O Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 153 mil internações de bebês menores de 1 ano por problemas respiratórios – como pneumonia, bronquite e bronquiolite – em 2023, o equivalente a 419 hospitalizações por dia. Trata-se do maior número registrado nos últimos 15 anos, e supera em 24% a quantidade contabilizada em 2022.
Os dados integram um levantamento do Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância), iniciativa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Unifase (Faculdade de Medicina de Petrópolis).
Segundo o estudo, o histórico brasileiro revela uma queda nas internações de bebês por doenças respiratórias até 2016. A partir desse ano, no entanto, os dados passaram a variar de acordo com a região.
Em 2020, com a pandemia de covid-19, os números caíram novamente e de maneira substancial, cerca de 340%, mas o cenário mudou em 2021. Desde então, os aumentos de internações foram constantes.
Para a infectologista Rosana Richtmann, há diversos fatores que contribuem para essa alta nos números, entre eles a própria pandemia. Isso porque, como muitos bebês que nasceram durante o período de isolamento social não tiveram contato com os vírus que circulam pelo ar, há um acúmulo de crianças que vão ter a primeira infecção agora.
“Toda vez que há uma pandemia, esperamos um acúmulo do número de casos de bebês com problemas respiratórios nos anos seguintes. Aquelas crianças da geração de 2020 e 2021 não criaram anticorpos para vírus extremamente comuns, como o vírus sincicial respiratório (VSR), influenza e o próprio SARS-CoV-2. Então chega em 2022 e, principalmente, em 2023 e há um acúmulo da coorte das crianças que estão nascendo e aquelas que também estão fazendo seu primeiro contato com o vírus”, explica.
Como consequência, há o aumento tanto do número de casos mais leves quanto daqueles que precisam de internação, uma vez que a primeira infecção costuma ser mais grave.
A infectologista também afirma que o acesso ao diagnóstico de algumas doenças aumentou, o que pode contribuir para a crescente nos registros de infecções. Há, por exemplo, testes moleculares que identificam vírus que ficaram mais populares.
“Chamávamos o vírus sincicial respiratório de virose ou pneumonia sem agente. Começamos a dar nome e sobrenome para os vírus, o que é muito importante”, diz.
Além disso, a especialista destaca as condições climáticas favoráveis para o aumento de infecções respiratórias. As queimadas e outras formas de poluição do ar irritam as vias aéreas das crianças e facilitam as infecções por vírus e bactérias.
O frio também está relacionado à sobrevida desses microrganismos, que sobrevivem e se replicam de maneira mais eficaz em temperaturas mais baixas.
Não à toa, o estudo do Observa Infância mostrou que as regiões Sul, onde as temperaturas são mais baixas, e Centro-Oeste, onde há alta incidência de queimadas, foram as que apresentaram as maiores taxas de internação no último ano.
Prevenção
Há ainda outro aspecto importante que contribui para o aumento de casos e de manifestações graves de doenças respiratórias em bebês: a queda da cobertura vacinal. A vacinação contra doenças como gripe, covid-19 e coqueluche é a principal maneira de prevenir muitos problemas respiratórios.
Rosana Richtmann destaca não apenas a imunização das crianças, como também das gestantes, seguindo o Plano Nacional de Imunização (PNI). “A mãe que quer um bebê saudável nos seus primeiros seis meses de vida deve receber vacinas exatamente com esse intuito”, alerta.
Nesse sentido, o coordenador do Observa Infância, Cristiano Boccolini, reforça em nota divulgada pela Fiocruz que a vacina contra o VSR já foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e é importante que ela seja incorporada ao calendário do SUS. O vírus é um dos principais causadores da bronquiolite, uma das doenças respiratórias que levaram à maior internação de bebês em 2023.
Além da vacinação, outros cuidados são necessários. Richtmann aponta que a amamentação é fundamental para o sistema imunológico das crianças, uma vez que a mãe passa anticorpos para seu filho através do leite materno. Também é importante manter os ambientes limpos, sem sujeiras que possam irritar as vias respiratórias do bebê. Isso vale para a fumaça do tabaco, seja do cigarro tradicional ou dos eletrônicos, lembra a infectologista.
A especialista ressalta, por fim, a necessidade de hidratar a criança e evitar que o bebê entre em contato com pessoas que não lavaram as mãos e estão gripadas, inclusive os próprios membros da família.
Richtmann espera que o recorde de internações apontado na pesquisa não seja ultrapassado neste ano, porém lembra que ainda é cedo para chegar a conclusões. “Mas, sem dúvida, estamos vendo bastante circulação de todos eles (vírus), então vamos aguardar.”