O titular da Secretaria de Desenvolvimento Rural da Bahia, Josias Gomes (PT), defende em entrevista ao jornal Tribuna, que é importante que seja feita uma coalizão entre os mais diversos partidos com um único objetivo: derrotar o presidente Jair Bolsonaro na eleição de 2022.
Confira abaixo:
Tribuna – Muitos não sabem a importância da agricultura familiar. No que ela contribui para melhorar a vida do pequeno agricultor?
Josias Gomes – Olha, a população economicamente ativa da Bahia é composta por sete milhões. Dos quinze milhões de baianos, sete milhões estão aptos para trabalhar. Desse universo, estima-se que em torno de um milhão estejam desempregados. Então, nós vamos pra seis milhões. Desses seis milhões, segundo o último censo agropecuário, um milhão e meio trabalha na agricultura familiar. Daí você vê o tamanho e a importância desse segmento na economia do Estado. Mas veja, o dado é não apenas do ponto de vista numérico. É que esse segmento também é apontado pelo censo agropecuário, que a partir de 2005 resolveu fazer uma distinção entre a agricultura familiar e a agricultura não familiar, é que ele é quem produz os alimentos que nós consumimos. Então, quanto mais agricultores familiares estejam produzindo, mais alimento saudável nós temos na mesa do baiano. E aí é onde entra um detalhe: entre a agricultura familiar e a agricultura empresarial, a distância em termos de assistência técnica, de produtividade e de uso intenso de tecnologia e de mecanização, é uma diferença muito grande. Quanto mais o estado entra nesse segmento, e juntos com ele produzem condições pra que eles aumentem sua produção e sua produtividade, mas nós estamos garantindo uma série de fatores. Entre eles, evitar o êxodo rural, aumentar a produção de alimentos, diminuir o aumento acelerado de preços desses produtos, então eu diria a você que, de fato, esses conhecimentos parte da população se dá por força dessas circunstâncias. O que é agricultura? Agricultura é uma coisa só. O agricultor familiar precisa muito de incentivo do Estado. E não é à toa que a Bahia se destaca no trabalho da assistência do segmento.
Tribuna – Quais são atualmente os principais projetos tocados pela SDR? Tem algum projeto que é modelo até para outros estados?
Josias Gomes – Aqui nós temos o seguinte dois grandes programas que são os carros chefes. O Pró-Semiárido é um programa que nós temos com o FIDA [Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola], que é o órgão da ONU encarregado do desenvolvimento rural. E o FIDA, com ele juntos, escolhemos alguns territórios para atuarmos. Por quê? Porque o programa do FIDA, que é diferente do outro programa que a gente tem com o Banco Mundial, ele visa dar uma qualidade geral de vida ao agricultor. Então é um programa estruturante do ponto de vista social. Esse programa é desenvolvido ao mesmo tempo em 156 países. E o nosso é um dos programas considerado modelo pelo FIDA e que replica em outros países. Do mesmo modo que o Bahia Produtiva, que é um programa nosso com empréstimo do Banco Mundial, que ocorre nos 27 territórios do estado. Esse programa incentiva a produção, incentiva o desenvolvimento da economia agrícola, da agricultura familiar e é um dos programas que mais bem sucedido também dos que o Banco Mundial financia pelo mundo afora.
Tribuna – Como é a convivência da agricultura familiar com o agronegócio na Bahia, que também é muito forte?
Josias Gomes – Repare, são complementares. Não há nenhum conflito. A agricultura empresarial atua na produção de grãos. A soja e o milho, por exemplo, são importantes na alimentação animal. E humana também. Mas sobretudo animal. Daí é onde depende a agricultura familiar quando está lá produzindo o seu frango, quando está lá com a vaca de leite. Então, não são conflitantes. Elas são complementares. Um cumpre o papel e o outro, o outro. E nós nunca estimulamos qualquer tipo de competição entre as duas agriculturas, pelo contrário. Porque, no fundo, a agricultura é uma só. O que difere uma é o tamanho e a importância dela e o que ela depende do estado. No caso da agricultura empresarial, eles têm menos dependência do estado do que o agricultor familiar, que tem dez, oito, seis, cinco hectares.
