato derrotado na eleição presidencial de 2014, Aécio Neves (PSDB), 64, disse em entrevista a Carolina Linhares, da Folha de S. Paulo, que “os ventos mudaram”.
“Acho que o movimento hoje não é de fortalecimento dos extremos, como foi nas duas últimas eleições [2018 e 2022]. O movimento hoje é de uma certa migração ao centro”, diz ele à Folha depois de eleições municipais em que partidos do centrão saíram vitoriosos enquanto o PT de Lula e candidatos apoiados por Jair Bolsonaro (PL) fracassaram.
O deputado afirma que o PSDB precisa conversar “sem preconceito com quem quer se livrar do radicalismo”. Ou seja, com setores que rejeitam Lula e Bolsonaro e mesmo com partidos que integram o governo do petista por pragmatismo e não convicção.
“Pode ser uma utopia, mas minha esperança é que os extremos percam força. E aí temos que estar posicionados para reunificar essas forças no centro, aquelas mesmas que me fizeram quase vencer as eleições de 2014”, completa ele, que aposta no desgaste “da extrema direita e do governo”.
O próprio deputado diz não saber se esse campo terá viabilidade eleitoral em 2026, mas definiu seu papel: “Conversar com essas forças que já estiveram ao nosso lado, tentando reconstruir o centro”.
Segundo ele, o Brasil precisa de um projeto conciliatório e, diz, falar em candidatura presidencial agora inibe essas conversas.
“No final do ano que vem [2025] ou no início do seguinte [2026], vamos ver o que conseguimos de musculatura, quem é o nome que aparece com maior viabilidade para representar essa alternativa. Pode ser do PSDB, mas pode não ser do PSDB.”
Questionado a que irá concorrer em 2026, Aécio responde que perde legitimidade na construção de um projeto se colocar seu próprio nome.
Ele, no entanto, diferencia o que chama de centro e o fisiológico centrão. “O PSDB é diferente porque o PSDB não participou nem de um governo nem de outro. Somos o filho único nessa. […] Ainda acho que o PSDB é essencial ao Brasil”, assinala.
Ele diz ter noção de que teve uma oportunidade em 2014. “Lamento por mim, mas lamento pelo Brasil também, sem falta de modéstia, porque ali o Brasil deu uma guinada, tudo que aconteceu no pós-eleição acabou de alguma forma atingindo a política e a mim pessoalmente.”
“Tenho vontade de voltar a falar para os 51 milhões de brasileiros que votaram em mim para dizer: meu Deus, não podemos sucumbir a isso. Esse eleitorado não pode ser pendular. Vai contra o Lula porque o desgaste era grande, agora vai contra Bolsonaro. E aí? Está construindo o quê? As pessoas precisam acreditar que é viável um projeto ao centro”, afirma o deputado.
Reabilitado após ter sido absolvido, em 2023, pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região da acusação de corrupção passiva no caso da JBS, Aécio está de volta ao jogo.
À frente do Instituto Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, tem conduzido iniciativas para reposicionar o partido no protagonismo da oposição ao PT e, próximo do presidente tucano, Marconi Perillo, participa das decisões de cúpula.
Ele diz que o PSDB precisa “resgatar o DNA de oposição ao PT, mas não é uma oposição que esculhamba, xinga o sujeito de ladrão, é uma oposição que mostra os equívocos do governo”.
Na opinião do deputado, o PSDB errou em 2022 ao ter “subordinado o interesse nacional ao interesse de São Paulo”.
“A megalomania e o egocentrismo do ex-governador [João Doria] levaram à maior derrocada da história do PSDB. Pouco importava o desfecho da candidatura da Simone [Tebet, MDB]. Eles queriam eleger o Rodrigo Garcia em São Paulo, que hoje nem no partido está mais.”
O PSDB amargou seu pior resultado na capital paulista com José Luiz Datena, que terminou com 2% em 2024.
Com apenas 13 deputados federais eleitos em 2022 e 274 prefeitos eleitos neste ano, o PSDB sozinho, nas palavras de Aécio, “não tem condições de conduzir hoje um projeto viável eleitoralmente”.
O deputado, no entanto, evita citar políticos ou partidos específicos que poderiam se unir e não descarta uma candidatura presidencial tucana do governador gaúcho Eduardo Leite, que ensaiou esse caminho em 2022.
“Leite tem altíssima qualidade. O nome dele vai ser sempre colocado. Mas ele tem que surgir como fruto de uma articulação política mais ampla que o PSDB”, observa.
A respeito de Tarcísio de Freitas (Republicanos), Aécio diz ser mais provável que o governador de São Paulo concorra à reeleição.
“Mas nós temos que dialogar com ele também, sabe? Para fortalecer o centro. Se ele faz movimentos claros na direção do centro, temos que conversar. Tarcísio tenta se colocar de forma mais ampla, tenta ser mais amplo que o bolsonarismo.”
Já sobre Romeu Zema (Novo), outro governador de oposição cotado à Presidência, Aécio afirma que ele é “um homem de bem, mas está a anos-luz de compreender o que é governar Minas Gerais”.
“Zema tem suas virtudes, mas é um governo que não deixa nenhum legado, não tem a menor articulação política e no máximo vai deixar uma nota de rodapé na história de Minas”, alfineta.
Em seu sexto mandato como deputado e após ter presidido a Câmara de 2001 a 2002, Aécio diz que “o plenário virou um local insalubre, só tem pancadaria atrás de likes nas redes sociais”. “Acho que o Brasil está à busca desse projeto onde o ódio seja substituído pela conciliação.”
Outro aspecto que notou no Congresso é que “muita gente que se elegeu na sombra do bolsonarismo já está achando que isso não é conveniente para a próxima eleição”.
A respeito do indiciamento de Bolsonaro sob suspeita de participação na trama golpista, Aécio afirma ser “grave atentar contra a democracia ou permitir que se atente”.
“É algo que tem que ser punido. Temos que aguardar que a Procuradoria-Geral da República se aprofunde sobre todas essas investigações que a Polícia Federal fez para definir a extensão da participação de cada um.”
Concentrado em resgatar os antipetistas tucanos que migraram para Bolsonaro e agora o rejeitam, Aécio diz que o fantasma dos últimos anos foi a classificação automática de antipetistas como bolsonaristas e de antibolsonaristas como esquerda.
“Você pode ser contra um e contra outro, como eu sou. Ou sucumbe a um dos dois”, diz ele, acrescentando que não coloca Lula e Bolsonaro na mesma página. “São figuras completamente diferentes na sua história, no seu compromisso com o país.”