Em processo de encolhimento há quase uma década e aspirando se reorientar como oposição ao governo Lula (PT), o PSDB virou cenário de uma disputa velada entre seus dois principais caciques: o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, cotado como candidato à Presidência em 2026, e o deputado federal Aécio Neves, ex-governador de Minas e último presidenciável tucano de destaque, em 2014. As informações são de Bernardo Mello, do jornal, O GLOBO.
Ambos se aliaram para articular, sem sucesso, uma candidatura presidencial de Leite em 2022; hoje, porém, dirigentes do partido, parlamentares e interlocutores de ambos os lados enxergam “fissuras” e desconfianças de parte a parte.
Reabilitado nas hostes partidárias após ser absolvido em ações da Operação Lava-Jato, Aécio passou a ocupar espaços e a ser incentivado, por rivais de Leite, a se lançar ao Palácio do Planalto, o que ressabiou aliados do gaúcho. Na semana passada, em uma demonstração de força, o mineiro foi escolhido para presidir o Instituto Teotônio Vilela, fundação partidária cuja verba foi de R$ 13 milhões em 2022.
De acordo com cinco lideranças estaduais e nacionais do PSDB ouvidas pelo GLOBO, em caráter reservado, a costura que levou Aécio ao comando da fundação reforçou a sensação entre os tucanos de que o deputado reúne prestígio interno, foco em se projetar nacionalmente e capacidade de desafiar planos de Leite, que também é forte na sigla.
O desenho de cargos no PSDB começou na eleição do diretório nacional, há duas semanas, quando o ex-governador de Goiás Marconi Perillo foi escolhido para suceder Leite na presidência tucana. Às vésperas da convenção, o ex-senador José Aníbal (SP), uma das lideranças históricas do PSDB, se lançou como desafiante de Perillo, que tinha Aécio como seu principal fiador.
Aníbal buscou o apoio de desafetos de Aécio — como o ex-presidente do PSDB Bruno Araújo (PE), influente na bancada federal — e também de Leite, que sinalizou a hipótese de uma aliança, caso o paulista se mostrasse viável. Leite, inicialmente, desejava o ex-senador Tasso Jereissati (CE) como seu sucessor, mas o plano foi minado por Aécio.
Horas antes da votação, conforme o relato de cinco dirigentes tucanos, Aécio arregimentou apoios de lideranças de estados como Pará, Mato Grosso do Sul e Paraná, além de Minas, e esvaziou a candidatura de Aníbal.
Três desses interlocutores afirmaram à reportagem que houve ainda um segundo movimento: Aécio acenou com a possibilidade de apoiar Aníbal na convenção, o que pressionou Perillo a assegurar espaços previamente acordados. Embora aliado de Aécio, Perillo também tem boa relação com uma ala do diretório estadual de São Paulo, hoje encabeçada pelo ex-governador Rodrigo Garcia, que nutre rivalidade com o mineiro.
Ao fim das articulações, Aécio conseguiu lançar Perillo como candidato único, como pretendia, e garantir para seu grupo os principais cargos da Executiva nacional do partido.
Após a eleição da Executiva, Garcia chegou a se movimentar para presidir o Instituto Teotônio Vilela, e governadores tucanos, como Leite, estavam dispostos a apoiá-lo. Aécio, porém, sinalizou que não abriria mão, e foi escolhido em consenso pelos conselheiros da fundação, incluindo Leite.
A vitória de Aécio no diretório não chegou a ser uma derrota de Leite, que emplacou um nome de confiança, a prefeita de Pelotas, Paula Mascarenhas, como 1ª vice-presidente da sigla. Mas abriu caminho para que até ex-rivais, hoje descontentes com Leite, vislumbrem o mineiro como alternativa a voos mais altos.
— No que depender de mim, o PSDB em São Paulo não trabalha por candidatura presidencial do Eduardo. Prefiro Aécio, embora já tenha até pedido sua expulsão do partido. A Justiça o absolveu e não tenho compromisso com o erro. É uma liderança importante nacionalmente e com história no PSDB — declarou Fernando Alfredo, presidente do PSDB na capital paulista.
Em 2019, o PSDB paulistano apresentou um pedido para expulsar Aécio, por conta das investigações da Lava-Jato — no ano passado, ele obteve o arquivamento de processos. Hoje, porém, Alfredo trava uma guerra com aliados de Leite pelo comando local da sigla.
Reservadamente, outros dirigentes do PSDB associam o crescimento de Aécio a dificuldades de Leite em lidar com feudos tucanos, como no caso de São Paulo. Interlocutores do mineiro sugerem que o “receio” de Leite com o avanço de Aécio é, na verdade, “sintoma” desta dificuldade.
Procurados pela reportagem para responder sobre o horizonte de uma candidatura presidencial, Aécio disse que Leite é a “única aposta do PSDB para 2026”, e o governador gaúcho não respondeu.
Obstáculos de Aécio
Para integrantes da cúpula do PSDB, o partido necessita de uma candidatura competitiva à Presidência para reverter a tendência de queda em cargos no Executivo e no Legislativo, e Leite ainda é o nome com mais força, já que vem de uma reeleição inédita ao governo de seu estado.
Já Aécio, o tucano que mais chegou perto de derrotar o PT numa disputa presidencial desde Fernando Henrique, ainda está distante do apelo eleitoral que teve no passado, segundo aliados e adversários. Por ora, ele vislumbra disputar o governo de Minas, embora priorize a agenda de oposição ao governo Lula.
Perillo, o novo presidente do PSDB, defendeu uma chapa presidencial com Leite, mas deve se afastar em 2025 para preparar sua própria candidatura ao governo de Goiás. Até lá, lideranças tucanas dizem que Leite terá margem para se viabilizar dentro e fora do partido.
Aliada de Leite e presidente do partido no Rio Grande do Sul, Paula Mascarenhas avalia que o governador vem atuando para buscar consensos, e disse que Aécio se credenciou a assumir a fundação partidária, com apoio do PSDB gaúcho, por ser um “tucano de maiores raízes”.
— Estamos em um momento de fortalecimento do partido, acho que não é hora de disputa interna. Claro que ainda há arestas dentro do partido, mas todos concordamos com a necessidade de diálogo e de, talvez, ceder em algo — afirma Mascarenhas.