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sexta-feira 10 de janeiro de 2025 às 19:45h

Até que ponto as redes sociais podem influenciar uma eleição

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Elon Musk faz campanha no X para a ultradireita na Alemanha; Romênia anula eleição por ingerência russa via TikTok. Qual é o real poder das redes de manipular valores e convicções políticas? Em 23 de fevereiro de 2025, a Alemanha define seu novo Parlamento, em eleições antecipadas. Para o multibilionário Elon Musk, está claro quem deve vencer: a Alternativa para a Alemanha (AfD). Só ela pode salvar o país, escreveu o aliado de Donald Trump em sua plataforma X, ao convidar Alice Weidel, colíder desse partido – em parte classificado como extremista de direita pelo serviço de segurança interna alemão –, para uma conversa online, transmitida ao vivo na quinta-feira (9).

A AfD é considerada a legenda alemã mais ágil nas redes sociais, sobretudo na plataforma chinesa TikTok, onde centenas de milhares consomem seus vídeos. O assessor de política e comunicação Johannes Hillje estima que em 2022 e 2023 cada conteúdo foi acessado mais de 430 mil vezes. Para comparar: em segundo lugar ficaram as conservadoras União Democrata Cristã e Social Cristã (CDU/CSU), com uma média 90 mil visualizações.

Segundo Andreas Jungherr, professor de ciências políticas e transformação digital da Universidade Otto Friedrich, de Bamberg, a questão não é que as mídias sociais favoreçam os partidos de ultradireita: “A AfD já estava nas redes sociais desde cedo”, e assim aprendeu que tom funciona melhor.

Trata-se de uma clara vantagem em termos de alcance, mas não basta para assegurar uma vitória eleitoral. Prova disso teria sido a campanha da candidata democrata à presidência americana em 2024, Kamala Harris, cuja enorme penetração nas redes não resultou na conquista da Casa Branca.

Redes sociais ajudam a cimentar valores e convicções

Como os resultados de buscas e conteúdos sugeridos nas redes são personalizados, criam-se no espaço online “bolhas de filtros” e “câmaras de eco”. Os algoritmos dos provedores determinam o que é apresentado aos usuários, priorizando conteúdos de personalidades conhecidas ou que muitos usuários curtiram ou comentaram – e deixam de mostrar aquilo que é ignorado com frequência.

Assim se cria uma perspectiva unilateral: a própria visão de mundo é reforçada, as contrárias são obliteradas, cimentam-se acima de tudo os valores e convicções pré-adquiridos.

Por isso as mídias de todo tipo têm influência mínima sobre decisões eleitorais, explica a professora de pesquisa de comunicação Judith Möller, que estuda os efeitos sociais da mídia junto ao Instituto Leibniz.

“A decisão eleitoral tem motivações diversas. Depende de onde a pessoa cresceu, de suas experiências pessoais, principalmente nas semanas antes do pleito, ou com quem mais ela conversa sobre a eleição e política.” São os mesmos fatores que, segundo Möller, influenciam a escolha de determinadas redes e que impacto elas têm.

A mídia social permite que novos movimentos e partidos ganhem visibilidade muito rápido. Mas em princípio elas servem para alcançar, acima de tudo, os próprios adeptos – e eventualmente alguns indecisos. “Na verdade, quase não é possível convencer alguém de algo novo, mas só convencer mais ainda quem já está convicto de alguma coisa”, resume a pesquisadora.

Fake news vencem também pela insistência

No futuro, a confrontação com as fake news ficará ainda mais problemática. E seu volume deverá aumentar quando, como anunciado pelo fundador da Meta, Mark Zuckerberg, a empresa abrir mão da checagem de dados profissional em suas plataformas, como o Facebook e Instagram, e passar a bloquear cada vez menos conteúdos questionáveis.

Aqui observam-se dois efeitos, frisa a professora Nicole Krämer, diretora do setor de Psicologia Social, Mídia e Comunicação da Universidade Duisburg-Essen.

Por um lado, consultas populares mostraram que o público não quer se deixar enganar por desinformação. “Quanto mais importante uma questão é para a própria vida, mais hábil ele é em procurar informações que realmente o auxiliem, ou seja: que tenham credibilidade e considerem as duas perspectivas.”

Por outro lado, quando a desinformação corrobora crenças pré-existentes, ela pode ser considerada pelo menos plausível, “mesmo que de início a gente pense: não pode ser”.

E há um outro mecanismo, prossegue Krämer: “Quando mais se escuta, lê ou vê uma notícia falsa, mais provável é que ela permaneça na memória.” O resultado é que às vezes as fake news se estabelecem – apesar do desejo de, na verdade, evitá-las.

Judith Möller antecipa uma proliferação das fake news nas redes sociais, pois há cada vez menos opiniões diversificadas nesses ambientes, devido ao clima de interação cada vez mais agressivo, com ofensas ou discurso de ódio: “Assim, determinados grupos se distanciam das discussões. Só fica quem consegue lidar com essa cultura tóxica.”

Prova de fogo para a democracia

Em dezembro de 2024 o Supremo Tribunal da Romênia deliberou que, através da plataforma social chinesa TikTok, a Rússia teria interferido maciçamente nas eleições parlamentares do país que deram vitória à ultradireita pró-russa, e ordenou a repetição do pleito.

Mas será realmente possível influenciar o resultado das urnas a esse ponto, através das redes?

O cientista político Jungherr ressalta que, do ponto de vista científico, é errado achar que redes sociais não influenciam a campanha. Mas frisa que é preciso analisar bem como a campanha se desenrolou. “Principalmente quando suspeitamos de influência estrangeira nas eleições, há outros caminhos que independem do TikTok”, afirma.

O que torna uma mensagem bem sucedida não é o uso em si das redes sociais, concorda Möller, e sim o fato de ela dialogar com temas de interesse que ganham espaço nas redes sociais, mas são ignorados em outros meios.

As discussões nas plataformas sociais não devem ser ignoradas, mas é preciso contextualizá-las bem, frisa Philipp Müller, conselheiro acadêmico do Instituto de Ciências da Mídia e da Comunicação da Universidade de Mannheim.

“De certo modo, as redes sociais apresentam uma imagem distorcida da realidade, pois com frequência posições ignoradas são hiperacentuadas e parecem talvez maiores do que eram originalmente na população como um todo.”

Isso, segundo ele, se aplica também aos grandes movimentos progressistas dos últimos anos, como o de tolerância perante as diversas identidades de gênero.

Jungherr vê nas redes sociais uma espécie de prova de fogo para a democracia: os meios digitais de fato tornaram visíveis as linhas de fratura entre as diversas posições na sociedade, mas não as representam corretamente.

Por isso, argumenta, é preciso se perguntar: “Este é realmente um problema da sociedade em geral? O que dizem os fatos? E se se trata mesmo de um problema, é possível resolvê-lo por meios políticos?”

Quando a sociedade recalca tais temas, em vez de analisá-los e situá-los num contexto, “a democracia desperdiça uma chance”, afirma Jungherr.

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