Líder do maior bloco na Câmara dos Deputados, Felipe Carreras (PSB-PE) diz que o governo precisa melhorar sua relação com o Congresso Nacional e cobra maior participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na articulação política.
Em entrevista à Danielle Brant e João Gabriel, da Folha, Carreras afirma que o blocão de 173 deputados —composto por União Brasil, PP, federação PSDB-Cidadania, PDT, PSB, Avante, Solidariedade e Patriota— ajuda na governabilidade da gestão petista.
No entanto, diz haver necessidade de que o governo destrave indicações a cargos e acelere o pagamento de emendas para que os partidos entreguem votos. “Talvez precise o governo afinar mais, cumprir o que foi pactuado, para ter as entregas necessárias de forma pragmática dos votos.”
Carreras, aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também pede mais diálogo do Executivo com o Legislativo.
Qual o balanço da criação do maior bloco da Câmara um mês depois? Positivo. O que a gente estava buscando era uma integração de um bloco que pudesse dar representatividade para alguns parlamentares, até do nosso campo, do PSB, do PDT, para ter espaço, protagonismo em comissões. Na própria CPMI [do 8 de janeiro], nós não teríamos, dentro da proporcionalidade, direito a indicar vagas de titularidade, nem de suplência. Vamos ter.
A gente, enquanto partido da base sólida do presidente Lula, está agregado a partidos que são decisivos para a governabilidade, como União Brasil, como Progressistas, como o próprio Avante, PSDB-Cidadania, e a gente tem buscado proximidade. A gente tem identificado problemas e buscado soluções.
Dá para considerar que é um bloco da base? Acho que o governo precisa fazer suas autocríticas. Precisa melhorar a sua relação com o Congresso Nacional para a gente poder ajudar também, né? A gente, no PSB, tem que ter nossa visão crítica. A gente também tem que levar o que esses partidos estão tendo de insatisfações. Mas o compromisso continua aceso de ser um bloco da base.
Que tipo de autocrítica o governo tem que fazer? Conversar com o Congresso, conversar com os líderes partidários. O presidente Lula, que é a maior liderança política da história do país, [precisa] participar do jogo político, chamar para si também, conversar com os diferentes, com partido de centro, ouvir críticas e sugestões para o governo ser mais assertivo.
Nas decisões que são tomadas, escuto até críticas de ministros de que são tomadas decisões com decretos, que sequer eles da área afim são ouvidos.
Para o sr., parte da desorganização no Congresso poderia ser resolvida se o presidente assumisse esse papel de articulador? Acho que se o presidente ouvisse um pouco, mas ouvisse… Não tenho notícia, depois que ele tomou posse, que ele tenha falado com algum líder de partido de centro, que é decisivo para sua governabilidade. Muita coisa poderia ser evitada, como declarações públicas. Achar que existia um equívoco ou outro na legislatura passada é natural, mas tem coisa que não precisa ser exposta, porque fragiliza a relação.
Consultar um líder sobre um tema, um relator de uma matéria importante que foi aprovada na legislatura passada, eu acho que poderia evitar algumas crises aqui na Casa.
Está faltando diálogo com o Congresso então? Acho. Prefeito, muitas vezes, não gosta de ouvir e receber vereador para despachar. Governador escuta deputado estadual para governar. Eu acho que o presidente, dentro até de sua história de presidente dos mandatos que ele exerceu, ele fazia esse tipo de reunião, de até a aproximação com a base e com outros parlamentares. Ele criou uma aproximação muito grande.
Um grande exemplo é José Múcio Monteiro [ministro da Defesa]. Ele trouxe para perto um deputado federal que é muito querido, muito hábil, que era do PFL, que sempre foi da direita. E ajudou muito a dar governabilidade.
Não tenho nenhum tipo de ciúme por eu ser de um partido da base —do vice-presidente [Geraldo Alckmin], ter três ministros, de ser do nosso campo de esquerda— e enxergar protagonismo em parlamentares de centro. Isso ajuda, é bom para o país. Eu acho que a gente tem que deixar de olhar para dentro, deixar de ser radical, estreito, e alargar o governo. Trazer gente para ajudar, ampliar, olhar para o país. Não tem terceiro turno.
O sr. acha que ele está ouvindo muito o próprio partido? Acho que tem muita gente agindo com o fígado. Tem que esquecer quem governou no passado. As instituições estão fazendo sua parte e a gente precisa governar para todos. Não tem que dividir quem é bolsonarista e quem é lulista, quem é PT e quem é PL. Tem que unir o país. O nosso bloco quer agir com essa posição.
