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domingo 16 de fevereiro de 2020 às 18:35h

75% dos órgãos federais descumprem regras, revela CGU

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Um levantamento da Controladoria-Geral da União (CGU), com base nos dados do Sistema de Transparência Ativa (STA), identificou que 75% dos órgãos (228) não publicam os dados obrigatórios ou não preenchem os relatórios para monitoramento das agendas públicas. Já 18% dos órgãos (54) cumprem parcialmente as obrigações, enquanto apenas 8% cumprem as regras (23). Os dados da CGU, responsável por fiscalizar a publicação das agendas de autoridades, foram obtidos via Lei de Acesso à Informação e publicados pelo site G1.

“A CGU compara a informação prestada no STA com o que está efetivamente publicado na página do órgão e, se necessário, registra as recomendações para o adequado cumprimento da obrigação. Cabe ressaltar que é obrigação dos órgãos e entidades manter as informações constantes do STA atualizadas, bem como atender às recomendações e orientações da CGU”, afirma o ministro Wagner Rosário (CGU).

Especialistas ouvidos pelo G1 apontam que os agentes públicos precisam divulgar as agendas para dar mais transparência sobre a atuação de grupos de pressão e também para facilitar o acompanhamento dos trabalhos pela sociedade.

Em agosto de 2019, o ministro da CGU, Wagner Rosário, defendeu que a transparência é o melhor tratamento que se pode dar ao lobby. Antes, em maio de 2019, Rosário já havia dito que editaria, em até 30 dias, um decreto para a criação de uma plataforma com todas as informações sobre a agenda de autoridades do governo. O decreto, porém, ainda não foi publicado.

A CGU informa que “há tratativas, no Poder Executivo federal, para a criação de um sistema único para o registro e a transparência ativa dos compromissos públicos”, mas que “a implantação do referido sistema depende de regulamentação por decreto presidencial, nos termos do qual serão definidas suas características”.

“O decreto para a regulamentação da publicação das agendas está sendo elaborado com a colaboração de diversos órgãos e sua publicação depende ainda da aprovação do presidente da República, após a fase de discussões com os demais integrantes da administração pública federal. Consequentemente, não há uma previsão para sua promulgação e o posterior lançamento do sistema de agendas”, diz a CGU.

Em nota, a Secretaria-Geral da Presidência da República afirma, porém, que “não há ato formal na SG-PR acerca do referido assunto”.

As autoridades que publicam as agendas não costumam publicar o assunto abordado ou o motivo para a reunião. Normalmente, os dados publicados pelo agente público são apenas: nome do convidado, profissão do convidado, data e hora da reunião e local da reunião.

Pedidos de LAI

Em 6 de janeiro de 2020, o G1 fez um pedido de Lei de Acesso à Informação aos principais órgãos do Poder Executivo federal. O requerimento pedia o envio de um arquivo estruturado, aberto e editável com os dados das agendas de autoridades de cada órgão referentes a 2019.

Os pedidos foram direcionados para todos os 22 órgãos que têm autoridades com status de ministro e também para a Presidência da República e a Vice-Presidência da República

O levantamento identificou que 10 dos 24 principais órgãos do Poder Executivo federal não permitem o download das agendas de autoridades nem enviam esses dados por meio da Lei de Acesso à Informação. Nesses casos, só é possível acessar tais informações de forma manual ao pesquisar por cada dia no calendário do site de cada órgão. Isso dificulta, por exemplo, a análise e o cruzamento das informações.

A análise do G1 nos dados das agendas enviados também constatou que parte dos agentes públicos costuma apenas informar “despachos internos” na agenda oficial. Essas autoridades, portanto, nem sequer informam com quem se reúnem.

Lobby e transparência pública

Para o advogado e mestre em Direito Bruno Morassutti, conselheiro do “Fiquem Sabendo” e da “Open Knowledge”, seria positivo que as informações das agendas de autoridades estivessem em uma única plataforma, conforme já anunciou o ministro da CGU.

