Os Estados Unidos assumiram a responsabilidade pela ação que matou o chefe da Guarda Revolucionária do Irã, general Qasem Soleimani, e o comandante da milícia, Abu Mahdi al-Muhandis, na noite desta quinta-feira (2) em um ataque aéreo ao comboio que abrigava os dois líderes no aeroporto de Bagdá. A milícia xiita iraniana acusa os Estados Unidos e Israel de liderarem a ação.
Três foguetes teriam atingido o aeroporto. Além de Soleimani e Al-Muhandis, outras cinco pessoas teriam morrido no ataque conforme Eduardo Marini, do R7.
Ao liderar a ação, o presidente americano, Donald Trump, e seu governo certamente criaram, para seus povos, países, o Golfo Pérsico, o Oriente Médio e talvez o mundo, um clima de tensão maior do que as geradas pela queda e morte do líder iraquiano Saddam Hussein e a execução, pelos Estados Unidos, do fundador da Al-Qaeda, Bin Laden.
As duas somadas, a bem da boa explicação, como fizeram questão de destacar vários gigantes da imprensa mundial, entre eles a seção americana do canal de notícias CNN e o mais influente jornal do planeta, o The New York Times.
Os riscos de reação pesada do Irã e de consequente guerra são reais. O preço do barril de petróleo começou a subir em todas as cotações do produto no mundo abertas a partir do início da madrugada (no horário de Brasília) de sexta-feira (3). Uma reação violenta do Irã, a partir de ataques militares formais e mesmo iniciativas de grupos, poderá vir sobretudo em função da perda do general Soleimani.
Herói nacional, figura extremamente popular entre os iranianos, iraquianos e árabes aliados, Soleinami, que tinha 62 anos, era de fato a segunda figura em importância e poder daquela república persa, atrás apenas da maior autoridade política e religiosa, o aiatolá Khamenei.
Na prática, pairava acima até mesmo do presidente, o moderado Hassan Rohani, sétimo desde a criação do cargo, que substituiu o esquentado e falador Mahmoud Ahmadinejad.
Com apoio total da cúpula religiosa iraniana, Soleinami era uma das principais vozes a ditar o ritmo em atitudes diplomáticas e sobretudo militares de seu país e de milícias árabes, iraquianas, sírias e libanesas, no vai-e-vem da queda de braço com Israel e os Estados Unidos.
Era inteligente na formulação de estratégias. Sabia conduzir comandados e líderes influentes a fazer o que ele desejava. Tinha poder, carisma e capacidade de interlocução. Era muito ouvido em todos esses setores, o grande arquiteto e a última palavra em todos os procedimentos. Por tudo isso, e por ter liderado várias ações e reações militares na aquecida região, era, não por acaso, considerado terrorista por Telavive e Washington.
Criada pelo aiatolá Khomeini em meio à Revolução Islâmica de 1979 no Irã, a Guarda Revolucionária, que era chefiada por Soleinami, representa muito mais do que uma fatia militar poderosa e de elite.
Com uma tropa estimada entre 130 mil e 160 mil componentes, em terra, água e ar, ela é, a rigor, uma potência industrial com lealdade feroz ao líder religioso supremo e influência política determinante e praticamente inquestionável na sociedade.
Seus tentáculos alcançam, entre outros setores vitais do país, o comando do Basij, organização paramilitar religiosa composta por voluntários; as Forças Quds, de combate em nome do país em conflitos na região e no exterior; e todos os programas de desenvolvimento de mísseis regionais e intercontinentais do país, incluindo balísticos e nucleares.
É oportuno lembrar que o governo de Teerã afirma ter mísseis com alcance de dois mil quilômetros, o que deixaria instalações e bases militares e israelenses e americanas ao seu alcance e alça de mira. Não bastasse, qualquer espaço ocupado por americanos e israelenses em áreas persas ou árabes se tornam, a partir de agora, alvos potenciais.
O Irã sabidamente enriquece urânio, embora seu governo argumente que o faz apenas para objetivos pacíficos. Israel, que o Irã islâmico não reconhece como nação, considera os projetos nucleares e de mísseis balísticos iranianos ameaças à sua existência. Tem incentivado Trump em sua vontade de abandonar o acordo assinado pelos EUA sobre o programa nuclear iraniano e retomar sanções a Teerã.
A milícias xiitas iraquianas, que atuam sob proteção do Irã, mataram um funcionário americano recentemente. Na retaliação, os EUA bombardearam posições dos xiitas em três pontos do Iraque e em dois da Síria, em ataques que teriam deixado 25 mortos.
Os milicianos deram o troco invadindo a zona de embaixadas de Teerã, capital do Irã. Por pouco não chegaram à representação americana. Nesta quinta-feira (2) veio a reação violenta de Trump, baseada no argumento de novos ataques iranianos estavam preparados.
Algo que parece inútil, mesmo porque agora, se eles, os ataques, estavam de fato engatilhados, as chances delas, as retaliações, ocorrerem agora, com a morte de Soleimani, aumentam de forma exponencial.
Nas próximas horas e dias, será oportuno observar o que iranianos, iraquianos e árabes farão nas ruas de Teerã, Bagdá, Beirute e de outras cidades árabes e persas.
O fogo ficará mais próximo ou longe do pavio de uma grande reação – e, no limite, de uma guerra – a depender da reação popular nestes pontos do mundo.
Ao menos por enquanto, por todos os lados que permitem visão, Trump parece ter criado muito mais problemas do que soluções ao ordenar a morte de Soleimani.
Enquanto isso, o petróleo sobe no mundo. Parece ser apenas o começo. Não será uma conta paga apenas por Trump, americanos e israelenses, como se percebe.
Ao que tudo indica, daqui a pouco parte importante dela – a conta – chegará também por aqui.