Além da falta de diálogo, quais as outras insatisfações que os partidos do bloco estão sinalizando? Algo que chega da nossa bancada, para mim como líder, é que a questão dos espaços regionais não consegue deslanchar. Mais de 100 dias e as coisas ficam represadas, não são anunciadas e muitas vezes, para piorar, anunciam um nome aqui, outra acolá, o que gera muito ciúme.
Prefeitos que cobram recursos para áreas sensíveis, para pavimentação de uma rua, um poço artesiano de um distrito num município distante, e não conseguem recurso para isso. E os parlamentares ficam num ambiente de ansiedade.
Essas indicações de partidos que não são o PT. Vejo insatisfação de toda a base do presidente Lula aqui. É uma coisa meio que generalizada. E a liberação das emendas não está deslanchando. Agora, esta semana, que foi aberta para cadastrar, mas é uma primeira fase. Depois vem o empenho, depois vem o pagamento.
Isso, quando chega no deputado, é um vereador que reclama do prefeito e o prefeito reclama do deputado. Ele já foi sinalizado desde janeiro. Isso vai fragilizando o parlamentar com a sua base. E termina refletindo na governabilidade.
O líder da União Brasil, Elmar Nascimento, disse em março que o governo precisa agilizar as emendas. Isso ajuda? Acho que ajuda. Agora isso tudo tem um momento, né? A gente está vivendo um momento de relativa tensão. E às vezes você quando chega com remédio no quadro que está estabelecido, muitas vezes não é a solução. Eu acho que o diálogo é importante, os movimentos que o governo fez foram interessantes, a questão das emendas é muito importante para acalmar a base dos deputados. Óbvio. Ficou claro que a vontade dos ministérios não se reflete no Congresso Nacional em votos. E eu concordo com líder Elmar que é importante, sim, resolver essa questão das emendas. Urgente.
No PSB, como o sr. está vendo a relação com o governo? A gente tem buscado fazer reuniões com os nossos ministros. A relação é excelente dos parlamentares com os nossos ministros.
Agora, toda a nossa bancada tem críticas em relação à questão do comportamento do governo, seja na indicação dos espaços regionais, seja também na questão das emendas. É generalizada na nossa bancada essa insatisfação.
A falta de articulação acabou se traduzindo em derrota na semana passada. Faltou leitura política? Eu acho que quando foi emitido o decreto [que altera o Marco do Saneamento e que acabou derrubado na Câmara] foi uma falha, porque não falou nem com o ministro da área fim, nem foi conversado com a Câmara.
Porque é um ato bruto mudar uma lei aprovada no Congresso Nacional através de um decreto. É óbvio que existiria algum tipo de consequência. Então, diante do ambiente de insatisfação, houve o recado do Parlamento em relação à matéria e em relação a outras questões que terminam, de alguma forma, influenciando na derrota do governo, que obviamente, é um recado que as coisas não estão funcionando como deveriam.
Agora há outros temas importantes, como arcabouço, a reforma tributária. O sr. viu uma mudança do governo para tentar aprovar essas pautas? Eu senti uma motivação, autocrítica de melhorar. Agora isso precisa ser traduzido e realizado.
O governo tem que atuar mais para conseguir os votos nas pautas econômicas? A atuação do governo está boa, no aspecto da interlocução do Congresso, com o próprio ministro Haddad. Ele nos convidou para conversar, foi até a residência oficial do presidente da Câmara fazer uma reunião com os líderes de bancada. Isso politicamente foi muito bem-visto. Agora, isso precisa ter constância. O ministro Haddad, em relação à habilidade política, está pontuando bem.
Quais CPIs têm mais potencial de impacto para o governo? É difícil fazer um prejulgamento. Tem CPI que já deu resultado, CPI que já terminou em pizza. Pelo perfil do presidente Arthur Lira, que pela primeira vez vai autorizar o funcionamento de CPI, e pelo perfil dos parlamentares, tenho certeza de que todas darão resultados.
Como está a relação do Lira e com o governo Lula? Vejo boa vontade do presidente Arthur, uma sinergia grande dele com o Lula. Arthur foi o presidente que teve a maior votação da história de um presidente do Parlamento brasileiro e tem uma vantagem: ele é previsível. Se você celebra acordo com ele, ele cumpre.
Acho que talvez precisa o governo afinar mais, cumprir o que foi pactuado, para ter as entregas necessárias de forma pragmática dos votos para aprovação de projetos estruturantes do país.
Quando Lira diz ‘não vamos aceitar retrocesso’, é um alerta? É um alerta. A gente já viu de forma objetiva que quando o governo quis enfrentar sem o diálogo, o governo vai perder. Vai perder.
FELIPE CARRERAS, 48 anos
Em seu terceiro mandato como deputado federal, Carreras assumiu como secretário de Turismo, Esporte e Lazer de Pernambuco em 2015. Antes, atuou como empresário.