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segunda-feira 19 de dezembro de 2022 às 05:44h

A sobrevida que Aras busca no governo Lula

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Augusto Aras tentará construir uma imagem de isento nos próximos nove meses, período que lhe resta à frente da PGR (Procuradoria-Geral da República).

Em conversas com auxiliares, ele tem dito segundo Marcelo Rocha, da Folha, que não promoverá uma guinada quanto ao tratamento dispensado a quem ocupa o Palácio do Planalto.

No comando da Procuradoria desde de 2019, Aras tem uma atuação atrelada aos interesses de Jair Bolsonaro (PL) e é acusado de abdicar do dever de fiscalizar. Por essa postura, chegou a ser especulado pelo mandatário para uma indicação ao Supremo Tribunal Federal caso fosse reeleito.

O presidente foi derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o procurador-geral agora avalia cenários para o período em que conviverá com o petista.

Aras prevê, a exemplo do que ocorreu ao longo do mandato de Bolsonaro, uma Procuradoria bastante acionada sobre atos ou eventuais omissões de Lula e auxiliares.

Segundo pessoas próximas a ele, no entanto, assim como fez com Bolsonaro, o PGR não deve criar empecilhos ou dores de cabeça –o que deve resultar em criticas dos bolsonaristas que até o momento o apoiam e defendem

Embora não veja chance de recondução a um terceiro mandato, Aras ainda sonha com uma vaga no Supremo Tribunal Federal e com a possibilidade de participar da indicação do seu sucessor pelo governo petista.

Além disso, Aras, cujo perfil político é conhecido, prefere manter boas relações com o grupo que estará no poder.

Nos últimos anos, centenas de representações foram enviadas ao órgão pela oposição para que o chefe do Executivo e seus comandados fossem investigados. Sob o argumento de não conter elementos mínimos para dar início a uma apuração ou de não haver indícios de crime, nada prosperou.

Para a cúpula da Procuradoria, a mesma via agora será explorada pelos adversários de Lula. E as críticas por parte de bolsonaristas também vão acontecer. Contatado por meio de sua assessoria, Aras não se manifestou até a conclusão desta reportagem.

O procurador-geral mantém boa interlocução com integrantes do PT, notadamente com o conterrâneo e senador baiano Jaques Wagner. Em 2013, Aras deu uma festa para promover o livro do amigo e ex-deputado petista Emiliano José. O ex-ministro José Dirceu e então presidente do PT, Rui Falcão, estiveram presentes.

Naquele mesmo ano, administração de Dilma Rousseff, Aras tinha o apoio de setores do PT para figurar na lista tríplice que seria enviada à então presidente para a escolha de um nome para o Superior Tribunal de Justiça. No entanto, ele enfrentou a resistência de integrantes da corte pelo fato de compor o Ministério Público e ao mesmo tempo atuar na advocacia.

Na tentativa de uma aproximação com o futuro ocupante do Planalto, o PGR tem a seu favor o fato de que sua gestão enterrou a Lava Jato. Critico dos métodos da operação, ele desfez as forças-tarefa, incluindo a de Curitiba, responsáveis pela apuração que levou Lula à cadeia em 2018.

Foi também considerada uma sinalização ao petista a congratulação pela vitória nas urnas imediatamente após o anúncio do resultado pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Além disso, contrariando a tese golpista de Bolsonaro e de seus apoiadores, a PGR avaliou que não há no relatório do Ministério da Defesa sobre a fiscalização das eleições fato concreto que justifique a abertura de uma apuração sobre as urnas eletrônicas.

Para a cúpula do órgão, as observações levantadas pelos militares deveriam ser consideradas apenas para eventuais aperfeiçoamentos futuros do sistema eletrônico de votação.

Portanto, para a Procuradoria, o documento não serve como argumento a ensejar revisão do processo eleitoral encerrado no dia 30 de outubro.

Na semana passada, a Procuradoria emitiu um outro sinal ao governo eleito. A pedido do órgão, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, determinou a prisão temporária de José Acácio Serere Xavante sob a acusação da prática de atos antidemocráticos.

A PGR disse que Serere Xavante utilizava sua posição de cacique do Povo Xavante para arregimentar indígenas e não indígenas para cometer crimes, com ameaças de agressão e perseguição a Lula e aos ministros do Supremo Moraes e Luís Roberto Barroso.

O indígena vinha realizando manifestações em diversos locais de Brasília, incluindo as proximidades do Congresso e do hotel onde estão hospedados o presidente e o vice eleitos.

“A manifestação, em tese, criminosa e antidemocrática, revestiu-se do claro intuito de instigar a população a tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo a posse do presidente e do vice-presidente da República eleitos”, afirmou a PGR.

Pessoas próximas ao futuro presidente, no entanto, veem a saída da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, como condição necessária para a abertura de diálogo entre o novo governo e o chefe do MPF, como mostrou a Folha. Ela é vista como bolsonarista e próxima da família do atual mandatário, razão pela qual seu nome desagrada o entorno de Lula.

Representantes de Lula fizeram um primeiro contato com integrantes do gabinete do procurador-geral ainda em novembro, na tentativa de articular um encontro.

Lindôra atua em matéria penal junto ao STF e foi dela uma série de manifestações pelo arquivamento de pedidos de investigação contra Bolsonaro, incluindo os procedimentos instaurados a partir das conclusões da CPI da Covid.

Apesar da preocupação com a vice-procuradora-geral, integrantes da equipe de transição responsável pelo tema não veem a sucessão na PGR como prioridade, já que o foco dos grupos temáticos está nos cem primeiros dias de governo, mas o órgão preocupa a cúpula petista.

Em entrevista à Folha, o senador eleito e futuro ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB-MA), abordou o assunto ao ser questionado sobre a escolha de um nome para suceder Aras.

Dino afirmou que defende a lista tríplice, elaborada a partir de uma votação interna promovida pelos procuradores, como uma opção para a escolha, mas que a Constituição não obriga a escolha de um dos nomes.

“Não há posição nem de que lista tríplice é dogma. Pode ser que a escolha recaia sobre a lista tríplice, talvez. Entre os nomes apresentados também estarão os da lista tríplice”, afirmou.

Aras diz ser contra a lista tríplice no processo de escolha do procurador-geral. Afirma que as eleições internas organizadas a cada dois anos pelos colegas replicam vícios da política partidária.

“O MPF, quando se submete ao princípio da maioria através de eleições internas, atrai para seu âmbito os vícios naturais da política partidária, a exemplo do clientelismo, do fisiologismo, da política do toma lá dá cá”, disse ele em entrevista à Folha em abril de 2019.

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