Caso os deputados federais do PSL aliados do presidente Jair Bolsonaro desejem se desfiliar do partido e migrar para uma nova agremiação, eles correm o risco de perder o mandato. É o que diz a Lei 9.096, que trata dos partidos políticos no Brasil, e o que afirmaram três advogados especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo Estado.
“Se não houver justa causa na desfiliação, eles correm o risco de terem o mandato requisitado e sofrer um pedido de cassação por infidelidade partidária”, afirmou o advogado Hélio Carvalho da Silveira, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. Se o partido tiver sido incorporado a outro ou fizer fusão com outro, a migração ocorre sem perdas.
O texto considera justa causa três situações: uma mudança substancial ou “desvio reiterado do programa partidário”, uma grave discriminação política pessoal e a mudança nos 30 dias que antecedem o prazo de filiação para concorrer à eleição ao término do mandato vigente.
“O mandato pertence ao partido, que vai demandá-lo judicialmente. Os deputados teriam de comprovar no Tribunal Superior Eleitoral que saíram por justa causa ou ajuizar uma representação junto à Justiça Eleitoral fundamentando a saída, defendendo que o partido não cumpriu algo, mudou a forma de atuação”, concordou o advogado Luciano Pereira Santos, especialista em direito eleitoral. “Eles podem fazer uma pressão por serem um grupo grande, isso terá alguma influência, mas há um risco efetivo de perda de mandato.”
Para Hélio Silveira, o argumento de saída em grupo não é suficiente. “As causas de saída do partido são muito taxativas. Essa cisão, uma ruptura com o partido, não me parece prevista na norma”, afirmou. Caso deixem o PSL, os deputados deixarão com a sigla a verba e o tempo de TV para seus colegas. “Isso pertence ao partido. E é outro problema, ainda mais no PSL, que tem um dinheiro muito alto.”
Na tarde de terça, o presidente anunciou a intenção de criar um partido, o Aliança Pelo Brasil, para o qual iriam pelo menos 20 deputados do PSL. Eles só deixariam o partido quando a nova legenda fosse criada.
Antes, a lei previa a migração de partido para um novo sem perda de mandato. Uma resolução de 2015, contudo, passou a não considerar como justa causa a mudança para a criação de uma nova sigla.
“A lei antiga gera muita confusão. Antes, quando eles migravam para novos partidos, poderiam ir sem problemas. Mas, na última reforma, sem haver causa justa evidente, é prevista a cassação”, confirmou Tony Chalita, mestre em direito constitucional e especializado em direito eleitoral. Ele descarta a hipótese de o deputado fazer um acordo “amigável” com o partido sem judicializar a questão. “O suplente também é legítimo e ele pode requerer o mandato se quiser.” Em casos de expulsão, como na situação de Alexandre Frota, que foi do PSL e agora integra o PSDB, o deputado mantém o seu mandato e seus direitos.
Valorização dos partidos
Para Pereira dos Santos, que também já presidiu a Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, existe uma discussão importante como pano de fundo dessa questão: a valorização dos partidos e sua importância para o funcionamento de uma democracia sólida.
Ele compara o partido a um casamento. “Tem que escolher muito bem porque vai conviver, entender a questão programática, a ideologia, as condições. As pessoas mudam de partido como se muda de roupa”, criticou. “Não se dá a importância e não se respeita a fidelidade partidária, o que acaba passando para a população a não necessidade de partidos fortes. Pelo contrário: eles são fundamentais na democracia. Só se faz política em grupo, não se faz sozinho.”