O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atuaram juntos até os últimos minutos antes das votações do texto-base e dos destaques do arcabouço fiscal para impedir que a pressão de operadores do mercado provocasse mudanças na proposta.
A pressão maior do mercado financeiro foi segundo Guilherme Balza e Elisa Clavery, do g1, por modificar um trecho do texto do relator Cláudio Cajado (PP-AL) que trazia as regras para a execução de despesas em 2024, o primeiro ano de vigência do novo marco fiscal.
A versão original, enviada pelo Executivo ao Congresso, não trazia nenhuma regra específica para 2024 – ou seja, o crescimento de despesas também oscilaria entre 0,6% e 2,5%, como nos anos seguintes. Mas na primeira versão do parecer, Cajado fixou que no ano que vem as despesas poderiam crescer 2,5%, limite que a regra fiscal permite para o aumento dos gastos. Cálculos do mercado estimavam que essas e outras mudanças feitas por Cajado permitiriam um gasto extra de R$ 80 bilhões ao governo em 2024.
Esse trecho foi objeto de discussões ao longo de toda a terça-feira (23) entre o relator com os líderes dos partidos, Lira, Haddad e representantes do mercado, como o banqueiro André Esteves. O tema foi abordado, inclusive, num almoço na residência oficial da Presidência do Senado.
Segundo interlocutores que acompanharam as negociações, durante as tratativas houve um momento de estranhamento, quando Lira percebeu que Cajado havia incluído no texto uma mudança sobre os gastos em 2024 que não havia sido acordada com os líderes partidários. O presidente da Câmara, então, determinou a retirada desse trecho.
De acordo com fontes do Congresso, a versão original do projeto, sem exceções para o aumento de gastos para 2024, contemplava posições defendidas pelo mercado, que endureciam a margem de gastos em 2024.
Após um dia de intensas negociações, chegou-se a um meio termo: Cajado incluiu no parecer o artigo 15, que permite ao governo ampliar as despesas em 2024, por meio de crédito suplementar, após duas avaliações bimestrais de receitas e despesas.
Anualmente, a segunda avaliação é feita em maio. Ainda, a possibilidade de aumentar os gastos teria que considerar o crescimento da receita do exercício completo de 2023 (ou seja, de janeiro a dezembro) e comparar com a projeção para 2024. Caso o aumento de receitas não se confirme no fim do próximo ano, a diferença terá que ser reduzida de 2025.
Haddad participou diretamente das negociações ao longo de toda a terça-feira, conversando por telefone com líderes partidários e representantes do mercado.
O assunto, no entanto, ainda não estava resolvido. Nesta quarta-feira (24), o PL apresentou um destaque para retirar a regra especial sobre 2024. Nas contas de técnicos do Orçamento da Câmara, o destaque retiraria um espaço de R$ 26 bilhões em *gastos para o governo no próximo ano. Ou seja, a retirada do ponto endureceria ainda mais a regra fiscal.
Durante a sessão de ontem, deputados da União Brasil, como Celso Sabino (União-PA), defenderam a aprovação do destaque. O partido, que tem ministérios no governo Lula, deu 59 votos favoráveis ao destaque do PL/mercado, quatro abstenções e apenas um voto contrário, do deputado Luciano Bivar (PE), presidente da sigla.
Já o PP de Arthur Lira, que não está na base, teve comportamento oposto: foram 38 votos pela rejeição do destaque, seis votos a favor e cinco abstenções. O cenário foi parecido com o Republicanos, outro partido que não está na base, que deu 42 votos contrários ao destaque, quatro favoráveis e uma abstenção.