O ex-ministro Gustavo Bebianno ainda demonstra mágoa com o presidente Jair Bolsonaro por sua demissão da Secretaria-Geral da Presidência. Bebianno deixou semana passada os processos judiciais em que defendia Bolsonaro na Justiça eleitoral e se prepara para fazer o mesmo em relação às ações criminais e cíveis.
Em entrevista ao Globo, o ex-ministro reclama de falta de consideração do presidente e diz que chegou a hora de “cada um seguir com sua vida”. Ele conta que reuniu 40 advogados que trabalharam de graça sob sua coordenação para defender a família Bolsonaro em dezenas de processos. “A família Bolsonaro deve esse exército de advogados que atuaram de graça ao trabalho que eu fiz”, afirmou. “Apesar de ter sido chamado de mentiroso, e não ter tido uma gota de consideração depois de tudo que eu fiz, a minha posição profissional continua a mesma”, acrescentou.
Bebianno foi demitido há quase dois meses, após se desentender publicamente com o presidente e seu filho Carlos Bolsonaro. Ele conta que defendeu Bolsonaro mesmo após ser demitido do ministério e que contratou recentemente uma perícia no processo de Adélio Bispo para demonstrar que o autor das facadas no presidente tem condições mentais de responder por seus atos.
“Apesar de não ter tido nenhum tipo de consideração por parte do presidente, continuei tendo consideração por ele. No processo do Adélio, tem uma conclusão crucial, se ele é inimputável ou não. E foi graças à minha insistência que foi nomeada uma perita”, afirmou Bebianno ao Globo.
Segundo o jornal, a pedido do ex-ministro e do empresário Paulo Marinho, amigo do presidente e suplente do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o criminalista Antonio Pitombo passou a atuar como assistente de acusação no caso Adélio, considerado inimputável pelos peritos da Justiça. “Enquanto muita gente fica dando ataque histérico e fazendo gracinha na internet, quem tomava as providências efetivas era eu. Não adianta ficar xingando o Adélio, se não tiver um laudo dizendo que ele não é maluco. Eu que consegui a perita, coloquei no circuito e inclusive paguei a primeira parcela”, afirmou o ex-ministro sem nominar quem “fica dando ataque histérico e fazendo gracinha na internet”.
Bebianno disse que pediu ao presidente que indicasse outros advogados para substituí-lo em todos os processos depois que o próprio Globo revelou áudio de uma conversa entre o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o próprio Bolsonaro. No diálogo, Bolsonaro afirmou que teria de “vender uma casa para poder pagar” Bebianno se ele resolvesse cobrar pelos serviços prestados.
“Quando vazou o áudio do Onyx, entrei em contato com o presidente e disse: ‘O senhor não tem que me pagar nada, o senhor não me deve nada, o que eu fiz, como o senhor sabe, foi por acreditar em uma causa’. E pedi que ele arrumasse outro advogado.”
Bebianno foi substituído na semana passada pela advogada Karina Kufa em 30 ações eleitorais. Ela também deve assumir processos civis e criminais, mas ainda faz o levantamento do volume de causas do presidente que tramitam na Justiça. “Eu quero passar tudo, as ações civis e criminais, acho que cada um tem que seguir com a sua vida”, declarou o ex-ministro.
Choque com Carlos
Como homem de confiança de Bolsonaro, Gustavo Bebianno presidiu o PSL durante a campanha eleitoral a pedido do próprio candidato. Mas caiu em desgraça após entrar em conflito com o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente. Carlos foi peça decisiva em sua queda.
Ele usou o Twitter para dizer que o ministro havia mentido ao declarar em entrevista que havia conversado três vezes com Bolsonaro logo após o surgimento de denúncias envolvendo seu nome e o esquema de candidatas laranjas do PSL. Bolsonaro confirmou que não havia conversado com o ministro e divulgou áudio mostrando que havia abortado a tentativa de Bebianno em falar com ele pelo telefone.
Na época, ele se recuperava de uma cirurgia para a reconstituição do intestino, atingido pela facada que levou durante a campanha eleitoral em 6 de agosto em Juiz de Fora (MG). Mas Bebianno mostrou, dias depois, que os dois haviam trocado mensagens na ocasião. O episódio foi considerado demonstração de quebra de confiança pelo presidente que o demitiu. Foi a primeira baixa no alto escalão do governo. Na semana passada o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi demitido em meio a uma crise política e gerencial na pasta.