Em busca de uma agenda que não fique concentrada apenas na reforma da Previdência enquanto a economia continua enfraquecida, o governo tenta redesenhar a legislação do setor de infraestrutura. Nele está a maior aposta para atrair investimentos privados e, assim, retirar a participação direta do Estado em áreas como saneamento, telecomunicações e transporte. A expectativa da equipe econômica é que o país chegue a 2022 com um volume de investimentos de R$ 300 bilhões por ano nesses setores.
A premissa da equipe econômica é substituir, em várias frentes, o modelo de concessão de serviços públicos, que acontece via licitações, pelo de autorização, que dispensa a necessidade de um amplo processo de leilões. Na prática, isso já acontece no caso da construção de terminais portuários de uso privado. Nesse tipo de contrato, o investidor não tem obrigação de, ao final de um período de concessão, devolver ao Estado a infraestrutura instalada.
Segundo Diogo Mac Cord, secretário de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia, no modelo de concessão, os investimentos tendem a minguar na medida em que os prazos acordados com o governo se aproximam do fim. Pelos cálculos da área econômica, se a regra mudar, o nível de investimento anual em infraestrutura deve chegar a R$ 300 bilhões em 2022, o que impulsionaria a criação de dois milhões de empregos. No ano passado, esse tipo de investimento chegou a R$ 120 bilhões — apenas 1,7% do PIB.
— Tudo o que é investido em 30 anos, todos os ativos que se tem, são revertidos para o poder concedente. No fim, não se investe quase nada. No modelo de autorização, o negócio é do investidor: ele presta aquele serviço e é regulado — afirma Mac Cord.
A ideia tem lastro em uma série de projetos que tramitam no Congresso, alguns desde o governo passado. Para a área de telecomunicações, um projeto de lei de relatoria da senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) estabelece a substituição do modelo de concessão pelo de autorização para operadoras. De acordo com o governo, o novo desenho permitirá que mais empresas atuem nesse mercado — e isso tem o potencial de escalar a cobertura de telefonia e internet no país.
Telefonia e ferrovias
De acordo com especialistas, a regra que hoje rege o setor, de 1997, está defasada. Isso porque ela leva em consideração a demanda tecnológica da época, que girava em torno do cabo de telefonia fixa. Isso conferia ao setor um caráter de monopólio natural. Ainda hoje, as operadoras de telefonia têm a obrigação de destinar recursos para a instalação de orelhões. Na prática, isso acaba sendo contabilizado como superávit pelos cofres do Tesouro Nacional, já que hoje, no país, os celulares dominam.
— O tipo de investimento demandado não é mais tão intensivo em capital como era antes, por conta do uso das linhas fixas. O que as empresas precisam é de autorização para explorar faixas de frequência. Ao acabar com o modelo de exploração exclusiva, ganha-se em competição. Quanto mais empresas puderem instalar antenas, melhor para os consumidores — diz Fernando Marcato, consultor da GO Associados.
Nessa configuração, as operadoras de telefonia poderão depender apenas da autorização de um condomínio, por exemplo, para instalar antenas de 4G e 5G em uma área de alta demanda por internet móvel.
O governo quer aplicar a mesma sistemática para viabilizar a construção de pequenas ferrovias — as chamadas short lines —, comuns nos Estados Unidos. A discussão entrou em pauta no Congresso por conta de um projeto do senador José Serra (PSDB-SP) no ano passado e leva em consideração uma série de trechos fundamentais para o escoamento de grãos e outros tipos de produtos que ficam de fora das grandes concessões de transporte. Em muitos casos, eles se mostraram inviáveis do ponto de vista do retorno do investimento dentro de um grande edital de concessão.
— Um (investidor) particular fica autorizado a assumir o risco, a executar aquele serviço e ser remunerado por isso, sem a contrapartida de devolver aquele ativo para o governo. E a agência reguladora só intervém se entender que há prejuízo à segurança ou ao princípio da concorrência — explica Fábio Araújo, diretor de parcerias do Ministério da Infraestrutura.