domingo 22 de dezembro de 2024
Ministro da Fazenda, Fernando Haddad
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sábado 1 de junho de 2024 às 17:49h

‘Exigentíssima’ e ‘inimaginável’ para Haddad, meta de inflação de 3% é adotada em países como Chile, México, China e Colômbia

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Uma meta de inflação de 3%, considerada “exigentíssima” e “inimaginável” para o Brasil pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é adotada em outros países emergentes como Chile, México, China e Colômbia.

  • No Peru, a meta é menor, de 2%, mas em nações como Índia, China e Turquia, a meta é mais alta do que 3% (veja a lista no fim dessa reportagem).
  • No próprio Brasil, a meta é de 3% para 2024 em diante, podendo oscilar entre 1,5% e 4,5% sem que seja formalmente descumprida.
  • A meta central de 3% (com intervalo de tolerância) foi fixada de forma “contínua” a partir de 2025, com voto do próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Para atingir as metas de inflação, o BC utiliza a taxa Selic. Metas mais baixas tendem a exigir juros em um patamar mais elevado – alvo de crítica do presidente Lula.

A declaração do ministro de que a meta de 3% seria “exigentíssima” e “inimaginável” para o Brasil foi dada no último dia 22 durante audiência pública na Câmara dos Deputados, e repercutiu no mercado financeiro – com aumento nas expectativas de inflação, pelos analistas de mercado, além de alta no dólar e nos juros futuros.

“As contas estão mais equilibradas, a inflação totalmente controlada, os núcleos estão rodando abaixo da meta, que é exigentíssima. Uma meta para um país com as condições do Brasil, de 3%, é um negócio inimaginável. Desde o regime de metas constituído, quantas vezes o Brasil teve 3% de inflação, quantos anos isso aconteceu? Nos 25 anos do regime de metas”, questionou o ministro Haddad na ocasião, no Congresso Nacional.

A meta central de inflação média, nos 25 anos do regime de metas, entre 1999 e 2023, foi de 4,5%.
A inflação média registrada nos 25 anos do regime de metas de inflação, segundo dados oficiais do IBGE, foi de 6,36%.

No Congresso, Haddad avaliou que, a partir de um ponto, quando a inflação está baixa, ela “começa a ficar insensível à taxa de juros”. E que, neste caso, é preciso pensar em “desvinculações” de recursos orçamentários – como, por exemplo, as verbas “carimbadas” para saúde e educação.

O Tesouro Nacional já defendeu o fim de recursos vinculados diretamente à saúde e educação, mas ainda não encaminhou proposta neste sentido ao Legislativo.
Segundo cálculo do próprio Tesouro, a saúde e a educação podem deixar de receber até R$ 504 bilhões em nove anos, entre 2025 e 2033, caso as regras atuais para o piso sejam alteradas.

O objetivo das desvinculações citadas pelo ministro seria manter o arcabouço fiscal (nova regra para as contas públicas) em vigor nos próximos anos. Isso evitaria, em tese, uma alta maior na dívida brasileira – um termômetro para investidores. Sem ajustes em regras, o espaço para gastos livres, dentro da nova regra fiscal, pode acabar nos próximos anos.

“Quem sabe a gente encontra uma regra melhor que essa para que seja respeitada por todo governo, um pacto, para que seja sustentável no longo prazo. Isso tem a ver com meta de inflação, por exemplo. Se queremos uma meta de 3%, ousada para a história do Brasil, temos de abrir um pouco o debate e ver questões institucionais: ver regra de vinculações sustentáveis ao longo do tempo. É disso que se trata, tratar com seriedade. Não é fla flu”, declarou o ministro.

Economistas avaliam, porém, que há outras opções à desvinculação de recursos em saúde e educação. Eles citam, por exemplo, uma reforma administrativa, uma nova reforma previdenciária, o fim do abono salarial e reforma em gastos sociais.

Inflação e o sistema de metas

 O Banco Central avalia, em seus documentos oficiais, que a inflação alta prejudica principalmente as famílias de baixa renda, uma vez que estas têm mais dificuldade de se proteger contra a perda do valor real da moeda. E que o controle da inflação, por sua vez, favorece o crescimento econômico sustentável e o planejamento das empresas e famílias.

O principal instrumento do BC para conter a alta da inflação é a taxa básica de juros da economia, a Selic, fixada a cada 45 dias nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) — formado pelos diretores e pelo presidente da autarquia.

Para definir o nível da taxa Selic, o Banco Central trabalha com o sistema de metas de inflação. Se as estimativas para o comportamento dos preços estão em linha com as metas pré-definidas, é possível reduzir a taxa. Se as previsões de inflação começam a subir, a opção é manter ou subir os juros.

