A pouco mais de um ano das eleições municipais e com a PEC da anistia aos partidos políticos avançando no Congresso Nacional, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começou a fechar ainda mais o cerco segundo Luísa Martins e Raphael Di Cunto, do jornal Valor, em relação ao cumprimento da cota de gênero pelas agremiações. A Corte estuda ampliar as hipóteses que podem ser consideradas fraudulentas, como aquelas em que a mulher se candidata já sabendo de antemão que está inelegível.
O alerta já foi feito aos colegas pelo ministro Floriano de Azevedo Marques. Segundo ele, quando uma candidatura feminina é negada na Justiça e o prazo decorre sem que ela apresente recurso, é sinal de alerta. “Cedo ou tarde vamos ter de enfrentar essa situação, de candidatas inscritas para cumprir a cota de gênero sem condições de elegibilidade, porque essa também é uma maneira de fraude”, disse.
Só em agostos, outros oito casos de candidaturas fictícias – ou “laranjas” – foram constatados pelo tribunal. Quatro ocorreram em Belo Horizonte (MG), encampadas pelo PRTB, também em 2020. Os ministros entenderam que houve fraude porque, além de as prestações de contas estarem zeradas, os votos recebidos pelas mulheres foram ínfimos – seis, cinco, um e zero. Ou seja, nem mesmo a candidata votou em si própria.
Em Joinville (SC), duas candidatas do antigo DEM admitiram, em depoimento à Justiça, que concorreram em 2020 apenas para cumprir a cota, “sob promessa de pagamento de certa quantia”. Outras duas ocorrências foram registradas em São Vicente (SP). A Corte Eleitoral declarou nulos os votos recebidos por candidatos do extinto PSL, devido ao registro das candidaturas femininas falsas. Fundidos, os dois partidos hoje formam o União Brasil.
Pela legislação eleitoral, cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% de candidaturas femininas, em qualquer eleição – seja geral ou municipal. A regra, que também vale para candidaturas negras, é obrigatória desde 2009, mas o Congresso discute a possibilidade de anistiar as legendas que não obedeceram ao percentual mínimo, seja de gênero ou de raça.
Nesta terça-feira, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia – que também integra o TSE – reforçou a importância da cota de gênero e criticou o texto da PEC. Ela lamentou que a proposta tenha apoio até de parlamentares mulheres. “Não é uma luta fácil. A política foi feita por homens, que querem permanecer nos espaços de poder”, criticou, em evento sobre direitos das mulheres realizado pelo Tribunal de Justiça de Goiás.
Apenas deputados do Psol fizeram propostas para a realização de audiências públicas, incluindo integrantes do Ministério Público e do TSE, além de especialistas e de representantes dos movimentos sociais. Já o relator sugeriu somente o nome do presidente da comissão de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Ricardo Vita Porto.
Nesta quarta, Rodrigues vai se reunir a portas fechadas com os presidentes dos partidos para discutir o texto. O Valor procurou o PRTB, o PSD e o União Brasil para comentar as decisões do TSE, mas não obteve retorno.