Deputado mais votado por São Paulo, Eduardo Bolsonaro dedica-se, por estes dias, a ajudar a reverter a imagem negativa do Brasil por causa das notícias das queimadas na Amazônia e, nessa missão, faz uma espécie de curso intensivo de relações internacionais e das sutilezas que o mundo diplomático adota. Por essas razões, ficou em Nova York depois que o presidente Jair Bolsonaro voltou para o Brasil.
O filho 03 dedicou as horas a acompanhar a agenda do ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e a conversar com todos os diplomatas ao seu alcance, de modo a entender e vivenciar de perto as nuances das conversas diplomáticas, que ele espera que se tornem sua rotina como embaixador do Brasil nos Estados Unidos.
Na sexta-feira, foi a Washington continuar esse trabalho de reversão da imagem negativa. Com o assessor especial da Presidência Filipe Martins, participou de um evento hispânico na Casa Branca. Esperançoso na aprovação do seu nome como futuro embaixador do país em Washington, ele diz que está se preparando para a sabatina: “Serei o embaixador mais cobrado do mundo, alguém tem dúvida de que um espirro meu mal dado lá pode ser explorado de forma negativa pela imprensa no Brasil? Esse será um desafio”, afirma, em entrevista exclusiva ao Correio.
“A ONU, principalmente via comissões, de direitos humanos ou qualquer outra, tem servido como trampolim para bypassar os legislativos nacionais”. Ele também levanta suspeitas sobre a reunião do clima, ocorrida na segunda-feira da semana passada. “Parece que foi uma coisa arquitetada para sair uma foto do Brasil como sendo intransigente, quando, na verdade, fomos impedidos de participar”, critica.
A entrevista foi concedida na quarta-feira, por 14 minutos, quando, a reportagem do Correio Braziliense encontrou o deputado saindo da agenda da manhã, na ONU. No trajeto para um fast-food antes de uma reunião na missão do Chile, subindo a Rua 47, logo depois de cruzar a 2ª Avenida, ele foi reconhecido por Menem, um brasileiro que trabalhava na reforma de um prédio ali perto e que pediu uma foto. O parlamentar almoçou num Pret a Manger, rede de fast food britânica espalhada por Nova York. Não gastou nem US$ 15. A seguir, os principais trechos da conversa:
Como está sendo a sua agenda aqui na ONU por esses dias?
Estamos acompanhando a agenda do ministro Ernesto Araújo nas bilaterais aqui na ONU, isso é bom para abastecer a Comissão de Relações Exteriores de informações, vai contribuindo para conversas e alinhamentos em questões internacionais. A gente vai ajudando a reverter as más informações que circulam, principalmente, na Europa, com relação à nossa Amazônia. Essa é a pegada. Existem convites a eventos em Miami e em Washington, e a gente vai seguindo essa agenda.
E como reverter essa imagem que ficou do Brasil? O senhor acha que esse discurso do presidente Bolsonaro, aqui na ONU, ajudou? Havia uma expectativa de que ele fosse mais conciliatório…
Ele deu um pontapé inicial. Esse tema demanda um tempo, uma depuração, porque são muitos detalhes. Se pensarmos em fazer uma live ou um vídeo sobre isso daí, seria, pelo menos, uma hora, 40 minutos, apenas para começar o assunto. Mas, certamente, ele deu o primeiro passo. Não citou o nome de nenhum outro líder mundial, mostrou um tom diplomático e, por outro lado, também um tom firme, de preservação da Amazônia e da preservação da nossa soberania. Acontece que a Amazônia está com a média de queimadas dos últimos 15 anos, então, a gente está dentro daquilo que pode ser dito como, entre aspas, normalidade. É óbvio, ninguém deseja queimadas. A gente está trabalhando para combater isso. Aceitamos, inclusive, ajuda de outros países, oferecida por Chile, Israel e Estados Unidos. Mas a gente tem de ver que existe muita desinformação. O próprio Macron (Emmanuel Macron, presidente da França), quando postou aquela foto da queimada dos anos 1980, as pessoas ficam em pânico, acham que aquilo aconteceu na Amazônia inteira. E, por outro lado, quando ele fala que 20% do oxigênio vem da Amazônia, está cometendo uma outra… É que não vou falar fake news, porque estou… serei diplomata. Mas ele está espalhando uma mentira que, depois você vai ver, é retuitada pelo jogador francês Mbappé, cantores começam a entrar na onda também. Aí, você cria, no imaginário das pessoas, uma falsa ideia da realidade. É isso que a gente tem de combater. A Amazônia não está sendo queimada. Se você olhar onde está pegando fogo, não é no coração da floresta. É ao redor da floresta. São exatamente as áreas que já foram devastadas e são utilizadas para a agricultura. Então, todo ano acontece isso. Quando eu morei em Rondônia, em Guajará-Mirim, na fronteira com a Bolívia, vi isso acontecer. Demorou mais de uma semana para eu conseguir ver a cor do céu, devido ao tamanho das queimadas. Isso em agosto de 2010. Antigamente, não tinha esse alarde todo da imprensa internacional. Então, parece que sim, que é um negócio arquitetado. E a gente está aqui para mudar essa ideia. Entrando em campo a equipe do ministro Ernesto Araújo; o pessoal do Itamaraty; eu aqui, fazendo a parte, às vezes, do Poder Legislativo, da Comissão de Relações Exteriores da Câmara; a assessoria especial da Presidência (Filipe Martins). A gente começa a explicar esses detalhes para os estrangeiros, porque eles não têm acesso a essa informação.
