O tradicional santinho com o número de urna ainda faz parte das campanhas eleitorais, mas novas formas de comunicação têm ganhado destaque na disputa. O impulsionamento de conteúdo nas redes sociais, por exemplo, se tornou uma ferramenta central para muitos candidatos. Em São Paulo, os principais postulantes à Prefeitura investiram mais de R$ 2 milhões nesse serviço nos últimos 30 dias, sendo que 87% do valor – cerca de R$ 1,7 milhão – foi gasto apenas na última semana.
Especialistas em marketing político concordam que o sucesso de uma campanha depende de uma estratégia sólida nas redes sociais, incluindo o impulsionamento de conteúdo. A principal vantagem dessa ferramenta é a possibilidade de direcionar mensagens personalizadas para grupos específicos do eleitorado. Na capital paulista, os candidatos têm usado esse serviço com foco em mulheres e moradores das periferias.
Candidato à reeleição, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), foi quem mais gastou com impulsionamento de conteúdo nas redes sociais, segundo a biblioteca de anúncios da Meta, dona do Facebook e Instagram. O emedebista destinou R$ 1 milhão para promover mais de 670 publicações nessas plataformas entre 6 de agosto e 4 de setembro, sendo que quase a totalidade desse valor (98,9%) foi investido nos últimos sete dias.
O deputado Guilherme Boulos (PSOL) foi o segundo que mais gastou com o serviço, destinando R$ 675,8 mil para mais de 390 publicações. Em seguida, aparece a economista Marina Helena (Novo), que pagou R$ 195,4 mil em mais de 400 anúncios. A deputada Tabata Amaral (PSB) aplicou R$ 114,4 mil em quase 70 publicações, seguida pelo apresentador José Luiz Datena (PSDB), que desembolsou R$ 26,1 mil em quase 20 anúncios.
O influenciador Pablo Marçal (PRTB), por outro lado, não realizou nenhum impulsionamento no período analisado. Porém, ele está sendo investigado pelo Ministério Público Eleitoral por suspeita de ter pago para que internautas publicassem cortes – vídeos curtos e descontextualizados – favoráveis à sua candidatura. Se comprovada, a prática pode configurar abuso de poder econômico e dos meios de comunicação, além de caixa dois. Marçal nega as acusações.
Consultor em marketing político, Jader França conta que o fenômeno de usar impulsionamento nas redes não é exclusivo da disputa paulistana. “[Hoje] Não é possível realizar uma campanha eleitoral eficaz sem redes sociais e impulsionamento”, afirma. Ele explica que, normalmente, as campanhas investem de 10% a 20% do teto permitido para essas ações. Em São Paulo, o limite de gastos para candidaturas à Prefeitura é de R$ 67,2 milhões no primeiro turno e R$ 26,9 milhões no segundo.
Meta domina mercado de publicidade política na internet
Segundo a Meta, Boulos, Nunes, Marina, Tabata e Datena gastaram R$ 2.011.700,00 com impulsionamento entre 6 de agosto e 4 de setembro, sendo que R$ 1.751.400,00 foi desembolsado na última semana. Os intervalos de tempo foram definidos na sexta-feira, 6, com base nas limitações da biblioteca de anúncios, que permite consultar os gastos apenas do último dia, da última semana ou dos últimos 30 dias.
As mudanças na legislação eleitoral deste ano exigiram que as plataformas se responsabilizem pelo conteúdo publicado. Como resultado, grandes empresas como Google e Kwai interromperam a oferta de anúncios para campanhas eleitorais. Outras plataformas, como X e TikTok, nunca permitiram esse tipo de propaganda. Com isso, a Meta passou a dominar o mercado de publicidade política na internet.
Boulos e Nunes apostam em bairros periféricos
As estratégias de Boulos e Nunes mostraram semelhanças no último mês. Ambos foram os únicos a direcionar anúncios para bairros específicos, como foco em regiões periféricas. Eles também investiram em posts ao lado de seus respectivos padrinhos políticos. Uma das publicações com maior alcance de Boulos é uma foto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), enquanto a de Nunes é um vídeo com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
No fim de agosto, um influenciador divulgou um vídeo revelando que a campanha de Boulos impulsionou um conteúdo que o comparava à cantora pop americana Taylor Swift. A artista é popular entre o público feminino jovem e a comunidade LGBT+, segmentos que o psolista considera como eleitores em potencial. Apesar das críticas, a estratégia do PSOL vai além da simples produção de memes com celebridades.
