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sexta-feira 27 de janeiro de 2023 às 14:27h

Quanto custa tirar 2 bilhões de pessoas da extrema pobreza: 5% de imposto aos super-ricos

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As cenas aterrorizantes de crianças e idosos yanomamis em condições degradantes de pele e osso, que se assemelham às imagens do holocausto judeu na Segunda Guerra, correram o mundo nas últimas semanas e despertaram segundo Jaqueline Mendes, da revista IstoÉ, entre os seres pensantes — enquanto a ala acéfala dissemina em redes sociais piadas sobre picanha e cervejinha — o debate sobre a realidade da fome e da miséria. A questão da pobreza, que não se limita aos povos indígenas, não é uma equação simplista, mas é possível rever um resultado negativo, segundo o estudo “A Sobrevivência do mais rico — por que é preciso tributar os super-ricos agora para combater as desigualdades”, da organização não governamental Oxfam. Proposta: bastaria aumentar em 5% os impostos dos super-ricos (patrimônio acima de US$ 50 milhões) para levantar US$ 1,7 trilhão e tirar 2 bilhões de pessoas da extrema pobreza em todo o planeta. O estudo foi apresentado recentemente pela Oxfam no Fórum Econômico Mundial, em Davos.

Embora não tenha a pretensão de se criar uma política global antifome, já que cada país define suas políticas públicas de transferência de renda, o levantamento joga luz a um dos maiores desafios do capitalismo global, segundo Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil. “Taxar os super-ricos é uma pré-condição estratégica para reduzir as desigualdades e fortalecer a democracia.” Para isso, a especialista vê a atual crise brasileira como potencial motor de mudança. “O Brasil enfrenta uma das maiores contrações orçamentárias da sua história. É fundamental que aqueles que vêm sendo privilegiados há anos passem a dar sua contribuição e assumam a sua responsabilidade na sociedade.”

Divulgação

“Taxar os super-ricos é uma pré-condição estratégica para reduzir as desigualdades e fortalecer a democracia” Katia Maia Diretora Executiva da Oxfam Brasil.

Desde 2020, segundo a Oxfam, 1% dos mais ricos da população mundial amealhou quase dois terços de toda a nova riqueza — seis vezes mais do que os 7 bilhões de pessoas que compõem os 90% mais pobres da humanidade. As fortunas bilionárias estão aumentando em US$ 2,7 bilhões por dia, mesmo com a inflação superando os salários de, pelo menos, 1,7 bilhão de trabalhadores, mais do que a população da Índia, o segundo país mais populoso do mundo, depois da China. As empresas de alimentos e de energia mais do que dobraram seus lucros em 2022, pagando US$ 257 bilhões a acionistas ricos, enquanto mais de 800 milhões de pessoas foram dormir com fome.

Esses números impressionam, mas existem ainda mais. Apenas US$ 0,4 (sim, quatro centavos da moeda americana) de cada dólar de receita tributária vêm de impostos sobre o patrimônio, e metade dos bilionários do mundo vive em países sem imposto sobre herança, aplicado ao dinheiro que dão aos filhos. “As pessoas comuns fazem sacrifícios diários para sobreviver, enquanto os super-ricos lucram cada vez mais”, disse Katia. “Os últimos dois anos estão entre os melhores da história para os bilionários. É um acinte!”

Tributação

No caso do Brasil, a Oxfam lembra que a alíquota do Imposto de Renda para os mais ricos, de 27,5%, é menor do que nos países mais desenvolvidos. Essa taxação incide sobre quem ganha mais de R$ 4.664,68 por mês. Isso se traduz em uma alíquota muito baixa para os super-ricos, em um país com altos níveis de desigualdade econômica e mais bilionários do que qualquer outro na América Latina. Dados de 2019 mostram que, nos EUA, as alíquotas variam de 10% a 37%. Em Portugal, a tabela traz variação de 14,5% a 48%, e na Argentina, de 5% a 35%. Na Alemanha, quanto mais alta é a renda, maior é a alíquota de imposto. A alíquota máxima é de 47,5%. Na China, é de 45%. Já a Suécia lidera entre os países com a maior alíquota máxima de imposto de renda: 61,85%.

Além disso, a Oxfam também lembra que abatimentos, deduções e mecanismos de crédito tributário “injustos” beneficiam “quem está nas faixas superiores de renda”, e sugere que sejam “descartados”. No Brasil, há abatimentos para saúde e educação no IR. Outro ponto é que a taxação do IR não abrange boa parte dos rendimentos, pois, no caso de empresas, a distribuição de lucros e dividendos para pessoas físicas é isenta no país — algo que acontece desde 1996.

Na avaliação do economista Alexandre Sampaio Ferraz, doutor em ciência política e consultor do Dieese, a proposta de tributação dos mais ricos é impopular, mas necessária para equacionar o problema do contraste social. “Apesar de representar uma parte menor da arrecadação, o imposto sobre herança tem grande importância no combate à desigualdade e na melhora das finanças públicas”, afirmou, em artigo no Nexo. “Fica a dica para o governo que assumiu em 2023: contra a herança maldita, a taxação da bendita herança.”

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