O Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) acaba de recomendar à Prefeitura Municipal de Salvador que, até às 18h de hoje (1º), retire de circulação ou, alternativamente (considerando a exiguidade do tempo e custos ao erário), complemente as peças publicitárias impressas de divulgação da manifestação cultural e religiosa que acontece amanhã, dia 2, com a denominação ‘Festa de Yemanjá’. O Município também foi orientado a corrigir o material publicitário digital relativo à festa incluindo o mesmo título e a realizar ampla exposição nos veículos de comunicação. Este ano, a Prefeitura de Salvador omitiu o nome de Yemanjá na divulgação e alterou o nome para ‘Festa 2 de Fevereiro’. A modificação, explica a promotora de Justiça Lívia Vaz, desconsidera dispositivos legais e princípios constitucionais.
Segundo a promotora de Justiça, a festa é assim denominada em virtude de sua origem associada ao candomblé. Sendo assim, o desvirtuamento ofende a integridade dos legados cultural e identitário dos povos de terreiros de religiões afro-brasileiras, gerando prejuízos à preservação e à valorização do patrimônio cultural e histórico, constitucionalmente reconhecido. “Cabe ao poder público, portanto, preservar e garantir a integridade, respeitabilidade e a permanência dos valores da tradicional manifestação cultural e religiosa”, afirma ela. Coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e Combate à Discriminação (GEDHDIS), Lívia Vaz destaca que a Constituição Federal dispõe que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. Além disso, “o Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional”. Além da Constituição Federal, a recomendação se fundamentou no Estatuto da Igualdade Racial de âmbito nacional, no Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa do Estado da Bahia e na Lei Orgânica do Município de Salvador.
A lei que institui o Estatuto em âmbito nacional determina que “o Estado garantirá o reconhecimento das manifestações culturais preservadas pelas sociedades negras, blocos afro, irmandades, clubes e outras formas de expressão cultural coletiva da população negra, com trajetória histórica comprovada, como patrimônio histórico e cultural”. Além disso, o Estatuto da Igualdade Racial do Estado da Bahia dispõe que “a produção veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a herança cultural e a participação da população negra na história do País” e que “é dever do Estado preservar e garantir a integridade, a respeitabilidade e a permanência dos valores das religiões afro-brasileiras”.
A própria Lei Orgânica do Município de Salvador define como princípio da organização municipal “a preservação dos valores e da história da população, fundamentada no reconhecimento e assimilação da pluralidade étnica, cultural e religiosa, peculiares à sua formação”. A ‘Festa de Yemanjá’ é considerada inclusive festa popular no calendário oficial do Município, conforme a Lei Municipal nº 4.390/1991. Baseada em todas essas normas, Lívia Vaz lembra que “a tradicional ‘Festa de Yemanjá’, celebrada anualmente no dia 2 de fevereiro, no bairro do Rio Vermelho, configura-se como manifestação cultural e religiosa afro-brasileira, com comprovada trajetória histórica, devendo, por isso, ser reconhecida como patrimônio histórico e cultural”.