Sem critérios claros para a escolha do novo procurador-geral da República, começa oficialmente na próxima segunda-feira a disputa pelo cargo, que promete ser uma das mais concorridas da história. Pelo menos seis grupos de candidatos estão na corrida que, neste ano, deve ir além da tradicional lista tríplice, que reúne os nomes mais votados pelos próprios membros do Ministério Público Federal (MPF). As inscrições para a eleição, realizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), começam na semana que vem.
A disputa pode ser mapeada em seis frentes: pelo menos sete nomes de concorrentes à lista tríplice; o destino da atual procuradora Raquel Dodge, que ainda não disse se tentará a recondução ao cargo; a existência de pelo menos um procurador que disputará fora da lista; a entrada em cena do chefe do Ministério Público Militar (MPM); procuradores alinhados ao bolsonarismo; e o movimento da Lava-Jato em Curitiba.
Os nomes dados como certos na inscrição à lista tríplice são o subprocurador-geral Mario Bonsaglia, que já figurou em outras listas e tem apoio da categoria em São Paulo; o procurador regional Blal Dalloul, que atuou na gestão do ex-PGR Rodrigo Janot; o procurador regional Vladimir Aras, que foi secretário de Cooperação Internacional da gestão de Janot; e o procurador regional Lauro Cardoso Neto, que já passou pela carreira militar.
A subprocuradora-geral Luiza Frischeisen já avisou aos colegas que vai concorrer. Ela é coordenadora da Câmara Criminal da PGR. Também são esperadas as inscrições do subprocurador-geral Nívio de Freitas, que coordena a Câmara de Meio Ambiente, e do presidente da ANPR, José Robalinho.
Futuro de Dodge
Raquel Dodge ainda não deu qualquer sinalização interna sobre se tentará ou não ser reconduzida. Externamente, aponta na direção do interesse pelo cargo por mais dois anos, ao participar de diferentes eventos do Executivo. O presidente Jair Bolsonaro, porém, se ressente por ter sido denunciado por Dodge por racismo, antes da disputa eleitoral. Na mesma ocasião, ela denunciou o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, por ameaça a uma jornalista.
A disputa inclui ainda o subprocurador-geral Augusto Aras, que se lançou por fora da lista. O chefe do MPM, Jaime de Cassio Miranda, também quer ser procurador-geral, apesar do entendimento entre procuradores da República de que um integrante do Ministério Público Militar não pode chefiar o MPF.
Procuradores que defendem a lista tríplice se mostram preocupados com colegas alinhados ao bolsonarismo e que poderiam entrar no radar do presidente. São os casos de Guilherme Schelb, defensor do Escola Sem Partido e que chegou a ser cotado por Bolsonaro para ministro da Educação, e Ailton Benedito, que manifesta alinhamento ao bolsonarismo nas redes sociais. Benedito, inclusive, troca mensagens com parlamentares e assessores do PSL. Os dois vêm se mantendo calados nas redes internas do MPF.
Crise interna
Apesar de, internamente, ter repetido que não vai se lançar à disputa pela cadeira de PGR, o coordenador da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, também é citado na bolsa de apostas. Ele é muito próximo do ministro Sergio Moro, ex-juiz federal em Curitiba.
A indefinição de Bolsonaro vem alimentando a disputa, com um grande número de candidatos. Em uma carta em que aponta uma “crise interna sem precedentes” e um “momento presente carregado de circunstâncias adversas”, o subprocurador-geral da República Nicolao Dino comunicou aos colegas anteontem sua desistência na corrida pelo cargo. Nas palavras do subprocurador-geral, as “fricções internas” têm “alto poder corrosivo”.
Dino apontou a existência de uma lacuna legal sobre a lista tríplice, mas defendeu o instrumento usado pela categoria para influenciar a escolha do procurador-geral. “A lista tríplice tem forte simbologia política, principalmente numa instituição que, entre outras funções, atua como promotora do regime democrático”, afirmou.
Quem tem a palavra final na escolha do PGR é o presidente Jair Bolsonaro, que ainda não deixou claro se pretende respeitar a tradição da lista tríplice e nunca se comprometeu a escolher um dos três nomes mais votados pela categoria.
A Constituição Federal determina que cabe ao presidente da República nomear o procurador-geral. Ele pode escolher qualquer integrante da carreira, com mais de 35 anos de idade, que passe pelo crivo da maioria absoluta no Senado.
O mandato de dois anos da atual procuradora-geral, Raquel Dodge, termina em setembro.
A lista é uma tradição, sem previsão legal. As inscrições de candidatos ocorrerão entre 6 e 15 de maio. Em 18 de junho, cerca de 1,2 mil procuradores votarão para escolha dos três nomes a serem encaminhados ao presidente. A briga pela cadeira de PGR, porém, está longe de se restringir a esse rol.
Seis grupos em disputa pela PGR
Lista tríplice: Sete nomes devem concorrer. São aguardadas as inscrições dos procuradores Mario Bonsaglia, Blal Dalloul, Vladimir Aras, Lauro Cardoso Neto, Luiza Frischeisen, Nívio de Freitas e José Robalinho.
Raquel Dodge: A atual procuradora-geral ainda não sinalizou, mas a expectativa no MP é que ela vai tentar a recondução.
Fora da lista: O subprocurador-geral Augusto Aras lançou sua candidatura de forma avulsa e não vai disputar uma vaga na lista tríplice da ANPR.
MPM: O chefe do Ministério Público Militar, Jaime de Cassio Miranda, também quer ser PGR, contrariando a tradição de nomear um membro do MPF.
Bolsonaristas: Dois cotados demonstram alinhamento com o presidente Jair Bolsonaro. Guilherme Schelb, defensor do Escola Sem Partido, e Ailton Benedito, próximo de políticos do PSL.
Lava-Jato: O coordenador da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, pode ser lembrado por Bolsonaro. Ele nega interesse.