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A primeira-dama, Michelle Bolsonaro durante evento da campanha de Jair Bolsonaro no Piauí - @Damares Alves no Twitter
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sexta-feira 17 de março de 2023 às 16:25h

Efeito Michelle: como o protagonismo feminino pode sustentar o bolsonarismo

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Aposta do PL na ex-primeira-dama deixa nítida a percepção na sigla de que Bolsonaro corre sério risco de ficar inelegível; especialistas veem espaço para papel relevante das mulheres

Fora do Brasil desde o dia 30 de dezembro e ainda sem data para voltar, o ex-presidente Jair Bolsonaro se afastou do PL, que redirecionou conforme reportagem de  Pedro Venceslau e Ana Luiza Antunes, do Estadão, suas expectativas para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Entre aliados de Bolsonaro, é majoritária a avaliação de que o ex-presidente corre sérios riscos de ficar inelegível até 2026 e Michelle se tornou a aposta mais nítida deste grupo político para capitalizar o recall eleitoral alcançado no ano passado. Ela simboliza um protagonismo feminino, associado a um forte elo com o segmento evangélico, que pode ajudar a sustentar o bolsonarismo até a próxima disputa presidencial.

Por ora, líderes do PL dizem que o objetivo principal neste ano será preparar o terreno para as eleições municipais de 2024. A estratégia basicamente consiste em explorar o bolsonarismo sem o próprio Bolsonaro e assim se aproximar do eleitorado feminino, que é o principal foco de resistência ao ex-presidente.

A ideia inicial da sigla comandada pelo ex-deputado Valdemar da Costa Neto era investir pesado no ex-presidente, que receberia um salário robusto, estrutura e equipe para ser o porta-voz da legenda. Hoje, porém, o PL não trata mais deste assunto.

O desgaste com o partido surgiu pela falta de interlocução e se acentuou com o persistente noticiário negativo em torno do ex-presidente. O caso das joias que entraram ilegalmente no Brasil, revelado pelo Estadão, é o mais recente e significativo até agora. A leitura do PL é que Bolsonaro ficará impedido de disputar eleições e sofreu danos irreversíveis em sua imagem pessoal, mas Michelle ainda pode ser blindada.

A ex-primeira-dama vai tomar posse como presidente do PL Mulher no próximo dia 21 em um grande evento no Hípica Hall, em Brasília. A atual titular do posto, deputada Soraya Santos (RJ), irá transmitir com pompa e circunstância um cargo que nunca teve relevância dentro do partido.

Estarão presentes as bancadas do PL no Senado e na Câmara, além de prefeitos, governadores e outros caciques regionais. Depois do ato, os homens serão convidados a se retirar e permanecerão no local do evento apenas as mulheres, entre elas Damares Alves (Republicanos) e Tereza Cristina (PP), outras duas referências para o protagonismo feminino no bolsonarismo.

Bolsonaro não estará presente e não há previsão de que ele apareça em videoconferência ou viva voz. Se o ex-presidente, classificado como “imprevisível” por aliados, fizer questão, ele pode participar virtualmente. Na prática, contudo, a torcida reservada no PL é para que isso não aconteça.

Visita em Orlando

Apesar do vídeo publicado nesta quarta-feira nas redes sociais, no qual Michelle aparece ao lado de Bolsonaro e o beija em um evento em Orlando, os dois contam com estruturas próprias atualmente.

Segundo pessoas próximas ao ex-presidente, há ressentimento no clã em relação a atenção que o PL está dispensando à ex-primeira-dama e a falta de combatividade na defesa pública de Bolsonaro – que convocou o ex-secretário de Comunicação Social Fabio Wajngarten para assessorá-lo.

Segundo especialistas, após derrota do ex-presidente nas eleições de 2022, as mulheres têm potencial para assumir o espólio desse setor político. “Se eu puder fazer uma aposta, eu apostaria na figura de uma mulher”, disse Isabela Kalil, coordenadora do Observatório da Extrema Direita, em debate promovido pela Fundação Fernando Henrique Cardoso, na manhã de quarta-feira, 15. “Uma mulher pode ter muitos ganhos políticos neste campo”, afirmou.

No entanto, Kalil pontua que esta figura pode se concentrar tanto em uma mulher que tenha pautas mais conservadoras, como a ex-primeira-dama, ou em mulheres com pautas armamentistas, como a deputada Carla Zambelli (PL). Segundo ela, mesmo antes da derrota de Bolsonaro, o nome da senadora Damares Alves (Republicanos) chegou a ser cotado como uma possível substituta do ex-presidente.