“Se você tiver que consultar todos os ministérios para descobrir o que está acontecendo, isso já é um problema, já te dá um trabalho maior. Essas informações são registradas cada vez de uma forma, o que torna mais difícil o cruzamento de informações. Às vezes você fica sem ter um quadro completo do que está acontecendo. Essa mudança seria importante para padronizar esses dados e facilitar o acesso em um local só, como já funciona no Portal da Transparência. Com o Portal da Transparência, por exemplo, você já consegue efetivamente acompanhar os gastos de todos os órgãos federais”, diz Morassutti.

Ele afirma ainda que a legislação não é clara sobre quais informações das agendas precisam ser publicadas. Para ele, os órgãos deveriam publicar nas suas agendas pelo menos o nome da pessoa, o assunto a ser abordado, o nome de todos os acompanhantes e o interesse da pessoa no assunto abordado, entre outros. Essas informações já são obrigatórias para marcar uma reunião com agentes públicos, conforme determina o decreto 4.334 de 2002. Apesar disso, como a legislação não é clara, as autoridades costumam publicar apenas o nome e a profissão da pessoa, a data, a hora e o local da agenda.

“Esses dados já deveriam estar disponíveis em transparência ativa. A OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico] recomenda que as altas autoridades sejam estimuladas a divulgar essas agendas por uma questão de liberdade concorrencial, por questão de acesso a informação de forma geral. A gente já deveria estar fazendo isso. Infelizmente, ainda não conseguimos fazer com muito sucesso. Para a gente ter um ambiente em que a concorrência age de uma forma mais leal e que você consegue efetivamente participar das políticas públicas conforme elas são elaboradas, e não só ficar sabendo quando elas saem, isso é importante que tenha essa divulgação de forma prévia.”

Já o professor do curso de relações governamentais do Insper Milton Seligman, um dos organizadores do livro “Lobby desvendado: democracia, políticas públicas e corrupção no Brasil contemporâneo”, lembra que tanto as empresas quanto as ONGs se reúnem com autoridades porque querem defender os seus interesses e tentar influenciar na formulação e na execução das políticas públicas. Seligman acrescenta ainda que a transparência é necessária para saber com quem as autoridades estão se reunindo e também para a sociedade civil entender o papel dos grupos de pressão.

“As empresas e as ONGs procuram influenciar esse desenho e depois a execução das políticas públicas, tentando modificar o cenário, as normas etc para que possa ser mais favorável aos interesses que elas executam e representam. Como isso é uma área em que você tem interesses privados influenciando atividades de interesse público muito legitimadas pelo voto, é muito importante que a sociedade possa acompanhar porque a sociedade é diretamente interessada no resultado”, diz o professor do Insper.

Para ele, também é preciso retomar as discussões sobre a regulamentação do lobby, que ganhou uma impressão negativa no Brasil, principalmente após os escândalos da Operação Lava Jato. “As experiências americanas, europeias, mesmo latino americanas, precisam ser estudadas. A gente pode aprender e, com isso, ganhar tempo usando essas experiências. Os EUA têm o lobby regulamentado desde a Constituição, desde 1787, e têm uma experiência vasta de coisas que deram certo e não deram certo.”

No Brasil, o projeto de lei 1.202 de 2007, que propõe regulamentar o lobby, foi discutido na Câmara dos Deputados em 2018, quando foi relatado pela então deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ). Não houve, porém, votação no plenário na Casa e a proposição não foi discutida durante o governo Bolsonaro.

“Então, como eles [empresas e ONGs] vão interferir mesmo, vamos regulamentar de modo que isso possa acontecer buscando o melhor para a sociedade, com transparência, entendendo o porquê do debate, e certamente ouvindo as empresas. As empresas muitas vezes trazem novidades tecnológicas que as autoridades nem sabem”, afirma Seligman.

Morassutti lembra ainda que a divulgação das agendas é importante também para o acompanhamento pela sociedade civil. Ele destaca, por exemplo, que só foi possível identificar que quatro ex-assessores investigados por “rachadinhas”, esquema em que parte do salário de assessores é devolvida aos parlamentares, estiveram no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro porque os registros da visita ao gabinete foram fornecidos pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Para ele, porém, seria ainda melhor se tais dados já estivessem disponíveis na internet, sem a necessidade de pedir pela Lei de Acesso à Informação.

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