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sexta-feira 26 de julho de 2019 às 11:27h

Desde 1966, só diplomatas de carreira assumem embaixada do Brasil nos Estados Unidos

POLÍTICA


Caso o presidente Jair Bolsonaro confirme a indicação do filho Eduardo ao cargo, quebrará uma tradição já consolidada na política externa brasileira: nomear à embaixada brasileira nos EUA, considerada a mais importante da diplomacia do País, apenas quadros do próprio Itamaraty. A prática não foi quebrada nem mesmo durante os anos de chumbo da ditadura militar.

Nos 114 anos da embaixada brasileira nos Estados Unidos — desde 1905 —, 31 embaixadores passaram pelo cargo. Apenas seis não trilharam carreira diplomática, ou seja, foram indicações pessoais dos presidentes da República da época. O último deles assumiu em 1964. Foi o ex-governador baiano Juracy Magalhães, que ficou na vaga até o ano seguinte.

Indicado pelo então presidente Humberto Castelo Branco, Juracy foi agraciado com o cargo devido à sua intensa atuação nas articulações junto ao governo norte-americano que ajudaram a viabilizar a chegada de Castelo Branco à Presidência da República.

De acordo com um levantamento do partido Cidadania, as seis indicações que não consideraram o requisito da carreira diplomática, mas sim aproximações pessoais, aconteceram antes de 1964. Além de Juracy Magalhães, foram outras quatro pessoas: Walther Moreira Salles, que ocupou a vaga duas vezes (1952 a 1953, e 1959 e 1961), Amaral Peixoto (1956 e 1959), Oswaldo Aranha (1934 e 1937) e Joaquim Nabuco (1905 e 1910). Nenhum deles, porém, era filho de presidente da República.

A cadeira em Washington está vazia desde 3 de junho, quando o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, exonerou Sérgio Amaral e o transferiu para o escritório de representação da pasta em São Paulo.

Indicado durante o governo de Michel Temer, o ex-embaixador é historicamente ligado ao PSDB. Amaral já foi porta-voz no Palácio do Planalto e ministro de Fernando Henrique Cardoso. Fernando Meirelles de Azevedo Pimentel, encarregado de negócios, responde pela embaixada em Washington interinamente até a confirmação do próximo nome para ocupar o cargo.

Indignação entre os diplomatas

Nos corredores do Itamaraty, há um temor de emitir opiniões abertamente. Mas existe também um clima de indignação geral. De acordo com fontes com quem o HuffPost conversou reservadamente, a inconformação não é tanto pelo fato de Eduardo Bolsonaro não ser funcionário de carreira do MRE. “Mas por não estar à altura do posto, normalmente ocupado por diplomatas de carreira ou políticos com seriedade semelhante”, afirma uma das fontes.

Os críticos reforçam que todos os nomes de embaixadores nos EUA que não eram da diplomacia já tinham um histórico político mais longo. (Leia abaixo sobre os ex-embaixadores indicados por afinidade)

Embaixadores brasileiros em outros países também acompanham com preocupação a situação. Temem pela imagem do País no exterior “em termos civilizatórios”. “[Preocupa] Que essa indicação prejudique negociações que exijam maturidade política, já que o presidente atende caprichos dele e do filho”, destaca um diplomata ouvido pelo HuffPost.

Mais um ponto de atenção no Itamaraty é quanto ao chanceler. Alguns avaliam que a nomeação do filho do presidente — que terá, inevitavelmente, uma linha direta com o pai — vai fragilizar o ministro, já que muita coisa passará “por cima” de Ernesto Araújo. “O que fragiliza o ministro fragiliza a instituição”, completa o diplomata.

Próximas etapas

Nesta quarta-feira (24), o Itamaraty enviou uma consulta formal aos Estados Unidos sobre o nome de Eduardo Bolsonaro para a embaixada. Contudo, esse procedimento já havia sido feito informalmente.

Após a resposta dos EUA — cuja expectativa é que seja positiva —, Jair Bolsonaro já pode formalizar aqui no Brasil a indicação, publicando a mensagem presidencial no Diário Oficial da União.

Essa mensagem segue para o Senado, onde a indicação passa por sabatina na Comissão de Relações Exteriores (CRE) e é votada em seguida. Depois passa por votação também no plenário da Casa. As duas análises ocorrem de forma secreta e se dão por maioria simples.

Mesmo entre aliados do governo, a intenção de Bolsonaro em indicar o filho causou surpresa. Porém, nos corredores do Senado, apesar do constrangimento, a avaliação da maioria é que Eduardo Bolsonaro deve ser aprovado para a embaixada. A articulação, porém, é expor o presidente Bolsonaro ao máximo e desgastar o filho ao limite na CRE.

Os 5 embaixadores nos EUA indicados por proximidade com os presidentes*

Joaquim Nabuco (1905 a 1910)

Designado pelo presidente Rodrigues Alves, foi o primeiro embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Ficou conhecido por defende o abolicionismo, com longa trajetória política e intelectual. Integrou também a missão diplomática brasileira em Londres.

Oswaldo Aranha (1934 a 1937)

Amigo e aliado de Getúlio Vargas, por quem foi indicado, colaborou nas articulações pós 1930. Chefiou o Ministério da Fazenda no primeiro governo Vargas. Embaixador, aproximou-se de Franklin Roosevelt.

Amaral Peixoto (1956 a 1959)

Casado com Alzira Vargas, filha de Getúlio Vargas, foi indicado à Embaixada nos EUA por Juscelino Kubitschek. Foi interventor e governador do Rio de Janeiro. Atuou na aproximação do Brasil com as forças Aliadas na Segunda Guerra. Em Washington, ajudou na retomada de relações comerciais entre Brasil e URSS. Também participou ativamente junto ao governo dos EUA para criação da OPA (Operação Pan-Americana).

Walther Moreira Salles (1952 a 1953 e 1959 a 1961) 

Foi designado primeiro por Getúlio Vargas e, depois, por Juscelino Kubitschek. FoI uma das figuras mais influentes da elite brasileira da época, com trânsito no governo americano antes mesmo de ser embaixador. Atuou para viabilizar a assinatura, em 1952, de um acordo bilateral regulamentando a troca de materiais estratégicos brasileiros por equipamentos militares.

Juracy Magalhães (1964 a 1965)

Designado por Castelo Branco, o ex-líder da UDN foi um dos principais articuladores do movimento que depôs João Goulart e deu início à ditadura militar, em 1964. Nos bastidores, foi encarregado de articular politicamente o nome do militar para assumir a Presidência da República. Na Embaixada, Juraci intercedeu na renegociação da dívida externa brasileira e a efetivação, no Congresso Americano, do Convênio Internacional do Café, que acabou aprovado após uma negociação de Juracy com o governo da Colômbia.

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