Casos apresentados, de escolas do litoral de SC, da zona rural de MG e do semi-árido da BA, mostraram retrato diverso do país
Dois professores de filosofia do ensino médio, ela em uma pequena cidade do litoral norte catarinense, ele em uma escola rural do sul de MG, e um professor de matemática do fundamental II no sertão baiano. Aparentemente, os três teriam pouco ou nada em comum, mas um problema os uniu – a necessidade de dotar seus alunos de conhecimentos sobre o uso seguro e consciente da internet.
As respostas para o problema começaram a aparecer quando os três conheceram a Disciplina de Cidadania Digital da Safernet, criada pela Safernet em parceria com o governo do Reino Unido a partir do Programa de Acesso Digital, uma iniciativa britânica implementada em vários países do mundo. Até o momento, a disciplina alcançou 11.018 estudantes, de 157 escolas, em 117 cidades de 13 estados pelo país.
Em 26 estados, 1.172 professores estão fazendo o curso Segurança e Cidadania Digital em Sala de Aula e os que concluírem a formação estão preparados para ministrar a disciplina ano que vem, utilizando um caderno de aulas criado pelo projeto para que as escolas possam efetivar a competência geral 5 da Base Nacional Comum Curricular.
A competência prevê que, no ensino fundamental e no ensino médio, as escolas tenham aulas que discutam o uso crítico, significativo, reflexivo e ético das tecnologias digitais, formando cidadãs e cidadãos que também estejam preparados para os desafios que existem atualmente nas redes. Dados da Pesquisa TIC Educação 2022 (Cetic.br/NIC.br) apontam, no entanto, que tem diminuído o número de professores com acesso à formação continuada para fazer dessa competência uma realidade das escolas.
E os êxitos frente aos desafios foram tantos que a professora Nilva Maria Sbruci de Souza, de Itapoá (SC) e os professores Cleber Marinho da Cruz, de Brazópolis (MG) e Dyogenys Alves Andrade, de Sobradinho (BA), foram convidados pela Safernet para compartilhar suas experiências no Seminário “Educação que Transforma: políticas públicas e formação para a cidadania digital”, realizado na Embaixada do Reino Unido em Brasília, no último dia 29 de novembro.
Desafios e êxitos
O primeiro desafio que Nilva e Dyogenys tiveram foi de infraestrutura. Na Escola Estadual Nereu Ramos, em que ela trabalha, a única do município, não há laboratório de informática. Já na Escola de Gestão Compartilhada Maria José de Lima Silveira, em Sobradinho, há uma sala para este fim, mas os computadores só serão instalados ano que vem.
“Foi um desafio enorme; Não temos laboratório de informática, mas temos o novo ensino médio. Contudo, o caderno da Safernet apresenta alternativas para adaptar as atividades, aí eu fui adaptando e contando com a ajuda dos alunos e seus smartphones, que hoje são microcomputadores. Eles foram gostando, pois são temas atuais, temas da realidade deles”, contou Nilva, que dá aula de Cultura Digital para 4 turmas do 2º ano do Ensino Médio, com 106 alunos ao todo.
Outro desafio, conta Nilva, foi o questionamento inicial dos alunos se aquele conhecimento seria útil para o Enem ou para os vestibulares, foco principal dos estudantes do ensino médio, o que foi superado pelos temas das aulas: situações vividas no dia a dia dos estudantes na Internet, como o impacto das relações online no bem-estar e saúde emocional, além dos desafios para o respeito e empatia nas redes, por exemplo.
Para Dyogenys, professor de matemática, foi desafiador apresentar para 119 alunos do 8º e 9º anos do fundamental os temas da disciplina, mas ele também afirma que o caderno e os cursos da Safernet “fizeram com que esse trabalho desafiador parecesse mais fácil”.
Segundo o professor, que mora em Petrolina (PE) e viaja mais de 50 km para dar aula, também foi desafiador explicar o conceito de empatia nas redes, que era algo que os alunos não conheciam até então e que foi trabalhado em um projeto especial.
Um dos sucessos do uso do material da Safernet foi a sua flexibilidade. No evento em Brasília, ele contou que abriu o curso com o tema ciberbullying e bullying, pois havia uma forte demanda na escola.
Já Cleber é professor da Escola Estadual Dino Ambrósio Pereira, no distrito de Bom Sucesso da Mantiqueira, na zona rural de Brazópolis, sul de Minas Gerais. O primeiro desafio que ele teve foi o de “encaixar” as aulas de Cidadania Digital nas quatro disciplinas que ele leciona para seus 48 alunos, distribuídos em duas turmas, uma do primeiro ano do médio e outra do segundo ano: filosofia, ciências humanas e sociais aplicadas, projeto de vida e tecnologia e inovação.
“A gente integrou as disciplinas para trabalhar esse tema e discutir ciberbullying, fake news, o posicionamento cidadão do aluno na internet”, contou Cléber.
Uma das metodologias empregadas pelo professor, prevista no caderno de aulas da Safernet, foi o da sala de aula invertida, na qual o tema é proposto pelo professor, um grupo de alunos pesquisa o tema da aula e dá a aula para os demais colegas, com aportes feitos por Cleber em sala. “Isso faz com que o aluno seja protagonista no seu processo de aprendizado”.
Prêmio Cidadania Digital em Ação 2023
Boas práticas em sala de aula, como as apresentadas por Cléber, Dyogenys e Nilva, poderão ser premiadas. A Safernet lançou mês passado o Prêmio Cidadania Digital em Ação, cujas inscrições foram prorrogadas até 7 de janeiro.
Educadores das 157 escolas que aplicaram a Disciplina de Cidadania Digital da Safernet podem inscrever as ações criadas por seus alunos a partir dos recursos sugeridos no módulo 5 do caderno de aulas, que propõe que os próprios estudantes criem intervenções socioculturais para mobilizar suas escolas, famílias e comunidades nos tópicos de privacidade, bem-estar digital, combate a violências e educação midiática. Ações como eventos, gincanas, criação de conteúdos digitais e impressos, e intervenções artísticas, são algumas das possibilidades.
Serão 3 equipes premiadas, e os estudantes receberão medalhas, certificados, um troféu para a escola e prêmios (leitor de livros digitais, pulseira inteligente ou fone de ouvido bluetooth). Além disso, cada equipe poderá enviar 2 representantes, um educador e um estudante, para participar, com todos os custos pagos, da, cerimônia de premiação em São Paulo, no dia 6 de fevereiro de 2024, durante o Dia da Internet Segura — iniciativa global que, no Brasil, é coordenada pela ONG Safernet Brasil desde 2009.
Sobre a Safernet
A Safernet existe desde 2005 e tornou-se a ONG brasileira de referência na promoção dos direitos humanos na internet. Com uma abordagem multissetorial, atua no combate a crimes cibernéticos contra os Direitos Humanos, no acolhimento de vítimas de violência online e em programas de educação, prevenção e conscientização. A Safernet mantém a Central Nacional de Denúncias, conveniada ao Ministério Público Federal e o Canal de Ajuda, o Helpline, para vítimas de violência e outros problemas online. A Safernet promove o uso seguro da internet com projetos educacionais como a Disciplina de Cidadania Digital.