Na tentativa de reforçar a aliança com o Centrão, o governo agora tenta atrair o PL, sigla de Jair Bolsonaro, com cargos na cúpula da Caixa Econômica Federal. Estão sendo negociadas com o principal partido da oposição duas vagas: a vice-presidência de Negócios de Varejo, como revelado pelo colunista Lauro Jardim, do O Globo, e o comando da Caixa Asset, corretora de valores. A aproximação tem sido intermediada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), segundo integrantes do banco e do Palácio do Planalto. O movimento, que já gerou reações e ameaças de expulsão entre correligionários de Bolsonaro, deverá reservar postos também para Republicanos, PSD e União Brasil, que já ocupam ministérios na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.
A troca na presidência da Caixa, há pouco mais de um mês, compõe uma guinada no governo para abrir espaços ao Centrão em postos relevantes. A entrada de André Fufuca (PP) no Ministério do Esporte e de Silvio Costa Filho (Republicanos) na pasta de Portos e Aeroportos foi uma tentativa de pacificar a base no Congresso, assim como a saída de Rita Serrano do comando do banco. O novo presidente, Carlos Vieira, teve o aval de Lira e de outros caciques do grupo político. O eventual sucesso da negociação com o PL consolidará a adesão do último partido de sustentação da gestão Bolsonaro que ainda não havia entrado no governo Lula.
O passo mais ousado dessa ofensiva é a tentativa de agregar à gestão nomes que agradam ao PL. Uma lista com as indicações do Centrão já teria chegado às mãos de Vieira. As nomeações de cinco vice-presidências estariam próximas, já com os processos seletivos em andamento, etapa necessária para a formalização: Negócios de Varejo; Negócios de Atacado; Rede de Varejo; Logística, Operações e Segurança; e Agente Operador. Segundo o informe sobre a seleção, a remuneração anual dos vice-presidentes é de R$ 711,9 mil, somando 13º salário, remuneração variável anual e benefícios. A previsão é que os escolhidos sejam divulgados em janeiro.
Meio trilhão sob gestão
Além da cúpula, a troca de comando da Caixa abre espaço para mudanças em cerca de cem cargos, incluindo diretorias e superintendências em todo o país.
A área de Negócios de Varejo é responsável por criar produtos e serviços para o varejo e implementar meios de pagamento, por exemplo — o nome preferido é guardado a sete chaves pelos participantes da negociação. A tendência é que o PL fique também com a Caixa Asset, responsável pelos fundos de investimento. Segundo o relatório mais recente, há R$ 522,5 bilhões de ativos sob gestão.
O mais cotado para esta vaga é Pablo Costa Sarmento, funcionário de carreira do banco que teve cargos na Caixa Seguridade, subsidiária do banco público, quando o presidente era Pedro Guimarães, ainda no governo de Jair Bolsonaro. Anos antes, nas gestões de Dilma Rousseff e Michel Temer, foi gerente regional de Habitação da Caixa e depois gerente executivo de Habitação. Procurado, Sarmento não se manifestou. Questionado sobre as indicações vinculadas ao PL que teriam sido intermediadas por ele, Lira disse que o nome a que a reportagem se refere “deve ser de um funcionário de carreira”.
O estatuto do banco impõe amarras como conhecimento e experiência no setor financeiro. Pelas regras internas, é obrigatória a indicação de funcionários de carreira até os cargos de direção. Já a presidência e vice-presidências podem ser ocupadas por executivos de fora dos quadros. A filiação partidária é vedada, mas para os cargos de alta governança há necessidade de sustentação política.
A divisão de espaços na cúpula do banco deverá destinar ao Republicanos a vice-presidência de Tecnologia. Em outro lance, a pedido do PT, a atual vice-presidente de Habitação, Inês Magalhães será mantida no cargo. Ela tem o apoio também do ministro das Cidades, Jader Filho (MDB). Ao atual presidente da Caixa, Carlos Vieira, caberia uma cota de três vice-presidências: Rede de Varejo; Riscos; e Finanças e Controladoria. Além de PL e Republicanos, pessoas próximas à negociação dizem que também serão contemplados indicados ligados a PSD e União Brasil. Há possibilidade ainda de o PDT ser atendido.
A iniciativa do Planalto provocou turbulências no PL. Presidente do partido, Valdemar da Costa Neto afirmou que há uma ordem expressa para que filiados não indiquem cargos para a gestão Lula, sob pena de serem expulsos, caso o vínculo seja comprovado. Isso, de acordo com o presidente, é um assunto pacificado com o próprio Bolsonaro. Valdemar disse que não conhece o nome tido como favorito para a Caixa Asset e tampouco está a par das negociações para a entrada na vice-presidência de Negócios de Varejo.
— É uma ordem minha: filiado ao PL não aceita cargo no governo Lula e não indica. Se algum vínculo for comprovado, a pena será de expulsão e isto vale para todos. O próprio Bolsonaro concorda com esta política de intolerância a este tipo de composição — afirmou Valdemar ao GLOBO.
Esta é mais uma etapa de mal-estar no partido. No início do mês, a montagem das chapas para a eleição municipal do ano que vem já havia se transformado num embate interno entre os bolsonaristas e a ala mais pragmática, ligada a Valdemar. Nomes do entorno de Bolsonaro querem centralizar as escolhas, enquanto o grupo mais próximo ao dirigente prefere dar mais poder aos diretórios regionais. Já ocorreram atritos nas negociações para as definições em Fortaleza e João Pessoa, por exemplo.
Líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ) também nega as indicações e diz concordar com a expulsão de eventuais quadros que influam sobre negociações no governo.
— Isto não será tolerável. Desde o início do governo, recebemos a diretriz clara de ser oposição. Nós perdemos a eleição e não estamos aí para participar do governo Lula. Quem participar desta ou de qualquer outra articulação desta espécie será expulso — afirma.
Caixa: seleção segue leis
Em nota, a Caixa afirmou que “não comenta especulações sobre indicações de dirigentes”. O banco disse que as vagas de vice-presidente são preenchidas por meio de processo seletivo público e que o edital de seleção “segue os ritos de governança, conforme a Lei das Estatais, estatuto social e normas internas”. Por fim, a instituição financeira acrescentou que as escolhas passam pelo “Comitê de Elegibilidade e pelo Conselho de Administração do banco, que define o selecionado e é responsável pela nomeação”.