Desde o primeiro momento, Jair Bolsonaro (PL) disse que seu maior objetivo com a manifestação do último domingo (25) era produzir uma “fotografia para o mundo”.
Como Bolsonaro não costuma ser bom em esconder seus reais propósitos, é razoável apostar conforme artigo de Malu Gaspar, do O Globo, que ele não esperava comover ninguém que já não o apoie com seus pedidos de pacificação e anistia — muito menos o Supremo Tribunal Federal (STF). Tampouco achava que convenceria alguém de que não planejou um golpe de Estado. O que ele queria era a imagem mesmo, e para passar mensagens bastante claras.
A primeira, para o STF. A foto da Avenida Paulista mostra que prender Bolsonaro não será uma operação fácil, agora ou mais adiante. Quem se lembra do comício de Lula em São Bernardo do Campo em abril de 2018, horas antes de ser levado para Curitiba pela Polícia Federal, sabe por quê.
A Suprema Corte está até hoje expiando o trauma de ter prendido um ex-presidente popular, e mesmo o intrépido Alexandre de Moraes vai pensar algumas vezes antes de confrontar os bolsonaristas.
Outro recado foi aos aliados, especialmente aos governadores que se aboletaram no carro de som.
Depois da operação da PF sobre os militares envolvidos no plano de golpe de Estado, sobre o próprio Jair Bolsonaro e sobre o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, os líderes partidários detectaram um movimento de pré-candidatos a prefeito e vereador que até então planejavam ir para o PL considerando ingressar noutras legendas para se prevenir contra complicações jurídicas.
A multidão se comportando em estrita obediência aos comandos de não levar faixas, cartazes ou palavras de ordem contra o STF funcionou como aval para Bolsonaro dizer aos seus que eles não têm muita opção e estão amarrados a ele pelo menos até a eleição municipal.
Um terceiro destinatário da mensagem de domingo foi o próprio Lula, que passou recibo em entrevista à Rede TV/UOL “A manifestação foi grande, quem não quiser é só ver a imagem”, disse, mesmo classificando o evento como “meio alucinante” e “a favor do golpe”.
A maior lição para Lula, porém, não está na foto, mas fora dela, e pôde ser aferida numa pesquisa de opinião divulgada na quarta-feira pela Genial/Quaest. O levantamento, que mediu a impressão da população a respeito do ato e da situação jurídica de Bolsonaro, mostra que o quadro de polarização de 2022 permanece forte e vivo.
Eleitores de Lula e de Bolsonaro respondem de forma diametralmente oposta se acham que o ex-presidente é perseguido, se planejou um golpe de Estado, se deveria ter sido declarado inelegível ou se seria injusto prendê-lo. Lulistas estão certos de que ele deveria estar atrás das grades, bolsonaristas dizem que é completamente inocente.
A pesquisa mostrou também que um amplo contingente dos que votaram em branco ou anularam em 2022 acredita que Bolsonaro planejou um golpe (47%), que seria justo prendê-lo (58%), que foi certo torná-lo inelegível (52%) e que não há perseguição política nas investigações (56%).
Os dados reafirmam a Lula que, apesar do apoio significativo e inabalável de um setor do eleitorado a Bolsonaro, continua havendo espaço para convergência com quem não está nem em uma bolha nem em outra.
Num ambiente de polarização tão extrema, nichos pequenos definem eleições. Mas o presidente, que já reconheceu na última conferência eleitoral do PT, em dezembro, a necessidade de “falar o que o povo espera de nós”, parece ter esquecido o próprio chamado.
É verdade que seu governo já anunciou apoio à imunidade tributária a igrejas e templos religiosos e divulgou que pretende instituir a contribuição previdenciária e a remuneração por hora para motoristas de aplicativo.
Mas foi boicotado na jornada ao centro pelo próprio Lula, que se vangloriou de ter colocado um “comunista” no STF, comparou as ações do governo Benjamin Netanyahu em Gaza ao Holocausto e vem fingindo não ver a caçada que a ditadura de Nicolás Maduro promove contra opositores na Venezuela.
Numa conversa recente, um lulista histórico, fiel e com muito voto mostrou-se angustiado com a demonstração de força de Bolsonaro na Paulista:
“Lula pode até estapear a esquerda se quiser, que na próxima eleição ela vota nele do mesmo jeito. Já o centro e a centro-direita, não. É com esses que ele precisa estar preocupado o tempo todo se quiser impedir a volta da extrema direita em 2026”
Esse mesmo aliado, ecoando um diagnóstico bastante repetido em Brasília, diz que falta no Planalto quem alerte o presidente todos os dias sobre as cascas de banana que precisa evitar. A massa verde e amarela na Paulista deveria cumprir esse papel.