Boulos tem direcionado anúncios para bairros periféricos, com o objetivo de atingir esse segmento do eleitorado. Dos 394 anúncios impulsionados, 19% foram segmentados por localidade, sendo que Cidade Tiradentes foi o distrito que recebeu o maior número de posts, com 73 anúncios. São Mateus e Sapopemba, na zona leste; Jardim Ângela e Cidade Ademar, na zona sul; e Brasilândia, na zona norte, foram outras regiões que receberam impulsionamento de conteúdo.
Para o estrategista em comunicação política Marcelo Vitorino, o impulsionamento e a mobilização são as peças mais importantes para as campanhas atuais. “O impulsionamento é a única garantia de entrega de conteúdo para fora das bolhas ideológicas, e a mobilização, quando bem-feita, pode dar às campanhas o tom certo para a vitória”, conta Vitorino, que também é professor de marketing político pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).
O professor de marketing político explica que cada campanha atribui relevância ao impulsionamento de formas diferentes. Segundo ele, campanhas com pouco tempo de televisão e rádio devem concentrar seus esforços no digital, dedicando até 30% do orçamento total a essas estratégias. “Outra avaliação deve ser feita de acordo com o perfil das candidaturas concorrentes. Se você tem adversários com força no digital, é necessário equiparar o jogo”, conta.
Nunes, por sua vez, segmentou 23% de seus 671 anúncios com filtro de localidade. Embora a Vila Mariana, um bairro de classe média na zona sul, tenha recebido o maior número de posts impulsionados, o candidato também direcionou anúncios para bairros periféricos como Capão Redondo (zona sul), Campo Limpo (zona sul), Brasilândia (zona norte), São Mateus (zona leste) e Tremembé (zona norte). Entre as publicações, destacam-se vídeos sobre a inauguração de obras nessas regiões.
A reportagem identificou que a campanha do MDB investiu em impulsionamento de conteúdo negativo contra adversários, apesar de a prática ser proibida pelo Tribunal Superior Eleitoral. Segundo a resolução 23.732/2024, “o impulsionamento de conteúdo em provedor de aplicação de internet somente poderá ser utilizado para promover ou beneficiar candidatura, partido político ou federação que o contrate, sendo vedado o uso do impulsionamento para propaganda negativa”.
Contudo, no início deste mês, a campanha de Nunes impulsionou um vídeo que chamava o candidato do PSOL de “invasor de casa”. A publicação foi suspensa por decisão judicial após a equipe de Boulos apresentar uma representação na Justiça Eleitoral. A campanha do prefeito foi procurada para comentar o caso na quarta-feira, 4, mas não retornou até a última atualização desta reportagem.
Tabata, Boulos e Marina Helena focam no eleitorado feminino
Tabata Amaral é a candidata que, proporcionalmente, mais investiu em impulsionamento de conteúdo direcionado especificamente ao eleitorado feminino. De acordo com dados da Meta, 36% do valor gasto pela socialista em impulsionamento foi destinado a mulheres usuárias de redes sociais em São Paulo. Ao todo, a candidata direcionou 21 publicações para o eleitorado feminino.
Pesquisas internas da campanha do PSB indicam que Tabata tem ganhado espaço entre o público feminino, impulsionada por suas peças publicitárias. Pesquisas qualitativas às quais a campanha teve acesso revelam que o tom combativo adotado por Tabata nas redes sociais gera simpatia, especialmente entre mulheres conservadoras, que rejeitam o que consideram um “discurso vitimista”, frequentemente associado à esquerda.
A candidatura de Tabata tem apostado em vídeos bem produzidos que narram sua trajetória de superação, de garota de um bairro periférico a estudante da Universidade de Harvard (EUA), como principal estratégia de impulsionamento. Além disso, ela tem utilizado a ferramenta para promover uma websérie sobre sua vida e suas propostas para a cidade de São Paulo.
Boulos também tem investido em conteúdo voltado para o eleitorado feminino, com 11% de seus gastos direcionados a esse público (26 anúncios no total). A campanha do PSOL produziu um vídeo com a participação da mãe e da avó do candidato, além de um depoimento gravado por sua esposa, a advogada Natalia Szermeta, destacando as qualidades de Boulos e seu bom relacionamento com as mulheres. O vídeo foi impulsionado nas redes sociais do candidato, com foco no público feminino. Interlocutores de Boulos afirmam que ele tem crescido especialmente entre mulheres de baixa renda.
A candidata Marina Helena direcionou 22 anúncios ao público feminino, representando 5,4% de seus gastos. Assim como Tabata Amaral, a candidata do Novo tem investido em vídeos que destacam sua trajetória como mulher que construiu sua carreira na iniciativa privada.