Segundo Jacqueline Teixeira, antropóloga e professora do Departamento de Sociologia da UnB, nomes como o de Michelle e Damares atraem o eleitorado evangélico devido a trajetória de ambas. “A Damares é alguém que vem de uma posição institucional dentro do pentecostalismo”, cita.

Para a antropóloga, o que foi decisivo para que Bolsonaro e sua equipe, no final de 2018, escolhessem o nome de Damares integrar o governo foi essa forte ligação com a Igreja. “Ela era muito conhecida em vários cantos do País como alguém que produzia projetos voltados para proteção da violência em relação às crianças (…) Algo que engaja muito essas mulheres é a necessidade de pensar a proteção do filho”, esclarece.

Já Michelle apresenta uma trajetória diferente, segundo a especialista. “Nós estamos falando de alguém que engravidou muito cedo, que é mãe solo, que lidou com encarceramento de várias pessoas importantes da família e que encontra na Igreja uma possibilidade de apoio e mudança”, avalia. “Quando Michelle desponta no cenário nacional, ela tem essa possibilidade de indexar na própria imagem a trajetória de grande parte desse perfil de mulheres evangélicas.”

Jacqueline enfatiza ainda que a figura de Michelle foi importante para construir, amenizar e possibilitar a aceitação de várias dimensões da imagem do próprio Bolsonaro. “É nesse sentido que a Michelle foi tão importante no pleito de 2022, exatamente porque ela construía essa possibilidade de que votar no Bolsonaro, seria votar nela.”

Maurício Moura, conselheiro do Instituto IDEIA e pesquisador da George Washington University, avaliou que a aderência de Michelle com o eleitorado de Bolsonaro é muito mais assertiva. “O grau de aprovação e aceitação vai além das pessoas que votaram em Bolsonaro”, comentou. Segundo ele, esse movimento em escalar uma figura do bolsonarismo só é possível porque, mesmo sem Bolsonaro, o partido e as personalidades se mantêm competitivos.

Em pesquisa que irá contemplar seu próximo livro, analisando o motivo da derrota eleitoral de Bolsonaro, Moura mostra que o bolsonarismo continua se fortalecendo mesmo em um cenário de possível inelegibilidade do ex-presidente. Dentre os que votaram em Bolsonaro no segundo turno do ano passado, a segunda opção para este eleitorado se concentra, pela ordem, em Tarcísio de Freitas (Republicanos), seguido por Romeu Zema (Novo) e Michelle Bolsonaro para ocupar a liderança deste segmento político.

“Michelle Bolsonaro é a mais grata revelação do Partido Liberal. Ela é mãe, esposa e representa a mulher no sentido mais completo da palavra”, disse o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, ao Estadão. “Por isso convidamos Michelle para presidir o PL Mulher e estimular as mulheres de todo o país a participarem cada vez mais da política e da vida partidária.”

A estratégia é manter a ex-primeira-dama sob os holofotes. “Quando (Michelle) começou a se manifestar e mostrou ser uma mulher culta, preparada, sensível e comprometida com valores caros à sociedade, ela passou a ser admirada e respeitada não só como primeira-dama, mas como uma liderança”, reiterou o deputado federal Domingos Sávio (PL).

Segundo o parlamentar, será natural que Michelle consolide essa liderança política e que possa a vir a materializar, no futuro, uma candidatura. “Se isso ocorrer ou não, passa pelas circunstâncias da época e das decisões pessoais dela (…) Michelle é uma pessoa que tem carisma e potencial para também pensar em eleições majoritárias”, destacou.

Na última quinta-feira, dia 16, a coluna Painel, publicada na Folha de S.Paulo, informou que a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) vai assumir a presidência do Republicanos Mulher com o objetivo de atrair a filiação de mulheres para a sigla. Para isso, ela deve viajar o País.

Inelegibilidade

No entorno de Jair Bolsonaro já se discute uma eventual inelegibilidade do ex-presidente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Durante evento em Orlando, na noite de terça-feira, 14, ele mesmo admitiu a possibilidade de ficar inelegível até as eleições de 2026. “Existe a possibilidade de inelegibilidade sim, mas a questão de prisão só se for arbitrariedade”, afirmou o ex-presidente que, na ocasião, ainda afirmou que não participou de nenhum ato antidemocrático – em referência ao 8 de janeiro – e que respeitou os apoiadores em frente ao quartel “por ser um direito deles” em permanecer no local.

Em um contexto com a participação de Bolsonaro na corrida eleitoral, a pesquisa elaborada por Moura ainda aponta que 41% dos entrevistados afirmou que votaria novamente no ex-presidente. A percepção é ainda reiterada quando 61% dos entrevistados, eleitores de Bolsonaro, acredita que houve fraude nas eleições de 2022.

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