A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de enviar o chanceler Mauro Vieira para a posse de Javier Milei neste domingo (10) é um recado do governo brasileiro ao candidato de ultradireita, que chamou o petista de “corrupto” e o acusou de interferência no processo eleitoral argentino ao longo da campanha.
A leitura de diplomatas e auxiliares do presidente da República para as Relações Exteriores ouvidos pela equipe da coluna de Malu Gaspar, do O Globo, é que, ao enviar para o evento apenas o chanceler, sem incluir na comitiva o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), Lula impôs uma espécie de rebaixamento em relação à postura de Jair Bolsonaro (PL), que também teve de conviver com um “desafeto” governando o país vizinho – no caso, o peronista moderado Alberto Ángel Fernández, aliado de Lula.
Na ocasião, após idas e vindas, Bolsonaro decidiu escalar o então vice-presidente general Hamilton Mourão para a posse do esquerdista.
“Lula passa um sinal de insatisfação, mas sem fechar a porta para uma aproximação no futuro a depender dos próximos passos”, resume um diplomata a par das articulações nos bastidores.
Lula torcia pela vitória do peronista Sergio Massa, derrotado com apenas 44,3% dos votos válidos, ante 55,7% do adversário.
Em dezembro de 2019, quando Alberto Fernández ganhou a eleição, Bolsonaro, que torcia para Mauricio Macri e tinha se referido ao peronista como “bandido de esquerda”, inicialmente decidiu que não iria, e escalou então o ministro da Cidadania, Osmar Terra.
Depois, optou por não enviar ninguém, deixando o embaixador brasileiro na Argentina como representante do país. Ao final, sob pressão de empresários e diplomatas, recuou e decidiu enviar Mourão.
Procurado pela equipe da coluna, Mourão criticou a postura de Lula de não enviar nem Alckmin para a posse de Milei. Para ele, “não foi boa diplomacia”:
– Eu acho que, depois que o Milei mandou uma carta ao presidente Lula buscando distensionar, o presidente deveria, num gesto de grandeza diplomática, comparecer ele mesmo. Caso contrário, deveria ter mandado o vice-presidente Geraldo Alckmin – afirmou o ex-vice de Bolsonaro.
Bolsonaro, por sua vez, não apenas vai para a Argentina, como deve levar consigo uma “comitiva” com 46 aliados, entre 16 deputados estaduais, 22 federais e oito senadores. Dois filhos do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), vão acompanhá-lo.
O ex-presidente deve se encontrar com Milei na sexta-feira pela manhã, em Buenos Aires.
Conforme informou o blog, a possibilidade de Bolsonaro participar da posse de Milei já estava prevista nos informes internos do Itamaraty apresentados ao presidente Lula para um cenário de vitória do candidato da aliança A Liberdade Avança.
Em entrevista ao GLOBO, o embaixador do Brasil na Argentina, Júlio Bitelli, disse que o convite de Milei a Bolsonaro para a posse “não é um gesto que vá no bom sentido”.