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segunda-feira 11 de setembro de 2023 às 10:35h

Governo federal tenta apoio do TCU contra piso de saúde e educação

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A intenção do governo federal de não cumprir, neste ano, os gastos mínimos com saúde e educação atrelados à regra da receita pode ser inconstitucional. Além disso, segundo Lu Aiko Otta, Jéssica Sant’Ana e Guilherme Pimenta , do jornal Valor, a estratégia do Executivo de buscar apoio para a medida no Tribunal de Contas da União (TCU) pode provocar um efeito-manada em tribunais de contas de Estados e de municípios. É o que alertam especialistas ouvidos pelo Valor.

“É um precedente perigoso”, disse Elida Graziane Pinto, professora de Finanças Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV) e procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo. “É inconstitucional. Sem dúvida nenhuma, se passar [pelo TCU], as entidades representativas vão entrar com ação e acionar também o Ministério Público”, disse o economista Francisco Funcia, presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABrES).

A sanção do novo arcabouço fiscal levou à revogação do teto de gastos, que limitava o crescimento dessas despesas à variação da inflação. Com isso, voltou a valer a regra constitucional de atrelar o piso de investimento em saúde e em educação à variação da receita, sendo 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) no caso da saúde e 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI) para a educação.

Para chegar a esses percentuais mínimos, seriam necessários até R$ 18 bilhões, nos cálculos do Ministério do Planejamento. “O impacto em 2023 pode variar de zero a R$ 18 bilhões. Zero se concluirmos que não precisa aplicar retorno do piso em 2023. São R$ 18 bilhões se entendermos que deve ser aplicada 15% da receita corrente líquida prevista para o ano atualizada. Pode ser R$ 3 bi também, se entendermos que é a receita corrente líquida do PLOA ou da LOA original”, disse o secretário de Orçamento Federal, Paulo Bijos, em entrevista recente ao Valor.

Mesmo que fossem R$ 3 bilhões, disse, o governo seria obrigado a remanejar recursos dentro do Orçamento e até bloquear verbas de outras pastas. Já se forem os R$ 18 bilhões, poderia levar alguns ministérios à paralisia por falta de recursos, segundo tem afirmado a ministra Simone Tebet. “A ministra colocou essa questão com muita precisão. Quando a gente faz aqueles bloqueios bimestrais de R$ 1 bi, R$ 1,7 bi, o impacto disso nos ministérios já é muito forte. Imagine se for R$ 18 bi. R$ 3 bi também já seria muita coisa”, disse Bijos.

Para Elida, o risco de “shutdown” é uma “emergência fabricada”. O problema já estava no horizonte desde o ano passado, quando foi aprovada em dezembro a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição. Essa PEC previa a substituição do teto de gastos pelo novo arcabouço.

Na época, o governo destinou – a partir da aprovação da PEC – recursos extras à saúde e educação visando a recomposição dos pisos. Só para a saúde foram R$ 22,7 bilhões aos cerca de R$ 150 bilhões encaminhados originalmente no projeto de Orçamento para 2023. Só que a receita vem crescendo mais do que o previsto, e os R$ 22,7 bilhões reservados não serão suficientes para cumprir a regra do piso constitucional.

Por isso, o governo vai consultar o TCU. Bijos disse que a não aplicação em 2023 seria possível porque o novo arcabouço não liberou o limite de despesas dos ministérios estabelecido pelo teto de gastos. “Em 2023, a gente vai seguir até o fim do ano com a mesma lógica de limite das dotações autorizadas. Como nos manteremos firmes em relação aos limites de despesas, em razão disso não faz sentido penalizar o Orçamento deste ano com retorno dos mínimos antigos de vinculação da saúde à receita”, explicou ao Valor.

É inconstitucional. Se passar pelo TCU entidades vão entrar com ação e acionar também o MP”
— Francisco Funcia

Já para Elida, o governo “não tem o direito de negar cumprimento à Constituição” e pedir que o “TCU interprete nesse contexto em que a regra é clara”. A solução encontrada inverte a hierarquia das leis, acrescentou a procuradora. O governo espera que o TCU o dispense de cumprir regras que estão na Constituição para cumprir uma meta fiscal que está em uma lei ordinária, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), diz.

Funcia confirma que, se não houver a aplicação integral do piso em 2023, a Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABrES) vai procurar a Justiça e o Ministério Público. Ele acrescenta que o problema surgiu porque o governo criou, no novo arcabouço, a regra de limitar o crescimento real das despesas a até 2,5%, mas deixou os pisos da saúde e da educação crescendo no ritmo da receita.

“Óbvio que grande parte desses 2,5% vai ser consumido com os pisos, porque são duas despesas grandes, mas são direitos da população consagrados na Constituição e direitos de cidadania com efeito estratégico para o desenvolvimento do Brasil”, defende Funcia.

Procurados, os ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento não comentaram a interpretação dos especialistas. O Planejamento respondeu, apenas, que “o processo de formulação da consulta ao TCU está em estado avançado”. A Fazenda falou que não iria comentar porque a consulta ainda não foi formalizada.

O Ministério Público junto ao TCU pediu na semana passada que a Corte permita ao governo não aplicar os pisos de saúde e educação até o fim deste ano. Na representação, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado assinala que, a partir do “risco de shutdown”, “não vejo por que impor à sociedade maiores prejuízos considerando que quaisquer mudanças deveriam surgir para melhorias”. O processo ainda não foi distribuído.

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