A PEC da Transição nem começou a tramitar, mas já enfrenta segundo a colunista Malu Gaspar, em uma barreira importante no Senado: o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Por comandar a comissão que avalia se a proposta é juridicamente viável e está de acordo com a constituição, a colaboração de Alcolumbre é essencial para a tramitação rápida da PEC, que precisa ser aprovada até o final de dezembro para que os valores do Auxílio Brasil de R$ 600 constem do orçamento.
Nas palavras de um dos senadores que acompanha de muito perto as negociações em torno da PEC, Alcolumbre se tornou, nos últimos dias, “o dono da PEC”: por ser o presidente da CCJ, é ele quem pauta as discussões e decide seu ritmo.
No caso dessa PEC, o senador ainda quer ser o relator e dar redação final ao texto.
Embora inicialmente Alcolumbre tenha manifestado boa vontade em “ajudar o Brasil” e garantir a tramitação rápida da PEC, nos bastidores o senador está “jogando duro”, na expressão utilizada pelos aliados de Lula que participam das negociações.
Em entrevista na última quarta-feira, ele afirmou que a versão final da PEC “nem de longe” será igual ao texto apresentado pela equipe de transição ao Senado, que dá permissão de furar o teto de gastos em R$ 198 bilhões durante quatro anos.
Em encontros reservados, com aliados de Lula, a conversa é outra. Segundo várias pessoas do grupo político do presidente eleito, Alcolumbre quer cargos – mais especificamente um ministério – para garantir a aprovação da PEC.
“Ele repete agora o modus operandi que adotou no governo Bolsonaro. Coloca dificuldades no caminho para vender facilidades depois”, diz um dos integrantes da equipe de transição.
Um ministério pelo qual o senador já manifestou interesse é o da Infraestrutura, que comanda o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o DNIT. Pelo que se comenta entre os líderes aliados de Lula, o arranjo ideal para Alcolumbre seria comandar o ministério da Infraestrutura e entregar o DNIT ao aliado Alexandre Silveira (PSD-MG), que disputou uma vaga no Senado em Minas nesta eleição, mas não teve sucesso.
Silveira é suplente de Rodrigo Pacheco, de quem Alcolumbre foi antecessor na presidência do Senado e se mantém aliado.
Na reunião que teve com Lula no início de novembro, Pacheco disse ao presidente eleito que o aliado estava muito resistente à proposta inicial de liberar os gastos por tempo indeterminado, e que precisaria ser convencido.
Lula, então, pediu a aliados como o senador Randolfe Rodrigues que tentasse abrir caminho com Alcolumbre, e Geraldo Alckmin também já se reuniu com ele.
Até agora, porém, não houve acordo.
Os principais pontos em discussão no Senado são o valor que o novo governo terá para despesas fora do teto de gastos – há propostas de R$ 70 bilhões e de R$ 80 bilhões, mas o PT quer no mínimo R$ 175 bilhões – e por quanto tempo vai durar essa licença para gastar – o PT quer quatro anos, boa parte do Senado não concorda.
Nesta terça-feira, o próprio Pacheco admitiu que “não há consenso” em torno do texto.
– Há pontos que são controvertidos e que serão objeto de debate tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados em relação ao tamanho desse espaço fiscal.
O governo de transição corre contra o tempo, já que a PEC precisa ser aprovada em dois turnos, tanto no Senado quanto na Câmara, antes do recesso dos parlamentares, em meio às distrações futebolísticas da Copa do Mundo.
A interlocutores do Senado que o questionam sobre uma eventual barganha em torno da PEC em troca de um ministério, Alcolumbre tem dito que foi eleito para mais um mandato de oito anos e jura que pretende seguir atuando na Casa pelos próximos oito anos. “Não tenho condições psicológicas de pedir nada para ninguém”, afirma a quem lhe pergunta sobre o interesse em integrar o primeiro escalão do governo Lula.
No governo Bolsonaro, também houve discussões sobre a possibilidade de Alcolumbre ocupar um ministério, mas não avançou. Entre os petistas que acompanham a negociação da PEC, a pressão do senador sobre o novo governo é encarada até com certo espanto. “Nem Bolsonaro teve coragem de colocá-lo no ministério. Nós é que vamos colocar?”, ironizou um petista no Senado ontem.