A menos de um mês das eleições, as campanhas aceleraram gastos com anúncios nas redes sociais, e candidatos a prefeituras têm direcionado propaganda a parcelas do eleitorado em que concentram maior rejeição, na tentativa de quebrar resistências. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registra segundo reportagem de Daniel Gullino, do O Globo, R$ 26 milhões em despesas com a Meta, controladora de Facebook e Instagram, o que torna a empresa a maior fornecedora da eleição até o momento. O valor já se aproxima dos R$ 35 milhões desembolsados em 2020— e ainda há 41 dias de disputa pela frente nas cidades com segundo turno.
Ao programar uma propaganda, é possível definir localidade, gênero e idade do eleitor que se quer atingir, além de interesses particulares, que vão da religião a preferências culturais.
Em São Paulo, por exemplo, Guilherme Boulos (PSOL) fez 22 anúncios voltados para evangélicos, fatia do eleitorado onde tem 14% dos votos, contra 25% no total, de acordo com a pesquisa Datafolha — a rejeição a ele no segmento também é maior que no geral. Foram escolhidas as palavras-chaves “pastor” e “teologia bíblica”, entre outras. O direcionamento detalhado da Meta é baseado na atividade das pessoas, como as páginas com quais elas interagem ou os anúncios em que clicam.
Segurança e mais ricos
Também houve nove anúncios voltados para pessoas interessadas em temas de segurança pública, como a Polícia Militar. O tema, que costume gerar desgaste para a esquerda, é visto como prioridade pelo eleitor paulistano, com 20% das menções, à frente de saúde e educação, com 18%, de acordo com o Datafolha. Boulos ainda direcionou vídeos com sua candidata a vice, a ex-prefeita Marta Suplicy (PT), para bairros da periferia onde ela é popular, como Parelheiros e Jardim Ângela.
Já o prefeito Ricardo Nunes (MDB), ainda de acordo com O Globo, direcionou publicações principalmente para a zona leste, a mais populosa da capital. Por outro lado, também buscou atingir pessoas interessadas em temas como “viajantes internacionais frequentes”, “resorts de luxo” e “bens de luxo”. Entre os mais ricos, com renda mensal acima de cinco salários mínimos por mês, a intenção de voto do prefeito é numericamente abaixo do total (23% contra 27%).
Neste recorte do eleitorado, Boulos aparece na frente, com 34%, enquanto o candidato do PRTB, Pablo Marçal, tem 21%. O ex-coach é visto pela campanha de Nunes como o principal concorrente na briga pelo segundo turno, por concorrerem na mesma faixa, tentando atrair eleitores de centro e direita e que rejeitam a esquerda.
Tabata Amaral (PSB), por sua vez, direcionou 43% de suas publicações patrocinadas para mulheres, enquanto as demais não especificaram o gênero. Em um desses vídeos, ela diz que “na hora do problema, é a mulher que resolve” e que candidatos homens não estão preocupados com temas como saúde e educação. Integrantes da campanha veem margem para ampliar apoio no segmento feminino.
— Parece mais eficiente falar de temas para eleitorados específicos. Então, em vez de falar “vamos resolvendo a saúde”, a gente trata da fila do exame. A gente consegue investir volumes menores, em mais assuntos diferentes — afirma o marqueteiro de Tabata, Pedro Simões.
Pablo Marçal, que cresceu na disputa reforçado por um grande número de seguidores nas redes sociais, e com uma estratégia de pagamento por cortes que virou alvo da Justiça Eleitoral, não fez direcionamento de público.
Em Belo Horizonte, a disputa pelo segundo turno também está embolada. O candidato do Republicanos, Mauro Tramonte, está na liderança, com 29%, segundo o Datafolha, enquanto três candidatos estão em segundo lugar: o prefeito Fuad Noman (PSD), com 14%; Bruno Engler (PL), com 13%; e Duda Salabert (PDT), com 12%.
No caso do prefeito, o principal direcionamento feito pela campanha foi a exclusão de pessoas interessadas em temas como “tiro prático” e “segurança nacional”, em 29 anúncios.
