Micael Johansson, CEO da Saab, empresa sueca que atua nas áreas de defesa militar e segurança civil, Micael Johansson tem duas viagens marcadas ao Brasil neste mês, informa João Sorima Neto, do O Globo. Na primeira, que acontece no próximo dia 11, Johansson participa de uma feira de segurança e defesa no Rio de Janeiro. A segunda, no dia 27, tem um significado especial para a Saab e Johansson: ela marca a inauguração da linha de montagem dos caças Gripen no Brasil, em parceria com a Embraer.
A unidade fica na cidade de Gavião Peixoto, interior de São Paulo. Trata-se de uma fase decisiva no processo de transferência de tecnologia acertado com o governo brasileiro desde a compra desses aviões. O contrato, assinado em 2014, prevê a entrega, até 2027, de 36 Gripens por 39 bilhões de coroas suecas (R$ 18,9 bilhões) à Força Aérea Brasileira (FAB).
Os primeiros quatro caças já estão em operação no país. Outros 15 serão montados em solo brasileiro com partes produzidas na unidade de Linköping da Saab, na Suécia, e também da fábrica de aeroestruturas, localizada
em São Bernardo do Campo, na região do ABC Paulista.
Nesse período, mais de 300 técnicos e engenheiros brasileiros participarão de treinamentos teóricos e práticos, na Suécia, a fim de adquirir o conhecimento necessário para fazer as mesmas tarefas no Brasil. “É uma fase muito importante porque, quando se inicia a produção em Gavião Peixoto, consegue-se uma capacidade total daqui para frente. É um grande marco ter a Embraer iniciando a montagem final e os testes da aeronave”, disse Johansson, que assumiu o cargo em 2019.
Este mês começa a montagem dos Gripens no Brasil em parceria com a Embraer. É uma fase decisiva para a transferência de tecnologia?
Micael Johansson – É um grande marco ter a Embraer iniciando a montagem final e os testes da aeronave. Em Gavião Peixoto, já estão funcionando o Centro de Projetos e Desenvolvimento do Gripen (Gripen Design and Development Network) e o Centro de Ensaios em Voo do Gripen (Gripen Test Flight Centre). Quando você inicia a produção em Gavião Peixoto, você consegue uma capacidade total daqui para frente. O ecossistema está pronto.
De onde virão as peças? Parte de São Bernardo do Campo e parte de Linköping, na Suécia?
Micael Johansson – Temos peças de aeroestruturas que vêm da nossa própria empresa, também de São Bernardo do Campo e de outras indústrias que estão apoiando esse processo. Em São Bernardo estão sendo produzidos o cone de cauda, os freios aerodinâmicos, a fuselagem traseira e dianteira para o Gripen. A brasileira AEL produz os três displays avançados de cabine. E haverá apoio da Embraer aqui e em outros países. Olhando o que pode ser feito na América Latina, vejo o Brasil como um hub de atividades daqui para frente.
A unidade de São Bernardo também já é prestadora de serviços? Em quais áreas?
Micael Johansson – A fábrica faz parte da cadeia de fornecimento global da Saab para o Gripen. Lá também está instalado um laboratório de manutenção de equipamentos eletrônicos de alta complexidade. A unidade presta também serviços de manutenção de radares meteorológicos no setor civil e de sensores e equipamentos de guerra eletrônica de aeronaves militares de uma maneira geral. O laboratório foi escolhido para fazer manutenção e reparos de um sistema de autoproteção eletrônica produzido pela Saab e instalado nos helicópteros da Helibras (Marinha, Exército e FAB). O novo negócio já é um desdobramento do programa Gripen Brasileiro e mostra que todo o conhecimento adquirido pode render outros projetos no Brasil e na América Latina.
Como esses centros de design e testes de voo em Gavião Peixoto contribuem para a atuação global da Saab?
Micael Johansson – É uma enorme vantagem ter esses centros em Gavião Peixoto. Normalmente, o teste de voo é uma espécie de gargalo nas operações. Portanto, precisamos dessa capacidade e precisamos de engenheiros, excelentes engenheiros, em outros países como o Brasil também para atualizar continuamente os sistemas (a Saab ainda tem um escritório de suporte e manutenção do Gripen em Anápolis, Goiás).
Quantas aeronaves serão montadas no Brasil?
Micael Johansson – Serão 15 de um total de 36. Eles se concentrarão agora na aeronave monoplace, embora a Embraer e a Saab tenham se envolvido fortemente no projeto e desenvolvimento da versão F do Gripen, com dois lugares. Os demais aviões virão montados da Suécia (quatro já estão no Brasil em testes). E, às vezes, haverá algum tipo de ajuste ou atualização dessas aeronaves por aqui também.
Na América do Sul, a Colômbia mostrou interesse no Gripen. Se a Saab vencer essa concorrência, o Brasil terá participação no fornecimento das aeronaves?
Micael Johansson – Se tivermos sucesso na Colômbia, é claro que quero fazer o máximo possível no Brasil. Isso faz sentido. Ter o Brasil como polo de fabricação das aeronaves para a Colômbia.
A Saab tem uma estratégia de internacionalização, mas países como Canadá e Finlândia (que recentemente ingressou na Otan) optaram pela compra dos caças F-35, americanos, para renovar suas frotas. Qual é o impacto para a Saab?
Micael Johansson – Temos muita capacidade no segmento aeronáutico. E com a Embraer e outras empresas no Brasil, seremos ainda mais fortes. Temos boas chances para negócios futuros trabalhando juntos. Há outros países que podem comprar o Gripen. Colômbia, Peru, mas também Hungria, República Tcheca, Tailândia. O Gripen não é inferior aos caças americanos.
Absolutamente não. Isso (a decisão) é muito sobre política no final, e política de segurança. Fizemos uma oferta muito competitiva, tanto na Finlândia como no Canadá. Mas o Departamento de Estado dos EUA fez sua oferta incluindo políticas de segurança bilaterais. E isso desempenha um grande papel. Portanto, estou convencido de que não perdemos em desempenho ou preço.
O Brasil tem a Embraer, que é um player importante no segmento aeronáutico. Como a colaboração com a Saab
está ajudando a melhorar a cadeia produtiva brasileira?
Micael Johansson – A transferência de tecnologia é importante. São mais de 300 engenheiros e pessoal da Força Aérea passando por treinamento na Suécia. Eles estão voltando, trazendo mais capacidade e dando ainda mais soberania ao Brasil. Estou impressionado com a Embraer porque eles também têm capacidade para aeronaves de transporte, o C390 ou o KC390, o Super Tucano. Então, vejo o Brasil como um parceiro extremamente importante
para a Saab e para a Suécia nessa indústria.
O governo brasileiro havia demonstrado interesse em adquirir um novo lote de Gripens? Há conversas sobre isso?
Micael Johansson – Sim, estamos em discussões iniciais sobre o lote dois e também sobre o acréscimo de mais quatro aeronaves ao lote inicial. Mas não posso dizer que iniciamos discussões contratuais formais. Também estamos conversando sobre uma alteração do contrato existente para garantir que seguiremos claramente o plano de entrega (o prazo final era 2027).
São discussões sobre o financiamento de longo prazo, o que obviamente é importante para este programa. Portanto, não posso dizer exatamente agora se as primeiras 36 aeronaves serão entregues no prazo.