O mês de julho deve ser o mais quente já registrado na história, algo sem precedentes em centenas de anos e uma prévia do que deve ser o futuro do planeta, segundo os serviços de monitoramento climático das Nações Unidas (ONU) e da União Europeia (UE).
“A menos que ocorra uma mini era do gelo nos próximos dias”, é improvável que esse quadro sombrio mude, declarou a jornalistas em Nova York o secretário-geral da ONU, António Guterres.
O anúncio desta última quinta-feira (27) vem na esteira de vários outros recordes de calor anunciados neste ano. As conclusões estão amparadas em dados colhidos nas primeiras três semanas de julho, que foram marcadas por uma série de eventos climáticos extremos ao redor do globo: incêndios em ilhas turísticas na Grécia, Espanha e Itália – que também registrou chuva de granizo descomunal –; temperaturas acima dos 40º C ao longo da costa Mediterrânea na Europa e nos Estados Unidos; ciclones avassaladores no sul do Brasil; chuvas recorde em partes da Ásia; e, na China, termômetros que chegaram a 52,2º C.
Também os oceanos registraram temperaturas mais altas, o que não só contribui para um clima mais quente como também cria um ambiente potencialmente perigoso para o equilíbrio da vida marinha – a exemplo da Flórida, cujas águas chegaram a anormais 38º C. Até mesmo a Antártida, um dos lugares mais frios do mundo, sentiu o impacto, com as geleiras em seu patamar mais baixo apesar do inverno no Hemisfério Sul.
É a “era da fervura global”, segundo Guterres – prova de que as mudanças climáticas, um desastre para o planeta, já estão em curso, e em velocidade “surpreendente”. “É assustador. E é apenas o começo.”
Para Carlo Buontempo, diretor do Serviço Copernicus para as Mudanças Climáticas (C3S), órgão ligado à UE, está claro que as altas temperaturas estão relacionadas às emissões de carbono decorrentes da ação humana sobre o planeta.
“Nunca foi tão urgente reduzir a emissão de gases do efeito estufa como agora. Ação climática não é luxo – é necessidade”, declarou o secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial (OMM), Petteri Taalas.
Julho superou ponto crítico do aquecimento global
A temperatura média para julho chegou a ficar 1,5º C acima dos níveis pré-industriais ao longo da primeira e da terceira semana do mês – limite fixado pelo Acordo de Paris que, uma vez ultrapassado em caráter permanente, teria implicações dramáticas para o planeta.
O mês começou com o recorde diário da temperatura média global sendo quebrado por quatro dias seguidos, de 3 a 6 de julho. Previsões da Nasa já indicavam que julho seria um mês excepcional, projetando um cenário ainda pior em 2024.
Corroborando as conclusões do C3S e da OMM, um grupo de pesquisadores da Universidade de Leipzig, na Alemanha, apontou que a temperatura média global para o mês de julho deve superar em ao menos 0,2º C o recorde anterior, quebrado em julho de 2019 – até então o mais quente em 174 anos de monitoramento.
Karsten Haustein, da Universidade de Leipzig, sustenta que temperaturas tão altas assim só poderiam ser encontradas no planeta “alguns milhares, senão dezenas de milhares de anos” atrás.
Medições climáticas mais antigas e menos sofisticadas – auferidas a partir de itens como núcleos de gelo e troncos de árvores – sugerem que esse é o nível mais quente que a terra atingiu em 120.000 anos, segundo o pesquisador do clima.
Essas temperaturas mais altas funcionam como um catalizador de eventos climáticos extremos, que se tornam ainda piores sob a influência do El Niño, fenômeno natural caracterizado pelo aquecimento das águas do Pacífico.
Embora ainda esteja em seu estágio inicial, devendo atingir seu ápice só no final deste ano e ao longo de 2024, o El Niño é apontado como tendo desempenhado um papel crucial nas ondas de calor extremo de julho – razão pela qual cientistas esperam que o recorde de ano mais quente, quebrado em 2016, seja superado ainda em 2023 ou 2024.