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sexta-feira 3 de março de 2023 às 05:56h

Lira e Pacheco travam queda de braço sobre rito de tramitação de medidas provisórias

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O Congresso retomou os trabalhos em meio a uma queda de braço entre os presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pelo rito das Medidas Provisórias (MPs). Ao menos 20 delas aguardam para ser debatidas e votadas nos próximos meses, enquanto os dois travam uma disputa por poder nos bastidores — impasse que pode atrapalhar os planos do governo. Entre as medidas que entrarão em pauta estão temas considerados fundamentais e urgentes pelo Palácio do Planalto, como a recriação da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), extinta pela gestão Lula por meio de uma MP, e a composição ministerial atual. As informações Bruno Góes, Gabriel Sabóia e Jussara Soares

O andamento destes temas, entretanto, é motivo de mal-estar entre Lira e Pacheco desde o dia 7 de fevereiro, quando o presidente do Senado assinou um ato para revogar o modelo adotado no início da pandemia da Covid-19, em 2020. Com o passar das semanas e o aumento das articulações do governo para aprovar as propostas de seu interesse, as divergências sobre a tramitação se intensificaram.

Atualmente, as MPs são analisadas primeiro pelos deputados e depois vão ao Senado. A ideia dos senadores é retomar o modelo anterior, quando um colegiado composto por integrantes das duas Casas era o primeiro a se debruçar sobre os textos. Na prática, na pandemia, o poder ficou concentrado com os deputados, que tinham mais tempo para analisar os projetos, garantindo a Lira o controle da pauta. Ao propor a volta das comissões mistas, conforme previsto na Constituição, o Senado tenta retomar o protagonismo.

Senadores reclamam que as MPs passaram a chegar com o prazo curto na Casa, com todas as propostas de emendas já feitas na Câmara, cabendo ao Senado só o papel de referendar a decisão. Por isso, um grupo de senadores apresentará a Pacheco uma questão de ordem pedindo a volta imediata do antigo modelo.

Na prática, os senadores querem que as comissões mistas sejam retomadas imediatamente, enquanto deputados querem que as MPs que já estão editadas sigam no rito adotado na pandemia. Para restabelecer o antigo procedimento, entretanto, é necessário que uma sessão do Congresso seja convocada e, desta forma, aliados de Pacheco temem que Lira protele a convocação para ganhar tempo e manter protagonismo sobre as MPs.

Aliados mais contundentes do presidente da Câmara, que temem perder o poder de barganha junto ao governo, defendem que o tema seja levado à Justiça, já que o modelo foi adotado a partir da declaração da pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e, segundo este argumento, só poderia ser revogado com a suspensão do cenário pela mesma entidade. Como há o entendimento de que a Câmara perderá poder, caso o atual esquema seja modificado, líderes do Centrão pressionam Pacheco para que chegue a um entendimento com Lira.

No último dia 7, ao saber que o atual rito poderia ser modificado por meio de um ato de Pacheco, Lira reagiu e disse não ter sido previamente consultado. Entretanto, como ele não tem prazo para colocar a minuta preparada pelos senadores para ser apreciada pela Mesa da Câmara, senadores também acenam com a possibilidade de judicialização para que a análise das MPs volte ao processo anterior à pandemia.

— Na primeira reunião da Mesa (do Senado), fizemos a minuta do ato conjunto para retomar a tramitação das MPs como era antes da pandemia. Tenho certeza que Pacheco e Lira conversarão, e isso será superado — disse o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), primeiro vice-presidente da Casa.

Hoje, há iniciativas relevantes do governo que foram feitas via Medida Provisória, como a que retira o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Banco Central e o transfere para o Ministério da Fazenda, e a que muda o voto de desempate do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) para favorecer a Receita — a recriação de ministérios e a extinção da Funasa também foram feitas por MPs. O instrumento tem validade imediata a partir da data de publicação, mas precisa ser confirmado pelo Congresso em até quatro meses. Com a queda de braço em curso, o Planalto defende que as MPs já editadas sejam analisadas pelo rito que está estabelecido desde a pandemia, evitando um impasse maior.

Divergências anteriores

Em outros momentos, Lira e Pacheco também tiveram posicionamentos divergentes. Em 2021, após a Câmara aprovar um texto de reforma política prevendo o retorno das coligações em eleições proporcionais, o que favorece a multiplicação de siglas de aluguel, Pacheco chamou a medida de “retrocesso” — este item foi rejeitado pelo Senado.

Outra queda de braço ocorreu durante um projeto que mexia no Imposto de Renda. Lira disse que a Câmara estava “cumprindo o papel” em relação às pautas econômicas e cobrou uma atuação mais firme da Casa vizinha: “O Senado precisa se posicionar também”.

Pacheco retrucou afirmando que havia uma série de projetos aprovados no Senado aguardando a análise dos deputados. “Nem por isso eu digo que a Câmara está deixando de cumprir o seu papel”, pontuou o senador.

Exemplos de MPs em tramitação no Congresso

  • MP 1.154

Estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios. Com a posse de Lula, o novo governo reorganizou o organograma, criando 37 pastas, 60% a mais do que a gestão Bolsonaro. Desmembrou, por exemplo, o ministério da Economia em três (Fazenda, Planejamento e Orçamento) e criou o dos Povos Indígenas.

  • MP 1.156

Extingue a Fundação Nacional de Saúde. O governo decidiu acabar com o órgão sob o argumento de melhorar a gestão, mas esbarrou nos interesses de parlamentares. Eles veem na entidade um ativo eleitoral por conta das obras de saneamento que ficam sob o seu guarda-chuva e que podem beneficiar seus redutos eleitorais.

  • MP 1.158

Devolve o Coaf ao Ministério da Fazenda. Hoje o órgão, que atua principalmente na prevenção e no combate à lavagem de dinheiro está sob o guarda-chuva do Banco Central. No início do governo Bolsonaro, o Coaf tinha saído da Fazenda e ido para o Ministério da Justiça. Depois, voltou para a Economia e, por fim, chegou ao BC.

  • MP 1.160

Instrumento decide que membros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) podem desempatar votações a favor da União; antes outra MP havia estabelecido que os empates seriam decididos a favor do contribuinte. O Carf tem a atribuição de julgar litígios em matéria tributária e aduaneira.

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