Com o objetivo de mapear tecnologias e iniciativas socioambientais de resiliência e enfrentamento aos processos de desertificação e aridez que afetam a região Norte da Bahia, a Secretaria do Meio Ambiente (Sema) deu início, nesta segunda-feira (2), a uma série de encontros e visitas às comunidades rurais dos municípios de Chorrochó, Macururé, Abaré, Rodelas e Curaça. As atividades fazem parte da elaboração de um plano de ação, do Governo da Bahia, nas áreas de infraestrutura hídrica, conservação e restauração do bioma Caatinga, agricultura, segurança alimentar e acesso à água, entre outras intervenções para atender famílias afetadas por esse processo climático.
Em Chorrochó a equipe começou o dia participando de uma reunião promovida pela ONG Agendha, reunindo representantes da gestão municipal, organizações sociais e moradores, logo após visitas técnicas às áreas identificadas como áridas nos municípios do Território de Identidade Itaparica. O especialista em Meio Ambiente da Sema, Magno Monteiro, explica que o foco é a elaboração de um Plano de Ação para enfrentar os impactos da aridez na região.
“São as comunidades locais, aqueles que vivem e tem sua renda vinculada a esse clima semiárido e avançando para o árido, como indicado em estudos recentes, que detém conhecimento sobre os desafios enfrentados e quais caminhos adotaram até aqui. Verificaremos também soluções imediatas, que são aquelas que já existem e por questões operacionais ou de gestão não estão em pleno uso, a exemplo de cisternas, barramentos, adutoras e a experiência da atividade de criação de caprinos e ovinos das comunidades tradicionais”, destacou.
De acordo com Jeferson Viana, consultor da Casa Civil, a missão também busca identificar práticas bem-sucedidas de convivência e os principais gargalos que implicam em políticas que não alcancem determinadas localidades. “Atua com a responsabilidade de análise e acompanhamento das políticas públicas de inclusão socioprodutiva e sustentabilidade, sendo essencial registrar as potencialidades e os desafios sociais e ambientais do território. Também estamos fortalecendo articulações institucionais com prefeituras, organizações de assistência e a população, para além do acesso à água, incluindo na pauta a preservação ambiental e a impulsão das cadeias produtivas locais”.
Os moradores da região também expressaram suas expectativas com a iniciativa. O agricultor familiar, José Nascimento, 60 anos, morador de Lagoa de Pedra, em Chorrochó, apresentou sua produção de hortaliças, cultivada com o apoio de uma cisterna do Água Para Todos e de um barreiro convencional. “Recebi assistência técnica da Arcas quando fiz um pequeno viveiro com estufa, onde produzo coentro, salsinha, abobrinha e cebola para consumo e venda na feira da cidade. Meu pai construiu esse barreiro, eu ampliei, criei nove filhos com essa escassez de água e também com muito sacrifício, preciso do apoio para pagar a limpeza da aguada e melhorar o viveiro”, relatou.
Já Dona Maria Silva, 62, do povoado Barra da Areia, falou sobre as dificuldades e preocupação com o futuro da sua família e vizinhos. “Com o Riacho da Vargem seco, pegamos água salobra em cacimbas para dar aos animais e uso na casa, mas tem ano que seca tudo. Para beber uso da cisterna abastecida por carro-pipa. A gente vem enfrentando muitas dificuldades com a falta de chuva e o calor mais forte. O que queremos é apoio para continuar produzindo sem precisar deixar a terra onde nascemos”.
Iniciativas das comunidades
Entre as práticas vivenciadas nas visitas, destacam-se a utilização da cisterna calçadão e de enxurrada, assim como barreiros ou aguadas como reserva de emergência. Associado às cisternas de produção, a implantação de canteiros (com prática de cobertura do solo) e de estufas teladas (sombrites) potencializam a capacidade produtiva das culturas, propiciando também um ambiente mais digno ao trabalhador, evitando o trabalho a pleno sol. Importante tecnologia, que tem dado resultado é a barragem subterrânea, que promove a contenção do fluxo da água do lençol freático raso, que se acumula a montante da barragem, mantendo a umidade do solo em profundidade apropriada para captação pelo sistema de cultivos anuais de feijão, milho e outras culturas.
Outro ponto constatado foi a forma racionalizada e produtiva de gerir o uso da água, fruto do conhecimento tradicional potencializado pelas técnicas adquiridas através dos serviços de assistência técnica e extensão rural (ATER). Um exemplo são as cisternas entregues pelo Governo do Estado, por meio de contrato com a ONG Agendha, que, ao mesmo tempo, oferece capacitação para pedreiros das próprias comunidades beneficiadas, que passam a ser contratados para atuarem na construção destes equipamentos.
Os trabalhos contam com especialistas da Sema, da Casa Civil, Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR), por meio da Companhia de Ação e Desenvolvimento Regional (CAR), além do apoio da ONG Agendha (Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia) e da Associação Regional de Convivência Apropriada ao Semiárido (ARCAS). Coordenador técnico da ONG Agendha, Maurício Aroucha, ressaltou: “esse trabalho conjunto é essencial para transformar a realidade local. A troca de experiências e o mapeamento das tecnologias sociais são caminhos para fortalecer a resiliência das comunidades frente aos desafios climáticos”.
Na oportunidade, o coordenador apresentou a chamada pública Ater Bahia Sem Fome, uma iniciativa do Governo da Bahia, por meio da Superintendência Baiana de Assistência Técnica e Extensão Rural (Bahiater), tem como objetivo garantir a segurança alimentar, nutricional e hídrica de cerca de 20 mil famílias em situação de vulnerabilidade, especialmente aquelas que vivem no campo, com duração de aproximadamente quatro anos.
Clima árido
Estudo divulgado no fim de 2023 pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), identificou características de clima árido no norte da Bahia. A primeira vez que essa condição foi registrada no Brasil, onde verificou-se em uma série histórica de 30 anos a redução de nuvens, diminuição das chuvas e aumento da incidência de radiação solar de ondas longas sobre a terra.