Um dos seus adversários é o deputado estadual Bruno Engler (PL), apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e vinculado a pautas de direita. De acordo com o Datafolha, 79% dos eleitores de Engler se dizem bolsonaristas, índice que é de 21% nos apoiadores de Fuad. O entendimento da campanha do prefeito é que seria desperdício direcionar anúncios para um segmento que já aderiu a outro concorrente.
Por outro lado, Fuad também mirou, em 15 peças, pessoas relacionadas com o transporte público. Uma das vitrines dele é o programa Tolerância Zero, lançado em janeiro para fiscalizar irregularidades em ônibus.
A aprovação do prefeito, segundo o Datafolha, é de 33%, mais do que o dobro das intenções de voto. A avaliação conjunta de ambos os números revela que eleitores que avaliam positivamente a gestão de Fuad estão optando por outros candidatos, movimento que o prefeito tenta conter.
Engler, por sua vez, fez 15 publicações voltadas para outras cidades de Minas Gerais — como Betim, Confins e Contagem —, atingindo, portanto, eleitores que em tese não votam em Belo Horizonte. A campanha informou que foi uma ação pontual, destinada a divulgar uma visita de Bolsonaro, e que teve como objetivo alcançar pessoas que votam na capital, mas moram na Região Metropolitana.
No Rio, o prefeito Eduardo Paes (PSD) privilegiou em bairros da Zona Oeste, como Barra da Tijuca, Bangu e Realengo. Essa foi a região onde ele teve o pior desempenho há quatro anos: chegou a perder em algumas zonas eleitorais no primeiro turno, e no segundo venceu por pouco mais de 50%, contra 64% em toda a cidade. Por outro lado, em parte das publicações foram excluídos bairros da região central onde ganhou com facilidade há quatro anos.
Tentando equilibrar-se entre os espectros políticos, Paes também direcionou anúncios tanto para interessados em temas como sociologia e antropologia, mais vinculados à esquerda, como teologia e estudos religiosos, geralmente associados à direita.
Tarcísio Motta (PSOL) apostou em envolvidos com temas como filantropia, artes cênicas, energia renovável e democracia, enquanto Alexandre Ramagem (PL) optou por não fazer direcionamento até o momento.
Fortaleza é, junto com São Paulo, a cidade com mais gastos na Meta: o prefeito Sarto (PDT) é o segundo que mais teve despesas no geral, e Evandro Leitão (PT) é o quarto — o primeiro e o terceiro são Nunes e Boulos, respectivamente. O quinto colocado geral também é da capital cearense: Capitão Wagner (União Brasil).
Sarto fez anúncios excluindo um conjunto de bairros nos quais ganhou em 2020, enquanto Leitão eliminou os interessados em “pessoas que preferem produtos de valor alto no Brasil” — o que indica uma estratégia de buscar ampliar o apoio em segmentos de baixa renda, onde o PT é tradicionalmente mais forte.
Ainda na capital cearense, Capitão Wagner (União Brasil) apostou em bairros nos quais a eleição foi apertada em 2020, quando ele perdeu para Sarto no segundo turno. Ele também mirou servidores públicos, interessados em família e cristãos.
Busca pelo centro
Em Porto Alegre, a candidata Maria do Rosário (PT) excluiu, em 132 anúncios, temas relacionados à direita, como o Exército e a Polícia Militar. Em outros 129, retirou os interessados no agronegócio, que é forte no estado.
Mas a petista também fez o mesmo com temas ligados à esquerda: em 84 propagandas, retirou o público interessado em “movimento social”, na banda Racionais MC’s e nas cantoras Anitta e Ludmilla. Em outras 40, também excluiu os interessados nas páginas Dilma Bolada e Quebrando o Tabu. A campanha da petista informou que faz a inclusão ou exclusão de determinados interesses “principalmente com o objetivo de ampliar a campanha para o eleitorado de centro”.
Na última pesquisa Quaest, Maria do Rosário aparece com 31%, enquanto o prefeito Sebastião Melo (MDB) tem 36%. Concorrendo à reeleição, o emedebista também excluiu quem interage com duas das mesmas páginas — Quebrando Tabu e Dilma Bolada — de 40 das suas publicações patrocinadas. Em outras seis, preferiu não alcançar os possíveis eleitores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.