O parlamentar recebeu 1,8 milhão de votos na eleição de 2018
Nascido e criado no Rio de Janeiro, fã de praia e das ondas, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) viu em São Paulo um nicho interessante para expandir a franquia eleitoral da família do presidente da República. Ao ser eleito em 2014 com 82 000 votos, o Zero Três — seus irmãos Flávio e Carlos receberam do pai, Jair, os apelidos de Zero Um e Zero Dois, respectivamente — morava em um apartamento na Lapa, na Zona Oeste, próximo à sede da Polícia Federal, onde trabalhava como escrivão.
Quatro anos depois, reeleito com 1,8 milhão de votos, um recorde para o Congresso, Eduardo deu baixa não só no cargo da PF e no apartamento, mas também no estado. O parlamentar veio apenas oito vezes a São Paulo entre janeiro e junho deste ano, seis delas saindo de Brasília, segundo dados da Câmara.
De volta à capital federal, foram apenas quatro voos partindo de aeroportos paulistas, contra seis do Rio de Janeiro. Na declaração de bens à Justiça Eleitoral, Eduardo afirmou possuir dois apartamentos, um em Botafogo, avaliado em 1 milhão de reais, e o outro, mais simples, em Copacabana. Em processos judiciais, seu endereço é a capital fluminense.
Para não dizer que o deputado tem vínculo zero com os paulistas, ele mantém duas salas, de cerca de 70 metros quadrados no total e que custam 4 574 reais mensais, pagas com a verba de gabinete, em um prédio comercial no Paraíso, na Zona Sul. Segundo vizinhos, as portas vivem fechadas e o político não costuma dar as caras no pedaço.
“Às vezes vejo apenas um homem solitário, mas ainda assim é raro”, afirma um empresário que possui um escritório no mesmo andar. Na última segunda (5), um funcionário identificado como Rubens estava no local, mas não permitiu a entrada da reportagem. As prestações de contas corroboram as alegações. Em 2018, o gasto anual das duas salas com energia elétrica foi de 668 reais, uma média de 27 reais por mês em cada uma. Em um escritório próximo, que tem cinco funcionários e é equipado com aparelho de ar condicionado e geladeira, a despesa mensal com luz não sai por menos de 150 reais. Procurado, o deputado não respondeu aos questionamentos.
A lei não obriga o parlamentar a morar no estado pelo qual foi eleito nem determina a obrigatoriedade da instalação de escritórios. “Mas o uso indevido de dinheiro público pode resultar em cassação do mandato e responsabilização na Justiça por ato de improbidade administrativa”, afirma o advogado Arthur Rollo. “O dinheiro não é dele, é público. É a mesma coisa que um prefeito alugar um prédio para a instalação de uma secretaria e deixar o lugar às moscas”, completa o especialista em legislação eleitoral.
Mesmo quando tem a possibilidade de atuar em prol dos paulistas, com a distribuição das chamadas emendas parlamentares, Eduardo Bolsonaro perde de lavada na comparação com outros campeões das urnas. Recordista em 2014, com 1,5 milhão de votos, Celso Russomanno (PRB) liberou 3 milhões de reais neste ano. Mais votado de 2010, com 1,3 milhão de votos, Tiririca (PR) destinou 1,7 milhão de reais. Já Eduardo não liquidou um centavo sequer de emendas aos paulistas em 2019 — havia liberado 9,4 milhões de reais entre 2015 e 2018. Na apresentação de projetos de lei, o filho do presidente empata com o palhaço: cinco para cada um neste ano. Um deles (de autoria de Eduardo) declara a princesa Isabel patrona da abolição da escravatura no Brasil.
Seu primeiro mandato também não teve produção marcante. Apresentou 37 projetos em quatro anos, nenhum aprovado. Um deles visava a inscrever o falecido deputado federal Enéas Carneiro (sim, o do “Meu nome é Enéas!”) no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. “O deputado é eleito para representar o local e reconhecer seus problemas. O Eduardo ganhou pelo sobrenome, e não por ter ligações históricas com os paulistas”, diz o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getulio Vargas. “O suplente dele, da região de Sorocaba, pode exercer um melhor papel”, afirma, referindo-se ao médico Vinicius Rodrigues (PSL), que obteve 25 900 votos, o equivalente a 1,4% do que recebeu o titular. Entre as viagens internacionais recentes do deputado, que nada têm a ver com diplomacia, houve férias de julho na Indonésia (ele até postou um vídeo pegando onda por lá) e sua lua de mel, em maio, nas ilhas Maldivas, no Oceano Índico. Para os paulistas, a mudança de Eduardo para Washington pode ser um bom negócio.