Os Jogos de Paris-2024 terminam neste domingo (11), coroando o sucesso do esporte feminino brasileiro e, principalmente, da ginasta Rebeca Andrade, que se tornou a maior medalhista do país na história do evento. Por outro lado, o que se viu na capital francesa foi conforme a Carol Knoploch, Tatiana Furtado e Alexandre Massi, do jornal O Globo, uma piora de praticamente todos os números do Brasil em relação a Tóquio-2020, justamente no ciclo olímpico com maior investimento até hoje.
No quadro de medalhas, o Brasil encerra sua participação em 19º lugar (até ontem), com 3 ouros, 7 pratas e 10 bronzes, abaixo do 12º lugar alcançado no Japão, quando obteve seu melhor resultado: 7 ouros, 6 pratas e 8 bronzes. A simples comparação do total de medalhas pode até não representar um número significativo (21 a 20), mas alguns dados por trás disso indicam um cenário preocupante para Los Angeles-2028.
O principal é a falta de renovação. Em Paris-2024, muitos rostos conhecidos repetiram o pódio olímpico: o canoísta Isaquias Queiroz, o corredor Alison dos Santos, a skatista Rayssa Leal e a pugilista Beatriz Ferreira, além de Rebeca. Porém, três anos mais velhos, alguns já anunciaram sua despedida, caso de Bia, que migra para o boxe profissional, ou a redução no programa: Isaquias vai se dedicar exclusivamente ao individual, e Rebeca não compete mais no solo nem no individual geral.
Fim de dupla na vela
Até mesmo quem não foi ao pódio em 2024 mas tem um currículo vitorioso, como as bicampeãs olímpicas Martine Grael e Kahena Kunze (vela), deve repensar o futuro e seguir caminhos diferentes.
Apenas três estreantes em Olimpíadas foram medalhistas em provas individuais ou em dupla: Beatriz Souza, ouro no judô; Willian Lima, prata no judô; e Augusto Akio, bronze no skate. Em Tóquio-2020, dois ouros, quatro pratas e cinco bronzes vieram de competidores de primeira viagem, sozinhos ou em duplas.
Houve também uma redução no total de modalidades no pódio: 11, menos do que na Rio-2016 (12) e em Tóquio-2020 (13). Isso pode ser explicado pela ausência de novos esportes que conseguiram medalhas, o que não ocorria desde Atenas-2004. No Japão, o Brasil conquistou pódios pela primeira vez em sua história no tênis, no surfe e no skate. Além disso, esportes consagrados tiveram resultados decepcionantes na França: a vela não trouxe medalhas pela primeira vez desde Barcelona-1992; a natação também passou em branco e alcançou apenas quatro finais; e o boxe, que vinha de três medalhas no Japão, ganhou apenas um bronze.
Os jogos delas
Porém, tudo tem um lado bom: para o Brasil, foi a performance feminina em Paris. Na edição mais equitativa da história, mas que não chegou efetivamente à igualdade esperada, fica claro o caminho a seguir para subir no quadro geral de medalhas: somente mulheres brasileiras foram campeãs olímpicas em Paris-2024.
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Ainda que o Time Brasil não tenha atingido a meta de medalhas estipulada, que era superar as 21 de Tóquio-2020, as mulheres garantiram o melhor resultado da história: 3 ouros, 4 pratas e 5 bronzes, 60% das conquistas brasileiras.
Dentre as 20 medalhas obtidas, brilhou a ginástica artística feminina, com quatro, inclusive um ouro no solo, com Rebeca Andrade superando Simone Biles e sendo reverenciada mundo afora. Ela foi o grande nome do Brasil e se tornou a maior medalhista do país em Jogos Olímpicos, com 2 ouros, 3 pratas e 1 bronze.
Homens perdem no vôlei
Já judô e vôlei, modalidades tradicionais, ficaram vivas graças às mulheres. Beatriz Souza foi campeã entre os pesados e Larissa Pimenta, bronze no meio-leve, além de Rafaela Silva decidir a disputa por equipes mistas contra a Itália. No caso do vôlei, preocupam os times masculinos, que saíram de mãos abanando, e cuja renovação não se mostra tão efetiva como no feminino, de onde vieram o ouro de Duda/Ana Patrícia e o bronze da equipe de quadra.
Em entrevista ao Globo às vésperas dos Jogos, a gestora Júlia Silva, da área da Mulher no Esporte do Comitê Olímpico do Brasil (COB), comemorava o fato de muitas confederações terem incluído projetos para o feminino em seu planejamento anual, sem contar com verba extra da entidade:
— Vimos um movimento diferente. Entenderam que é importante investir no feminino e que o resultado vem.
Já Taciana Pinto, gerente de Desenvolvimento Esportivo do COB, conta que a área de Mulher no Esporte recebeu em 2024 para o Programa de Desenvolvimento do Esporte Feminino um total de 79 projetos. Ainda que nem todos estejam diretamente relacionados ao alto rendimento, os resultados já começam a aparecer.
— Isso faz parte da corrida olímpica. Os países que perceberem este potencial e se movimentarem vão chegar antes. Não podemos ficar para trás. É uma mudança de cultura no planejamento das confederações — avalia Taciana.
Exemplo americano
Nos Estados Unidos, a importância do investimento no esporte feminino é reconhecida há meio século, desde que uma lei, nos anos 1970, passou a oferecer oportunidades iguais para atletas nas escolas e universidades. Em Tóquio-2020, as americanas conquistaram 66 das 113 medalhas do país nos Jogos (58,4%).
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A tendência no Brasil vem se confirmando há menos tempo, mas os sinais são de evolução: foram cinco medalhas na Rio-2016, nove em Tóquio-2020 e 12 em Paris-2024. O mesmo ocorreu nos Jogos Pan-Americanos de Santiago-2023. Das 205 medalhas conquistadas, sendo 66 de ouro, 73 de prata e 66 de bronze, a maioria veio das mulheres: 33 de ouro (29 masculinas e 4 mistas).
Em Paris-2024, mesmo em modalidades sem medalhas, o esporte feminino brasileiro deixou boas impressões: Ana Sátila obteve o melhor resultado da canoagem slalom em Jogos Olímpicos (quarto lugar), assim como Giullia Penalber no wrestling (quinto); Juliana Vieira conquistou a primeira vitória de uma brasileira no badminton; e as mulheres alcançaram três das quatro finais da natação. Além do crescimento nos resultados, as atletas mulheres representaram 55% da delegação brasileira, 153 de 274.