Os chanceleres árabes decidiram por unanimidade, neste último domingo (7), reintegrar o governo da Síria à Liga Árabe, mais de 11 anos após a exclusão do regime de Damasco devido à repressão a uma revolta popular, que resultou em uma guerra longa e sangrenta.
A decisão foi tomada em um contexto de reconciliação entre a Arábia Saudita e o Irã e no momento em que o presidente sírio, Bashar al-Assad, precisa desesperadamente de recursos para a reconstrução do país.
“As delegações do governo da República Árabe Síria voltarão a participar nas reuniões da Liga Árabe”, afirma o texto aprovado por unanimidade pelos ministros em uma reunião a portas fechadas na sede da organização no Cairo.
Isolado diplomaticamente desde 2011, o presidente sírio saiu recentemente do status de ‘persona non grata’ e alguns analistas acreditam que ele poderia inclusive comparecer, em 19 de maio, à reunião de cúpula anual dos chefes de Estado da Liga Árabe.
“Assad é bem-vindo se desejar À reunião de cúpula de Jidá”, afirmou o secretário-geral da organização, Ahmed Aboul-Gheit.
Damasco afirmou que deseja “dialogar” e “reforçar a cooperação” em uma região que condenou o país ao ostracismo a partir de 2011. O conflito na Síria provocou 500.000 mortes e o deslocamento de milhões de pessoas nos últimos 12 anos.
A Coalizão Nacional Síria, aliança de oposição com sede na Turquia, considerou que a decisão significa “abandonar” os sírios, deixando os mesmos sem um “apoio árabe oficial”.
‘Vitória diplomática’
Para o especialista Fabrice Balanche, trata-se de uma vitória diplomática para Damasco. Se a Síria aceitar participar da reunião, isto representaria um retorno espetacular, levando em conta que, em 2013, a oposição chegou a ocupar a cadeira de Damasco em uma reunião da Liga Árabe no Catar.
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Catar, Majed Al-Ansari, disse que votou a favor da reintegração da Síria ao órgão, mas que sua posição “sobre a normalização” com Damasco não mudou.
Em novembro de 2011, 18 dos 22 países membros da Liga Árabe suspenderam a participação do governo sírio nas reuniões, o que foi celebrado pelos países ocidentais e a Turquia, mas criticado por Rússia, Irã, Iraque e Líbano. A organização pan-árabe também aprovou sanções econômicas contra aquele país.
Vários países árabes apoiaram os rebeldes no início da guerra, que sucessivamente se transformou em um terreno de batalha para várias potências estrangeiras – incluindo Rússia e Irã, aliadas do governo de Assad – assim como para grupos extremistas, como o Estado Islâmico.
O papel da reconciliação entre Arábia e Irã
A normalização, que era especulada há vários meses, foi favorecida pela solidariedade internacional após as consequências do terremoto de 6 de fevereiro, que deixou mais de 50.000 mortos entre a Turquia e a Síria.
Mas no plano diplomático, o grande catalisador foi a reconciliação em março entre a Arábia Saudita, grande potência regional sunita, e o Irã, potência xiita, graças à mediação da China.
Poucos dias depois, em 12 de abril, o chanceler sírio fez uma visita surpresa à Arábia Saudita, a primeira desde o início do conflito.
Fora da Liga Árabe, a Turquia, outro país que expressou grande apoio à oposição anti-Assad desde 2011, também se aproximou de Damasco, com uma reunião entre os ministros turco e sírio da Defesa no fim de 2022 em Moscou.
Os Emirados Árabes, que restabeleceram relações com Damasco em 2018, lideraram a tentativa recente de reintegrar a Síria ao redil árabe. A Síria aprecia “o papel que os Emirados desempenharam na reunificação e melhoria das relações árabes”, disse Assad em telefonema a seu par dos Emirados, o presidente Mohamed bin Zayed Al-Nahyan.
Damasco aposta em uma plena normalização das relações com os países árabes, em particular as ricas monarquias do Golfo, que já foram aliadas da oposição. O governo sírio conta com estas nações para financiar a cara reconstrução do país, devastado por mais de 10 anos de conflito.
Com o tempo e o apoio fundamental da Rússia e do Irã, o regime de Assad conseguiu recuperar a maior parte do território perdido, embora quatro milhões de pessoas continuem vivendo em uma região do noroeste do país sob o controle de grupos rebeldes e jihadistas.
Por outro lado, de acordo com uma investigação publicada pela AFP em novembro, a Síria conseguiu manter o fluxo financeiro graças à exportação de captagon, uma droga que gerou uma indústria ilegal de mais de 10 bilhões de dólares e transformou o país em um narcoestado.