Tribuna – Como é que a pandemia impactou esses setores na Bahia?
Josias Gomes – A pandemia teve um impacto diferenciado nos setores. A agricultura, como produz alimento, em geral não teve um impacto maior. No nosso caso, interrompeu-se alguns fluxos de ações que a gente vinha desenvolvendo para evitar o contato direto dos técnicos com os produtores. Mas, de um modo geral, no período da pandemia, nós buscamos meios de estar junto com os agricultores ajudando para que eles pudessem enfrentar essa dificuldade, produzindo doze milhões de máscaras para entregar aos agricultores e comunidades mais necessitadas das cidades e das grandes cidades. E isso foi feito nos municípios que têm cooperativas que podiam nos ajudar nessa direção. Depois fizemos um edital de quinze milhões de reais para evitar que, com a diminuição da produção, pudesse ter aumento de preço. Mas em geral mantivemos a relação com a nossa turma e eu creio que o impacto da pandemia na economia agrícola naquele momento não foi tanto quanto em setores que não tinham relação direta com a produção de alimentos.
Tribuna – Como a secretaria vem atuando para fortalecer esse segmento?
Josias Gomes – Nesses últimos dois mandatos de Rui Costa, o investimento da agricultura familiar chegou a dois bilhões e quatrocentos milhões de reais. Parece pouco, mas não é. Porque o atendimento permitiu um aumento significativo da renda dos agricultores, que foram atendidos pelos nossos programas e passam de cem mil. E ainda assim, são parte muito pequena do universo. Por quê? Porque nós só estamos agindo aqui sem apoio do Governo Federal. É só o Estado investindo nesse segmento, porque aqui, para você ter ideia, nós somos 593 mil estabelecimentos rurais da Bahia que são da agricultura familiar. E esses estabelecimentos representam 78% dos empreendimentos agrícolas do estado. Dos 100% das propriedades rurais da Bahia, 78% são da agricultura familiar. Nós somos o maior contingente de agricultores familiares. E, mesmo assim, nós não atendemos mais de cem, cento e vinte mil estabelecimentos por falta duma iniciativa do Governo Federal. A gente podia estar muito mais na frente.
Tribuna – Onde buscar terra fértil?
Josias Gomes – Os solos baianos em geral são divididos. São vários, vamos dizer assim, solos nos diversos microclimas que nós temos. Há uma diferença muito significativa de um microclima para outro e nós temos terras sólidas, férteis e todas elas e uns dependem de água, em outros depende de fertilização. E em todos eles o agricultor precisa conhecer as propriedades orgânicas desse solo pra ele saber o que fazer e obter uma produtividade maior. E aí entra um outro aspecto fundamental da nossa ação que é a assistência técnica. Quanto mais a gente tem assistência técnica, mais condições nós temos de desenvolver a agricultura familiar.
Tribuna – Qual é a sua expectativa, como membro do Partido dos Trabalhadores, em relação à eleição do ex-presidente Lula? Essa possibilidade da aliança dele com Alckmin já está pacificada dentro do partido?
