A reforma ministerial iniciada pelo presidente Lula da Silva (PT) com as trocas na última semana nas pastas da Saúde e de Relações Institucionais não deve ser suficiente para resolver os problemas enfrentados pela gestão do petista, na visão de aliados. Ao contrário, entre integrantes do governo e congressistas há segundo a coluna de Sérgio Roxo, do O Globo, um receio de que a indicação de Gleisi Hoffmann para comandar a articulação política sinalize um movimento de fechamento do governo em torno do PT e torne ainda mais difíceis as articulações no Legislativo. Interlocutores do Palácio do Planalto também veem dificuldades para a amarração de alianças com vistas a 2026, diante da queda de popularidade do chefe do Executivo, e avaliam que o ritmo de execução de projetos seguirá o mesmo, em meio a travas impostas pela Casa Civil.
O anúncio na sexta-feira da nomeação da presidente do PT para a pasta com assento no Palácio do Planalto pegou de surpresa inclusive ministros. Havia uma expectativa de que Lula sinalizasse uma abertura do governo com a indicação de um nome de outro partido para função, como já aconteceu na passagem anterior do petista pelo Planalto.
Apesar da possibilidade de Glesi assumir a SRI ter sido noticiada há pelo menos uma semana, pessoas próximas a Lula não acreditavam nessa possibilidade por causa do impacto negativo que a nomeação teria tanto no mercado financeiro como entre parte de políticos de centro, o que acabou acontecendo. O dólar atingiu R$ 5,91, com alta de 1,5%, após a divulgação da notícia.
Uma liderança petista próxima a Lula diz que a nova ministra da articulação política tem um perfil que não se encaixa nas exigências do cargo que irá ocupar. Suas maiores habilidades, segundo esse aliado, não são a negociação e a mediação e, sim, o combate e a defesa dos interesses da esquerda. Lembra também que ela tem muitas arestas por toda a Esplanada.
Aposta em bom trânsito
Defensores de Gleisi no PT contra argumentam que, apesar de ter assumido posições firmes no período em que esteve no comando do partido, a indicada por Lula para liderar a relação com o Congresso tem um bom trânsito no mundo político porque cumpre acordos. Lembram que ela articulou com Rodrigo Maia a candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) à presidência da Câmara em 2021 e manteve a posição mesmo diante dos sinais de que a empreitada não seria vitoriosa — a eleição foi vencida pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), que ficou à frente da Casa por quatro anos. Também afirma que ela possui relações próximas com diversas lideranças partidárias, entre elas Gilberto Kassab, presidente do PSD, e os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).
Além disso, a escolha também consolida o enfraquecimento interno do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Apesar das perspectivas de uma mudança de postura na nova função, Gleisi carrega um histórico de liderar as críticas do partido à política econômica nos dois primeiros anos do terceiro mandato de Lula.
Apesar de as demais mudanças ainda não terem sido definidas, dificuldades que os ministros relatam enfrentar na Casa Civil, por exemplo, vão persistir, já que Rui Costa será mantido pelo presidente. Os titulares das pastas se queixam, principalmente, que os seus projetos não andam quando chegam na pasta responsável pela coordenação das ações do governo. Também reclamam da forma de tratamento por parte do colega.
A reforma também não deve amarrar apoios para a eleição de 2026, como desejado anteriormente. O objetivo inicial do governo era atrelar os partidos à candidatura seja de Lula ou de um indicado pelo petista, mas as legendas não querem se comprometer diante da queda de popularidade da da gestão acentuada nas últimas pesquisas.
Mudanças anteriores, como a entrada de ministros do Centrão em setembro de 2023, também não resolveram todos os problemas que preocupavam na época o governo, que continuou, por exemplo, tendo dificuldades no Congresso. Na época, Lula integrou o PP e o Republicanos ao governo. André Fufuca (PP) foi nomeado para o Ministério do Esporte e Silvio Costa Filho (Republicanos) para a pasta de Portos e Aeroportos. Na mesma mudança, o petista trocou o comando do Ministério do Turismo com a nomeação de Celso Sabino (União). A ocupante anterior da pasta, Daniela Carneiro, havia rompido com o próprio partido, o União Brasil, e a bancada da Câmara da sigla cobrava troca.
Mudança de postura
Um antigo aliado de Lula na Câmara entende que a relação com o mundo político só vai mudar se o próprio presidente voltar a ter o contato frequente com os congressistas como ocorria em seus dois primeiros mandatos. Além disso, o entendimento é que o petista tem ouvido pouco.
Com a queda na popularidade do governo, as cúpulas do União, do PP e do PSD se afastaram do petista, com críticas à atual gestão.
Ainda não está certo se Lula vai atender o pleito da bancada do PSD na Câmara por mais espaço. O partido se sente pouco representado com o Ministério da Pesca, comandado por André de Paula — o partido está à frente também da Agricultura, com Carlos Fávaro, e de Minas e Energia, com Alexandre Silveira.
Caso não ocorra a transferência do representante da sigla para uma pasta maior, haverá um descontentamento grande entre os parlamentares da sigla e isso poderá intensificar as dificuldades no Congresso.
Dança das cadeiras
- Gleisi Hoffmann: Petista ficou com a vaga de Alexandre Padilha na articulação política. Voltou a assumir um cargo de ministra 11 anos após ter comandado a Casa Civil. Presidente do PT, é um nome fiel de Lula e de uma ala mais à esquerda do partido, o que não agradou muito alguns aliados.
- Alexandre Padilha: O ministro petista deixou a articulação política do governo para reassumir a Saúde, pasta que comandou entre 2011 e 2014. Substituiu Nísia Trindade, nome técnico demitido por Lula após o presidente demonstrar insatisfação com a falta de resultados da gestão na área.
- Sidônio Palmeira: O publicitário assumiu a Secretaria de Comunicação no lugar de Paulo Pimenta, demitido após uma série de críticas de Lula às estratégias de comunicação do Planalto. Sidônio defende um “segundo tempo do governo”, com um diálogo mais direto com a população, por meio das redes sociais.
Desafios à vista
- Articulação difícil: Para congressistas petistas e aliados, a indicação de Gleisi Hoffmann para comandar a articulação política pode sinalizar um movimento de fechamento do governo em torno do PT. Caso isso aconteça, a vida do Planalto se tornaria ainda mais difíceis no Legislativo.
- Alianças eleitorais: Interlocutores do Planalto também veem dificuldades para a amarração de alianças com vistas a 2026, diante da queda de popularidade de Lula. Mudanças anteriores, como a entrada de ministros do Centrão na gestão, não renderam a fidelidade esperada por parte das legendas.
- Entregas do governo: Integrantes do governo, congressistas e aliados ainda avaliam que o ritmo de execução de projetos por parte do governo seguirá o mesmo, em meio a travas impostas pela Casa Civil, desagradando aliados. Para o Congresso, o governo promete muito, mas é lento na entrega.