Como assim?
O problema do Brasil é que a gente elegeu um conservador, sem ter uma universidade conservadora, um partido conservador organizado, e, obviamente, sem ter uma imprensa conservadora de grande porte. Como é que os gringos se informam? Ou eles se informam por meio de correspondentes deles aqui, que normalmente estão no eixo Rio-São Paulo-Brasília, não estão na Amazônia, ou, o que é mais frequente, se informam por meio dos grandes veículos de comunicação brasileiros, e aí entra grupo Globo e Folha. Não preciso mais dizer o que é noticiado nesses veículos de informação, né, principalmente. Então, eles (os estrangeiros) acabam sendo, no final das contas, de boa-fé, mal-informados.
O presidente Jair Bolsonaro cobrou da ONU a posição de defesa da soberania, da democracia e das liberdades. Foi um puxão de orelhas no Guterrez por causa da reunião do clima, na qual o governo brasileiro não pôde enviar um representante do presidente?
Não foi um puxão de orelhas específico para o secretário-geral Guterrez. Tivemos uma boa reunião bilateral com ele. O que Jair Bolsonaro quis dizer e, obviamente, ficamos chateados, é que, nessa reunião sobre o clima, foi impedida a participação do Brasil, do chanceler Ernesto Araújo e do ministro do Meio Ambiente, porque nos foi alegado que só presidentes, chefes de Estado, é que falariam nessa reunião. E depois, quando a gente viu, não foi bem isso que aconteceu. Outros países, via seus chanceleres, tiveram o uso da palavra. E o Brasil, não. Parece que foi uma coisa arquitetada para sair uma foto do Brasil como sendo intransigente, quando, na verdade, fomos impedidos de participar. E, nessas reuniões, participaram, por exemplo, a menina lá, a Greta (Thunberg), de 16 anos; uma brasileira (Paloma Costa), de menos de 30 anos. Então, qual é a representatividade? Qual é a legitimidade que essas pessoas têm? A ONU errou feio nesse ponto. Mas o recado principal do presidente Bolsonaro foi o de resgatar o porquê de a ONU existir. A ONU, principalmente via suas comissões, de direitos humanos, ou qualquer outra, tem servido como trampolim para bypassar os legislativos nacionais. Agendas como aborto ou ideologias de gênero, que jamais seriam aprovadas no Congresso brasileiro, usam na ONU para ser aprovado qualquer tipo de instrumento normativo para depois vir para o Brasil, ser internalizada, como sendo uma lei. Com força de lei no Brasil. Exemplo clássico disso: a recomendação da ONU sobre audiência de custódia. O Brasil adotou a audiência de custódia em 2016, implementada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), atropelando o Congresso Nacional. É competência do Congresso, segundo a Constituição, legislar sobre o processo penal? E (o CNJ) colocou a audiência de custódia. No momento em que temos centenas de policiais morrendo, recorde no número de homicídios, e a preocupação deles é o quê? Se o bandido foi bem tratado. É isso daí que queremos evitar. A gente quer fazer valer, no final das contas, a vontade popular. E a vontade popular elegeu Bolsonaro para ter essas mudanças.
Em relação à sua indicação para embaixador aqui nos Estados Unidos? Como está a sua preparação? O presidente disse que está chegando a hora de enviar a indicação…
Procuro me preparar tendo conversas, encontros e aulas com pessoas que têm experiência na área internacional, seja ela na parte histórica, seja na diplomacia, do Itamaraty, na parte do comércio internacional. E lendo livros, obviamente. Mas, no Senado, a sabatina gira sobre qualquer assunto, né? Eu acredito que existam senadores que vão decidir o seu voto no momento da sabatina. Se eu demonstrar conhecimento, e eles entenderem que sou qualificado, eles vão votar a favor, e estou me preparando para isso. Eu tenho de apresentar esse conhecimento. Mas, outros, certamente, estarão ali apenas para fazer ataque político ou para tentar desgastar o presidente. Isso é normal da democracia, estou só comentando, não estou reclamando.
