No início deste mês, o empresário industrial soteropolitano Ricardo Alban foi eleito para um mandato de quatro anos à frente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Alban, de 63 anos, é vice-presidente da CNI; presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB) – que reúne 44 sindicatos representando mais de 20 mil indústrias em todo o estado – desde 2014; e presidente do Centro das Indústrias do Estado da Bahia (CIEB) desde 2018.
Sob a liderança de Alban, a inovação tornou-se vetor fundamental na FIEB, contribuindo para criar, na Bahia, um hub para a nova indústria, baseada em inovação, Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e energia limpa. Focado em pensar sempre à frente, Alban esteve, em abril, na Feira de Hannover, o maior evento de tecnologia industrial que anualmente expõe tendências pensadas para superar desafios globais contemporâneos, que aconteceu em abril na Alemanha. O Brasil marcou presença na feira por meio da CNI, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e do Serviço Social da Indústria (SESI), que apresentaram ao enorme público presente as ações do setor produtivo brasileiro na agenda de baixo carbono.
Formado em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal da Bahia e Administração de Empresas pela Escola de Administração de Empresas da Bahia, Alban é sócio-diretor da Biscoitos Tupy, tradicional fábrica de alimentos baiana fundada por sua família. Assumirá a presidência da CNI em 31 de outubro, quando se encerra o mandato de Robson Braga de Andrade.
Em entrevista ao portal Indústria Verde, Alban compartilha algumas impressões colhidas de sua participação na feira de Hannover e projeta cenários futuros para a Bahia e para o Brasil.
INDÚSTRIA VERDE – Na Feira Internacional de Hannover, o senhor mediou – no estande brasileiro – um showcase em torno do tema Transição Energética – Hidrogênio Verde. Onde o Brasil se situa no palco global de potencial produção deste combustível limpo e renovável?
RICARDO ALBAN – Os ventos fortes durante a noite e a irradiação solar durante o dia conferem ao Brasil, em especial ao Nordeste, condições favoráveis à produção de hidrogênio verde (H2V). O país tem grande potencial para se tornar um importante player mundial na produção do hidrogênio verde e já existem investimentos significativos neste sentido. Em outras regiões do Brasil, onde os potenciais de geração solar e eólico são baixos, uma possibilidade bastante factível é a produção de hidrogênio de baixo carbono, utilizando técnicas de Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono (Carbon Capture, Utilization and Storage), cujo objetivo principal é impedir a liberação de CO2 para a atmosfera.
Como a produção em escala industrial ainda é um desafio, precisamos avançar para que a tecnologia esteja madura em toda a cadeia, além do desenvolvimento de políticas públicas e incentivos relacionados à economia do hidrogênio, seja ele verde ou de baixo carbono. Para isso, a sinergia e o compartilhamento de experiências entre empresas, institutos de pesquisa e governo é fundamental.
A feira foi receptiva às contribuições brasileiras ao processo de transição energética global que está em curso?
RA – Sim, até porque a proposta levada pelo Brasil foi bem coerente e exequível. O momento atual facilitou a receptividade da proposta brasileira de fazer uma transição energética baseada em um processo mais suave e adequado à realidade tecnológica e econômica de cada país. Outro ponto de consenso da proposta brasileira é que, para o Brasil, a nossa matriz energética será mais ampla, com múltiplas fontes.
No caso específico da mobilidade, o Brasil defende uma matriz mais diversificada, com diferentes tecnologias. Já temos carros elétricos e isso vai aumentar inevitavelmente. Também teremos, em um futuro mais distante, carros a hidrogênio. No curtíssimo prazo, a estratégia de descarbonização na mobilidade do Brasil passa por continuar com os motores de combustão, mas usando etanol cada vez mais – ou seja, os motores flex de alta eficiência, que emitem menos, coexistindo com os motores elétricos híbridos flex.
“No curto prazo, a estratégia de descarbonização na mobilidade do Brasil passa por continuar com os motores de combustão, mas usando etanol cada vez mais.”
Sabemos que a Bahia abrigará o primeiro projeto de hidrogênio verde em escala industrial no país, por meio da empresa Unigel. Como o estado saiu na frente nessa corrida para a produção do combustível? Já é possível prever o que esta produção significará para a Bahia e para o Brasil?
