O presidente Jair Bolsonaro deixou o PSL e anunciou na quinta-feira passada (21) a criação de um novo partido. A única forma de a APB (Aliança pelo Brasil) sair do papel antes das eleições municipais de 2020, no entanto, é com o recolhimento de assinaturas com certificação digital, um processo que não é simples e que ainda deve ser regulamentado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Para criar um novo partido político, o tribunal exige uma lista com assinaturas equivalentes a 0,5% do total de votos válidos na última eleição para a Câmara dos Deputados. A Aliança precisa, portanto, de 491.967 apoiadores sem filiação partidária em pelo menos nove estados.
Como a lei exige que as assinaturas sejam entregues com até seis meses de antecedência em relação à campanha, Bolsonaro tem até abril para conseguir todas as adesões se quiser que seu partido dispute o pleito do ano que vem. É por essa razão que o presidente deposita todas as fichas no TSE, que decide amanhã se as assinaturas com certificação digital podem substituir o modelo tradicional.
“Se for possível a [coleta] eletrônica, a gente forma um partido para março. Se não for possível, eu não vou entrar em disputas municipais no ano que vem. Estou fora”, afirmou o presidente.
Como funciona o certificado digital?
“O certificado digital identifica a pessoa por meio de criptografia avançada, explicou ao UOL o presidente da ANCD (Associação Nacional de Certificação Digital), Ego Schaden. “Uma chave eletrônica privada e outra pública se conectam, giram juntas e assintam o documento.”
Segundo a ANCD, há hoje no Brasil 3,78 milhões de pessoas físicas com certificado digital, 2,58% do eleitorado. Criado em 2001, o método conta com 17 autoridades certificadoras, entre entidades e empresas públicas e privadas.
Como conseguir sua assinatura digital?
Para conseguir uma assinatura digital, é preciso desembolsar R$ 70 para um certificado com validade de um ano e cerca de R$ 350 para o prazo máximo de cinco anos. A primeira etapa é usar um cartão de crédito para comprar no e-comerce uma assinatura digital de uma empresa credenciada.
“Ele faz o pagamento e agenda o processo de validação”, explica Schaden. Em até uma semana, o interessado se encaminha para um dos 10 mil pontos de atendimento. Em cerca de meia hora, o “agente de registro” tira uma foto, colhe a biometria, escaneia um documento oficial e recolhe a assinatura em um termo de titularidade já digital.
A pessoa, então, recebe o certificado em um “talking” (espécie de pendrive exclusivo), em um cartão criptográfico ou mesmo na nuvem. “Se for o talking, basta conectar no computador, abrir o documento em PDF e assinar pelo certificado digital”, explica Schaden.
Vale a pena para criar o Aliança pelo Brasil? Como o trâmite leva tempo, dinheiro e disposição do interessado, a alternativa também pode demorar. Schaden sugere ao novo partido que faça uma campanha direcionada entre os quase 4 milhões de brasileiros já certificados.
“Esse número é sete vezes maior do que o necessário para criar a legenda”, diz. “Além disso, o partido ainda poderá contar com a coleta das assinaturas tradicionais.”
O julgamento no TSE A validação do certificado digital pode ser decidida amanhã pelo plenário do TSE, que julga um relatório do ministro Og Fernandes a uma consulta protocolada pelo deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Em manifestação de abril, a assessoria técnica do TSE admitiu o uso de assinaturas digitais validadas por certificação digital.
“Entende esta assessoria que não há óbice legal ao uso facultativo da assinatura eletrônica certificada digitalmente para comprovar o apoiamento à criação de nova legenda partidária, uma vez que estaria garantida a autenticidade da assinatura do eleitor”, diz a assessoria, em resposta a um pedido feito pelo MBL (Movimento Brasil Livre) em dezembro do ano passado.
Para o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques, no entanto, a medida “é lícita, mas não é possível”, afirmou em parecer ao tribunal. “Todo o esforço na Justiça Eleitoral é devotado ao tratamento dos documentos em papel.”
Jacques diz que o meio eletrônico “não é nem uma via universal nem igualitária, nem uma via que simplifica e encurta os fluxos de trabalho como a biometria”. Para ele, a opção pode “empolgar à primeira vista”, mas causaria trabalho dobrado porque “apenas determina a existência de um novo tipo de conferência”.
Para Schaden, no entanto, a ideia é justamente oposta. “O TSE pode adquirir ou desenvolver um software próprio que reconhece as assinaturas imediatamente, como faz a Receita Federal.” O órgão só permite que o acesso a seu sistema por meio de um certificado digital.