(Nesse ponto, a entrevista feita durante caminhada na Rua 47 é interrompida por um trabalhador brasileiro, Menem, que reconhece o deputado: “Eduardo! Eduardo! Sou brasileiro!!”, se aproxima, com o celular em punho. O deputado, na hora, para e cumprimenta o simpatizante: “Trabalhando aí, cara?”. Menem: “Trabalho bem ali” (indica o prédio em construção). Feita a foto, Menem completa: “Abraço da comunidade brasileira! Fique com Deus, siga com Deus! Boa sorte, aí, e força para o nosso presidente lá no Brasil!”)
Não teme que seus milhões de eleitores se decepcionem, uma vez que, o Senado aprovando a sua indicação, o senhor terá de renunciar ao mandato?
Sei que essa questão não é unânime entre meus apoiadores. Por um lado, fico feliz porque eles me querem fisicamente perto, assim como tenho respaldo da comunidade brasileira nos EUA, que está gostando da ideia de me ter como embaixador. Minha imagem extrapolou as fronteiras de São Paulo, e estar nos EUA significa projetar a imagem do governo Bolsonaro no mundo. Em Washington, quase todo embaixador tem acesso direto ao seu chefe de Estado. Além disso, lá está a ONU, a OEA (Organização dos Estados Americanos), a Casa Branca, e é o local de trabalho do presidente da maior potência militar e econômica do mundo. Podemos reaver o comércio que negligenciamos durante os tempos de PT, há muita oportunidade nos EUA. E, no final das contas, é o estado de São Paulo que tem os maiores comércios com os EUA. Reatá-los significa gerar emprego, principalmente em São Paulo, estado que me elegeu. Serei o embaixador mais cobrado do mundo. Alguém tem dúvida de que um espirro meu mal dado lá pode ser explorado de forma negativa pela imprensa no Brasil? Este será um desafio. Auxiliar os brasileiros no exterior, costurar um grande acordo comercial, estreitar os treinamentos militares sob o comando do general Fernando Azevedo (ministro da Defesa), estão dentre essas missões. E isso só poderá ser possível devido a minha grande votação. Se eu tivesse tido uma baixa votação, isso estaria sendo explorado como algo que me impedisse de representar todo o Brasil no exterior.
O senhor chegou a se encontrar com Donald Trump?
Não. Ele se encontrou com o presidente Bolsonaro após o jantar. Eles tiveram uma conversa informal, rápida. Não tive acesso a essa conversa. Mas só o fato de o presidente americano convidar o presidente brasileiro para esse jantar já mostra toda a deferência. Houve ainda uma coincidência dos discursos de Trump com Bolsonaro. Houve quem perguntasse se foi algo planejado. Não foi. Na verdade, o que ocorreu foi uma convergência de valores, de ideias, de visão de mundo. E os dois acabam tendo naturalmente, espontaneamente, esse discurso alinhado, mas não previamente planejado.
Houve aqui também uma discussão sobre um fundo de investimentos no BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Esse alinhamento vai ajudar a vingar?
O fundo é muito bem-vindo. O Brasil é um país que está passando por dificuldades financeiras, e qualquer ajuda é bem-vinda. Só que a governança tem de estar a cargo do Brasil. O Brasil não pode se submeter ao poder decisório de ONG ou ao sabor e decisões de outros países dentro do território nacional.
Como começou sua amizade com a família Trump?
Não tem aquela amizade de frequentar a casa. Encontrei com Donald Trump Jr. rapidamente durante o road show em janeiro, e com Erik Trump num evento republicano. Na verdade, são contatos. Quando fala amizade, parece que um frequenta a casa do outro e que a gente conversa diariamente. Não. Troquei algumas conversas com o Jared Kushner (genro de Trump, casado com Ivanka), nos encontramos em Davos (Suíça), na Casa Branca. Você vai conseguindo ver essa boa vontade deles, de estar em contato com o Brasil, para colocar as duas maiores potências das Américas na mesma passada.
EUA fazem escolha técnica
Ocupada pelo encarregado de negócios há quase um ano, a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil deve ser chefiada por Todd Chapman, diplomata de carreira, fluente em português, que já serviu no país em outros postos. Para especialistas, os americanos optaram por uma escolha técnica a fim de consolidar a interlocução com todas as alas do espectro político. Antes de assumir como embaixador no Brasil, há um rito diplomático a ser cumprido. Caberá ao governo brasileiro aprovar a escolha do nome indicado pelos Estados Unidos. Além disso, Chapman precisa da chancela do Senado norte-americano.