Apesar do anúncio, feito em junho do ano passado, de que a meta será contínua em 3% a partir de 2025, o governo ainda não publicou decreto formalizando esse objetivo.

Dúvidas no mercado

A declaração do ministro Haddad na semana passada no Congresso Nacional, de que uma meta de 3% para o Brasil seria “exigentíssima” e “inimaginável”, gerou dúvidas no mercado se ela será adotada de fato pelo Executivo.

A declaração de Haddad sobre a meta de inflação brasileira foi precedida de eventos que também adicionaram tensão nos mercados, e que estão pressionando para cima as projeções de inflação. São eles:

  1. Em meados de abril, o governo federal propôs reduzir as metas de superávit primário para as contas públicas dos próximos anos. Se confirmadas pelo Legislativo, as novas metas possibilitarão um aumento de despesas de cerca de R$ 160 bilhões em 2025 e 2026. Mais gastos, por sua vez, tendem a pressionar a inflação.
  2. As enchentes no Rio Grande do Sul também estão pressionando a inflação, pois alguns itens de alimentação com origem no estado, como arroz por exemplo, tendem a ter aumento de preços. O próprio Ministério da Fazenda já elevou sua estimativa de inflação por conta disso, assim como os agentes do mercado estão fazendo.
  3. Houve um “racha” na diretoria do BC na última reunião do Copom, quando aconteceu uma diminuição no ritmo de corte dos juros – fixando a Selic em 10,50% ao ano. Quatro diretores indicados pelo presidente Lula votaram por um corte maior nos juros, de 0,5 ponto percentual, para 10,25% ao ano, mas foram voto vencido. O temor do mercado é que a diretoria do BC indicada pelo presidente Lula – com maioria no Copom a partir de 2026 –, possa ser mais leniente com a inflação, em busca de um ritmo maior de crescimento da economia.
Última reunião do Copom para decidir taxa Selic teve diretoria dividida. — Foto: Raphael Ribeiro/BCB

Última reunião do Copom para decidir taxa Selic teve diretoria dividida. — Foto: Raphael Ribeiro/BCB

O que dizem analistas

O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, avalia que é absolutamente possível ter uma meta de inflação de 3% no Brasil, mas que, para isso, é preciso fazer o trabalho requerido – que é ajustar as contas públicas.

“Com uma inflação baixa e estável de foma em geral, precisa ter contas públicas em ordem. Isso a gente não tem não tem perspectiva de ter. O problema não é a meta, mas não ter as contas ajustadas (…) Controlar gasto é praticamente uma anátema, um pecado para o atual governo”, afirmou Alexandre Schwartsman.

Para ele, uma tentativa de se trocar um pouco mais de crescimento por mais inflação não é possível no médio e longo prazos. “Consegue fazer por intervalos curto, mas ao longo do tempo, a capacidade de crescimento não depende da meta de inflação. Depende de quanto investe, depende da produtividade”, concluiu.

Para José Luis Oreiro, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), a meta de inflação brasileira poderia ser um pouco mais alta, de 4%, com um intervalo de tolerância menor, de um ponto percentual. Com isso, a inflação poderia oscilar entre 2% e 5% sem que a meta fosse descumprida.

“Com um horizonte de já 25 anos do sistema de metas, com inflação média de 6%, o que que leva as pessoas a acharem que esse ano a gente vai conseguir uma inflação de 3% [meta fixada]. Ou por forte valorização da taxa de câmbio ou aumento colossal da taxa de desemprego. Ano passado ficou no limite, 4,4%. Para você reduzir a inflação de 4,4% para 3%, precisa ou uma valorização muito forte do câmbio, ou de produzir uma recessão forte na economia brasileira, que me parece que é o que o BC vem querendo fazer”, declarou José Luis Oreiro.

Metas de inflação em países emergentes

Veja as metas de inflação vigentes para o ano de 2024:

  • Peru: 2%, podendo oscilar entre 1% e 3% sem que seja descumprida
  • Indonésia: 1,5% a 3,5%
  • Brasil: 3%, podendo oscilar entre 1,5% e 4,5% sem que seja descumprida
  • México: 3%, podendo oscilar entre 2% e 4% sem que seja descumprida
  • Chile: 3%
  • China: 3%
  • Colômbia: 3%
  • África do Sul: 3% a 6%
  • Uruguai: 3% a 6%
  • Índia: 4%
  • Rússia: 4%
  • Turquia: 5%
  • Egito: 7%, podendo oscilar entre 5% e 9% sem que seja descumprida

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