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sexta-feira 27 de janeiro de 2023 às 06:35h

Entenda a lei sobre nomeações de parentes como as que envolveram Tarcísio e Raquel Lyra

NOTÍCIAS, POLÍTICA


A nomeação de parentes em diferentes graus para cargos públicos (prática conhecida como nepotismo) é regulada pela legislação brasileira, mas há áreas cinzentas e formas de burlar as restrições jurídicas.

Segundo reportagem de Matheus Tupina, na Folha, esse tema ganhou evidência neste ano com cinco governadores preenchendo cargos de confiança com familiares —casos de Paulo Dantas (MDB), em Alagoas; Fábio Mitidieri (PSD), em Sergipe; Marcos Rocha (União Brasil), em Rondônia; Antônio Denarium (PP), em Roraima; e Raquel Lyra (PSDB), em Pernambuco.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), chegou a nomear um cunhado para sua gestão, mas depois recuou. Os demais governadores argumentam que as nomeações responderam a critérios técnicos e não são irregulares, já que os cargos são considerados de natureza política.

Entenda o que diz a lei sobre o nepotismo:

O QUE É NEPOTISMO E O QUE DIZ A LEGISLAÇÃO SOBRE O ASSUNTO?

O nepotismo, termo usado para definir o uso de um cargo, por um agente público, para nomear ou favorecer parentes, é proibido por lei desde 1990, quando foi vedada a indicação para cargos ou funções de confiança de cônjuge, companheiro ou parente até o segundo grau.

No direito brasileiro, a linha familiar tem duas formas de visualização —vertical, olhando para os ascendentes, como pais, avós e bisavós, e horizontal, composta por irmãos, tios e sobrinho, por exemplo. Há também o grau de afinidade, considerando o cônjuge e seus parentes, ou então padrastos, madrastas e enteados.

O texto, porém, é genérico, e precisou ser definido mais estritamente pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que o fez pela súmula vinculante de número 13, de 2008.

Segundo Matheus Herren, advogado e professor de direito na PUC-SP, mesmo que a nomeação de parentes não esteja coberta pelo aparato jurídico já existente, a prática pode levar à responsabilização de quem indicou o familiar ao cargo por improbidade administrativa.

QUAL FOI O ENTENDIMENTO DO STF?

O tribunal ampliou o grau de parentesco até o terceiro grau tanto na vertical quando na horizontal, incluindo também a afinidade.

A legislação foi interpretada pelo Supremo como nacional, ou seja, vigente para a União, os estados e os municípios. Isso significa que a regra vale tanto para o presidente da República, quanto para governadores e prefeitos.

Também houve a interpretação do princípio da eficiência da administração pública quando há casos de nepotismo —além de ferir o princípio da impessoalidade, se a pessoa não for qualificada para o exercício do cargo, fere-se também a eficiência, outro fator-base para o funcionalismo público, segundo a Constituição.

Os princípios de legalidade e moralidade, também na Carta Magna, serão da mesma forma feridos, segundo a Corte, já que a indicação de familiares é ilegal.

EXISTEM OUTRAS REGULAMENTAÇÕES DO ASSUNTO?

Ainda há outras resoluções e leis sobre o assunto, para órgãos como o Ministério Público e para os servidores do Judiciário, em resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Em 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) editou decreto estendendo o entendimento do Supremo para toda a administração pública, direta e indireta.

QUAIS AS FORMAS POR VEZES USADAS DE CONTORNAR AS RESTRIÇÕES JURÍDICAS?

Ainda há algumas questões que ficam a largo da legislação e jurisprudência, como o nepotismo cruzado, quando o agente público nomeia o parente de outro servidor, e este servidor nomeia um parente do primeiro agente.

Também há a tese que diferencia cargos públicos de natureza técnica e de natureza política —enquanto o primeiro é criado por lei e compõe escalas inferiores da hierarquia administrativa, o segundo figura na Constituição e visa compor escalões superiores, como chefia de secretarias, planejando as ações de governo e auxiliando os chefes dos Poderes.

Apesar de não haver uma decisão estrita sobre esses dois tipos de cargos, o Supremo tem validado a interpretação e decidido favoravelmente a algumas indicações de familiares —em 2009, por exemplo, a corte decidiu pela nomeação de Ivo Gomes, irmão do então governador do Ceará Cid Gomes (PDT), à chefia de gabinete.

HÁ ALGO EM CURSO PARA REGULAR MELHOR O TEMA?

Há um recurso interpelado no STF contra a inconstitucionalidade de uma lei sancionada em Tupã, cidade a 514 km da capital paulista. O texto não considerava a nomeação de parentes para cargos de natureza política como nepotismo.

A Corte decidiu que o caso terá repercussão geral, ou seja, servirá de parâmetro para julgamentos futuros do mesmo tema, e consolidará a interpretação da corte sobre a natureza das funções públicas.

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QUAIS OS DESAFIOS QUE O NEPOTISMO IMPÕE À POLÍTICA?

O professor de direito administrativo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Onofre Alves Batista Jr. diz que o favorecimento de familiares não é problema exclusivo do Brasil, mas que é difícil enfrentar um problema moral com a legislação regulando de forma rígida uma questão fluída, com várias nuances políticas e sociais.

Batista Jr. cita também a necessidade de se criar exceções quando há competência do parente indicado para exercer a função, visualizando melhor o caso concreto para evitar, por exemplo, o cruzamento de benefícios entre famílias influentes na administração, como as de políticos, juízes, entre outros.

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