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Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado. / Foto: Pedro França/Agência Senado
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domingo 28 de maio de 2023 às 13:25h

Não adianta ter regra dura, como o teto, para não cumprir, diz economista

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Felipe Salto, economista-chefe da corretora Warren Rena, não se define, propriamente, como um defensor do novo marco fiscal. Considera, contudo, que nutre uma visão pragmática sobre o assunto. Às críticas de que as normas são frágeis ele rebate: de que adianta ter regras duras, se ninguém as cumpre?

Salto, ex-secretário de Fazenda de São Paulo, em 2022, na gestão de Rodrigo Garcia, também não poupa seus colegas economistas que elogiam o teto de gastos. Por quê? É o que ele explica a seguir, em entrevista a Carlos Rydlewski, do portal Metrópoles.

Como o senhor avalia a última versão do novo marco fiscal?

O balanço, até aqui, é que está na direção da responsabilidade fiscal. Existe uma regra de gastos e outra de resultado primário (relação entre receitas e despesas do governo central, sem considerar o pagamento de juros). A novidade é que a norma do primário está ligada ao controle do crescimento de despesas.

Por isso, os críticos dizem que, no marco, as despesas estão garantidas, mas as receitas não. E esse seria o problema.

Não vou comentar as críticas. Vou dizer o que penso do novo marco. Em primeiro lugar, não é o que eu teria feito. Mas, do jeito que está, não se trata de uma regra que reduz o gasto público, ou mesmo que faz essa despesa crescer muito menos. Ele nem se propõe a isso. Por outro lado, como eu disse, garante que a despesa crescerá menos do que cresceria na ausência dessa norma. As críticas dizem que o arcabouço não serve para nada. A resposta é que, sem ele, a situação seria muito pior. A dívida seria mais alta, e os juros também.

Como o senhor avalia as mudanças feitas no substituto aprovado na Câmara?

O deputado Claudio Cajado (relator da proposta, do PP-BA) deixou os anéis irem embora para manter os dedos. Ele cedeu na questão de 2024, ano para o qual existe uma regra especial que permite um maior limite de gastos. Mas a proposta final é um pouco melhor do que a inicialmente feita pelo governo. O fato é que não adianta termos uma regra draconiana.

Por quê?

Acho bonito alguns economistas falarem que o teto de gastos era a última bolacha do pacote, porque as despesas só podiam crescer de acordo com a inflação. Mas aí vem o detalhe: mostre-me um ano de vigência do teto em que a despesa cresceu apenas pela inflação. Eu digo em qual ano: nenhum. Isso nunca aconteceu. Então, o que adianta ter uma regra dura se ninguém cumpre? Agora, isso não significa que temos de jogar a toalha.

O que é preciso fazer?

Precisamos encontrar um caminho do meio. Algo que seja exequível e estimule uma conduta responsável. Não adianta ter uma regra se o governo não tiver a convicção de que é preciso controlar os gastos. Sem isso, daqui a dois anos vamos ter de discutir novamente um marco fiscal.

Quais mudanças feitas na Câmara foram importantes?

Se o governo romper a regra do resultado primário, existem punições que endurecem a norma de gastos. Elas, por exemplo, restringem qualquer medida dos Três Poderes que implique aumento real de despesas. Proíbem ainda a reorganização de carreiras e a criação de cargos comissionados. No segundo ano, não permitem reajustes de salários dos servidores e realização de concursos públicos. É uma lista bastante exaustiva.

O senhor disse que o não cumprimento das regras poderia caracterizar uma infração à Lei de Responsabilidade Fiscal. Como isso funcionaria?

O substitutivo aprovado na Câmara diz que, se o governo não fizer o contingenciamento de gastos necessário para cumprir a meta de resultado primário, e ficar provado que era possível ter feito esse bloqueio, isso será uma infração à Lei de Responsabilidade Fiscal. Está explícito no texto. Para mim, isso é crime de responsabilidade.

Por falar em resultado primário, o último relatório bimestral do governo mostrou um aumento de 25% da previsão de déficit para este ano. Isso preocupa?

Havia uma previsão de déficit de R$ 65 bilhões para 2023. Mas a PEC da Transição autorizou um monte de gastos por fora. Isso elevou a estimativa de déficit para R$ 238 bilhões (2,2% do Produto Interno Bruto). Agora, a projeção passou de R$ 107,6 bilhões (cerca de 1% do PIB) para R$ 136,2 bilhões (1,3% do PIB). Assim, ainda estamos bem abaixo dos R$ 238 bilhões permitidos. Parece maluquice, mas foi isso o que aconteceu.

Mas o governo havia falado em limitar o déficit em 0,5% do PIB, em 2023.

Falou, sim. Mas isso foi numa coletiva, quando a primeira versão do marco foi apresentada. Havia um gráfico que fixava esse percentual. Mas os integrantes do governo fizeram questão de esconder isso, não trataram mais do assunto.

É possível obter receitas reduzindo benefícios fiscais, como pretende o governo?

Isso é legítimo, mas tem um custo. À medida que o governo combate os benefícios fiscais dados a diversos setores em busca de uma receita maior, isso vai reonerar esses segmentos e pode afetar a atividade econômica. Mas, no geral, esse tipo de medida pode ser positiva.

Por quê?

Esse conjunto de benefícios representa 4% do PIB e é muito ineficaz. Não é só a Zona Franca de Manaus e o Simples. É uma montanha de gastos, com regimes especiais para diversos setores, como a indústria química. Se o governo conseguir corrigir essas ineficiências e entregar boa parte do que está prometendo, isso será bom e aumentará a receita.

Mas o governo consegue entregar?

Nesse ponto, eu concordo com as críticas. O governo não divulga detalhes das contas, mas fala em conseguir R$ 150 bilhões. Ele não tem memória de cálculo.

Dessa quantia, quanto já parece ser possível conseguir?

Por enquanto, de todas as ações anunciadas, uma das que está mais firme tem a ver com recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que autorizou a União a cobrar impostos federais sobre benefícios fiscais concedidos pelos estados. A Receita já está mandando cartinha para todo mundo e, para quem não pagar em 60 dias, o valor da conta dobra. Em cenário otimista, temos medidas que podem render R$ 67 bilhões. Mas ainda falta muito para chegar aos R$ 150 bilhões.

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