RA – Em função da disponibilidade de recursos de energia renovável de baixo custo, a Bahia é considerada uma região potencialmente favorável ao desenvolvimento de hidrogênio verde. Diferentes esforços contribuíram para que o estado se destacasse nesta área.
No ano passado, o governo do Estado lançou o Plano Estadual para Economia de Hidrogênio Verde na Bahia. Uma das ações deste plano é o Mapeamento do Potencial de Produção de Hidrogênio Verde, que está sendo desenvolvido pelo SENAI Cimatec em parceria com algumas Secretarias de Governo. Esse estudo busca identificar – por meio de critérios ambientais, de desenvolvimento socioeconômico, de disponibilidade de infraestrutura, além das disponibilidades de recursos hídricos e de energia – as áreas prioritárias com vocação para a produção de hidrogênio verde na Bahia, com objetivo de subsidiar o planejamento, incentivo e a criação de políticas públicas relacionadas à economia H2V no estado.
“O país tem grande potencial para se tornar um importante player mundial na produção do hidrogênio verde e já existem investimentos significativos neste sentido.”
Em paralelo, há investimentos como o da Unigel, um projeto integrado de hidrogênio verde e de amônia verde. A nova fábrica da companhia terá, em sua primeira fase, capacidade de produção de 10 mil toneladas/ano de hidrogênio verde e de 60 mil toneladas/ano de amônia verde. Esse projeto vai impactar diretamente no processo de descarbonização.
Quais os novos planos que a indústria da Bahia guarda na manga para responder às demandas contemporâneas por uma indústria mais verde, mais sustentável?
RA – Os estados têm suas estratégias em relação à economia verde que passam por exportar energia verde. O Nordeste, principalmente, é um grande gerador e pode ser um grande exportador de energia verde, seja eólica ou solar. Para exportar essa energia dentro do país, são necessárias linhas de transmissão. Mas boa parte desta energia será exportada para outros países, e o meio para isso é via hidrogênio convertido em amônia. A amônia verde, comprimida líquida, é o que deve ser o meio para exportar toda essa energia limpa, principalmente para a Europa.
Esse é um grande negócio e faz parte da estratégia do Ceará, Pernambuco e outros estados que estão bem focados nisso. Mas há um consenso também de que o Brasil não deve focar apenas em exportar a nossa energia verde, sem processamento, sem agregação de valor, como uma commodity.A ideia é que uma parte da energia verde gerada no Brasil, principalmente no Nordeste, seja utilizada para descarbonizar a nossa indústria.
Então o que a Bahia tem na manga é uma estratégia de descarbonização dos diversos setores da indústria baiana, da economia baiana como um todo. Assim, a gente agrega mais valor, ao invés de só exportar a energia verde. Outro aspecto é a iniciativa do governo do estado de elaborar um mapa do hidrogênio verde, para atrair investidores, que está sendo desenvolvido pelo SENAI Cimatec. Um terceiro pilar, mais específico e técnico, é uma iniciativa do SENAI Cimatec de criar um hub de pesquisa e desenvolvimento em hidrogênio verde, com diversas plantas piloto que servirão para desenvolver essas tecnologias de descarbonização nos diversos setores industriais.
“Há um consenso de que o Brasil não deve focar apenas em exportar a nossa energia verde, sem agregação de valor, como uma commodity. A ideia é que uma parte da energia seja usada para descarbonizar a nossa indústria.”
De que formas a FIEB vem fomentando o protagonismo industrial no campo ambiental e da sustentabilidade?
RA – A FIEB tem o compromisso de ser um agente indutor de sustentabilidade junto à indústria baiana. Para apoiar as empresas neste sentido, realizamos capacitações para esclarecer e debater conceitos importantes, como o ESG; elaboramos materiais informativos; e incentivamos e divulgamos boas práticas de gestão e tecnologias sustentáveis adotadas na indústria. Uma ação com este objetivo é o Prêmio Indústria Baiana Sustentável, realizado a cada dois anos, com a participação de empresas de diversos portes que apresentam seus esforços para promover o desenvolvimento sustentável do nosso estado. Com esses exemplos, buscamos sensibilizar as empresas, mostrando que é preciso avançar sempre, incorporando conceitos e práticas sustentáveis inovadoras.