Josias Gomes – Nosso propósito é fazer com que a candidatura de Lula seja um movimento. Que extrapole partido, movimentos sociais e que abarque a sociedade como um todo – como foi, por exemplo, a eleição da campanha das diretas. Naquele movimento, nós nos envolvemos numa grande caminhada pelo Brasil afora para acabar a ditadura militar, que ninguém aguentava mais. Pois bem, aquele movimento juntou setores das mais diversas opiniões. Os que eram contra a ditadura juntaram-se naquele propósito de pôr fim, naquele movimento. O que Lula está fazendo hoje parece ser um movimento. Tem aquelas características. Nosso país estava vivendo um pleno emprego. Nós tínhamos uma relação internacional invejável. Nós tínhamos a dinâmica da economia funcionando bem… Enfim, a agricultura familiar nem se fala. E tudo isso, de uma hora para outra, com o voto se encerrou. E desse processo resultou só um fracasso. Em 2020, infelizmente, voltamos ao mapa da fome que o Lula tinha acabado. Então, o movimento, a candidatura de Lula, creio que ela está juntando os setores que não tem o mesmo pensamento político nosso – mas pelo caminho que o Brasil tomou, é necessário que esse segmento se incorpore a nós. E aí é o caso do Alckmin. Ele está conosco, entre outras razões, por ser um brasileiro que se coloca na condição de alguém que precisa de um presidente como Lula, que volte a ter o país nas condições que nós tivemos. Pode ter discordância? Pode. Mas nós precisamos respirar um ar político mais puro, o que nós não temos hoje.
Tribuna – O senador Jaques Wagner desistiu de disputar o governo da Bahia. O que acha da ideia de um aliado, talvez Otto Alencar, assumir a cabeça da chapa?
Josias Gomes – Nós temos uma coalizão de governo que veio dando certo durante 16 anos. O PT, por exemplo, em Pernambuco, tinha um candidato com todas as chances de ganhar a eleição: Humberto Costa. Abriu mão. Para quê? Para construir isso que eu falei, um movimento nacional. Então, nós tínhamos uma candidatura estabelecida, com todas as funções dos governos bem acertados, saiu extremamente aprovada. Wagner, portanto, seria um candidato com todas as credenciais para sê-lo. Se nós acharmos que é necessário a existência de um espaço para que se amplie esse movimento em torno de Lula, nada mais justo do que acontecer um movimento que possa encaminhar-se na direção de outras candidaturas. Não tem nenhum problema, não. Será absorvido com a tranquilidade que nós todos temos em relação ao que é importante neste momento hoje.
Tribuna – Na semana passada saiu uma pesquisa colocando o governador Rui Costa bem avaliado para uma possível candidatura ao Senado. É uma estratégia interessante, considerando isso que o senhor falou?
Josias Gomes – Não tenha dúvida, mas não é só isso, entendeu? Na verdade, o caso é o seguinte: o Rui é bem avaliado como governador, vai sair com uma das aprovações melhores. Aliás, Wagner sempre dizia isso: eu escolhi um sucessor que eu quero que ele seja melhor do que eu. A sociedade vai dizer, mas o que importa neste momento é saber que o acerto da população baiana em ter feito Wagner governador, repetir o mandato dele, feito Rui e repetir o mandato, vai continuar – independente de ser o candidato do PT ou desses partidos que compuseram e ainda compõem a nossa coalizão.
Tribuna – O senhor acha que o presidente Jair Bolsonaro decepcionou o eleitorado que o elegeu em 2018?
Josias Gomes – Olha, o dele eu não sei. Mas pelo que tenho conversado com muita gente que votou nele, não para ser fiel a princípios etc. Porque, a rigor, eles nem defendem uma coisa muito clara, né… Eu diria que ele hoje não repetirá aquela performance, porque desta vez ele quase será obrigado a discutir o que é ser governante de um país tão complexo quanto esse. E ele provou que ele é inepto para isso. Se tivesse qualquer possibilidade de uma entrevista com ele, o Haddad ou qualquer candidato ao vivo, iriam distinguir a incapacidade intelectual, pessoal, social e tudo mais que você possa imaginar dele para ser presidente do Brasil. A Bahia teve o sofrimento que teve com as enchentes. O sujeito não teve a coragem de vir aqui mais. Não deu uma palavra? Ao contrário, estava de jet-ski em Santa Catarina passeando. Isso não é uma coisa qualquer, gente. Agora foi lá ao Rio de Janeiro, porque o estado dele, foi lá de avião e tal, viajou a Petrópolis e se disse solidário com aquele sofrimento do povo. Mas, o que fez depois disso?