Na manhã do último dia 10, vizinhos de um condomínio de classe média alta de Salvador presenciaram uma cena insólita. Um homem abriu a janela dos fundos de um apartamento e atirou para fora uma sacola com mais de R$ 220 mil divididos em maços gordos de notas de R$ 100. Naquela mesma hora, a Polícia Federal batia na porta da frente. Poucos minutos depois, o dono do dinheiro, o vereador Francisco Nascimento, da cidade de Campo Formoso, norte da Bahia, saía dali para a cadeia. Desde então, segundo a colunista Malu Gaspar, do O Globo, os gabinetes do Congresso e da Esplanada dos Ministérios entraram em modo pânico.
Francisco é primo do líder do União Brasil na Câmara dos Deputados, Elmar Nascimento, e um dos alvos de uma operação que apura o desvio de recursos de programas do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs). Tudo dinheiro de emendas parlamentares, incluindo as do orçamento secreto.
Além do dinheiro do vereador, foram interceptados pela PF também o avião alugado por um dos chefes do esquema — o empresário José Marcos de Moura, conhecido como Rei do Lixo na Bahia, que pousou em Brasília levando R$ 1,5 milhão em dinheiro vivo e uma pilha de documentos.
Na papelada havia uma planilha de 50 páginas com nomes, valores e detalhes de contratos espalhados por 17 estados e dezenas de municípios com toda a pinta de ser a contabilidade do grupo criminoso. Só neste ano, a quadrilha identificada pela Polícia Federal movimentou R$ 824 milhões.
Trocas de mensagens captadas pela PF mostram que o grupo de investigados contava com a liberação de R$ 14 milhões de uma emenda para obras em Juazeiro (BA) via Dnocs, mas a Caixa Econômica Federal barrou a operação. Eram os últimos dias de 2023, mas eles tinham urgência. Recorreram à chefe de gabinete de um influente senador, que conseguiu destravar os recursos nas últimas horas do dia 31 de dezembro.
À primeira vista, tudo parece ter voltado ao normal no Congresso, dia Malu Gaspar, do O Globo. Mas, ainda de acordo com a colunista, só parece. Enquanto contam os desembolsos, assessores e parlamentares se perguntam até quando dura a bonança — e quem será o primeiro a cair quando as planilhas descobertas no avião do Rei do Lixo começarem a falar.