Independentemente de quem vencer a eleição presidencial, é pacificado que a regra que segura os gastos públicos será revista. Ao todo, entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), são quatro propostas, com um denominador comum: permitir o crescimento das despesas acima da inflação, o que hoje é proibido. No que se diferem, segundo o jornal Estado de S. Paulo, a equipe de Bolsonaro trabalha para atrelar a nova regra ao endividamento, enquanto a de Lula estuda retomar o superávit primário como o balizador das contas públicas.
Na agenda econômica, a definição da nova âncora fiscal em substituição ao teto de gastos é tema central e alvo da atenção dos agentes econômicos pelo impacto na definição das políticas públicas e dos programas.
Quem for eleito terá de mudar a Constituição. E para isso precisará do apoio do Congresso a uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O Estadão procurou as duas campanhas para obter informações oficiais sobre os planos para o novo arcabouço fiscal e não obteve resposta. A reportagem conversou com integrantes da equipe econômica de Bolsonaro e da campanha de Lula para aprofundar os rumos das discussões (veja no quadro detalhes de cada proposta).
A discussão nas equipes
No time do ministro da Economia, Paulo Guedes, os técnicos do Tesouro Nacional apresentaram internamente uma proposta e a Secretaria de Política Econômica (SPE) antecipou detalhes do seu modelo em evento não oficial. As duas abrem espaço para ampliar gastos em 2023 já contratados, como o Auxílio Brasil de R$ 600, mas mantêm um controle do endividamento por meio de regra de despesa.
O desenho da nova regra do Tesouro é mais rígido. Já a regra desenhada pela SPE é adaptada à estratégia de Guedes de vincular o arcabouço fiscal às privatizações e aos desinvestimentos das estatais.
Do lado da campanha de Lula, uma ala não vê necessidade de nova regra para limitar gastos, já que a responsabilidade fiscal estaria centrada no regime de superávits primários (receitas menos despesas sem levar em conta os gastos com juros). Outro grupo defende a combinação de regra de gasto com crescimento real e meta de primário flexível para acomodar o limite de gasto mesmo com receita frustrada.
A visão de economistas
Após o teto ter sido furado várias vezes desde que entrou em vigor, em 2017, economistas de fora das duas campanhas têm defendido regras mais simples.
Em entrevista ao Estadão, depois de declarar apoio a Lula, o economista Pérsio Arida defendeu uma regra simples. “Superávit primário, dívida pública são variáveis que dependem de muitos outros fatores. Acho muito ruim prescindir de qualquer regra de controle de gasto”, disse Arida, que defendeu em documento com outros cinco colegas um programa de gastos de R$ 100 bilhões por ano fora do teto até que seja definida uma regra fiscal.
Secretário de Fazenda de São Paulo, Felipe Salto avalia que a melhor regra fiscal deve combinar simplicidade, aprendizado com as experiências passadas e algum grau de “contraciclicalidade”. Ou seja, uma regra que permita o aumento de gastos em momentos de queda da atividade econômica.
O economista Nilson Teixeira, sócio da Macro Capital Gestão de Recursos, propõe a volta da regra de metas plurianuais de superávit primário, convergindo para superávit primário de 2,5% do PIB em 2026 e limites para a expansão de despesas, como salários do funcionalismo, gastos com a Previdência, entre outros.
“O debate sobre o novo regime fiscal tem sido malconduzido, como se a discordância fosse com a existência de um teto para o gasto, quando a real divergência sempre foi com a imposição de uma regra tão rígida que reduziria muito drasticamente os investimentos e inevitavelmente acabaria tendo de ser revista depois de alguns anos”, diz o economista Sergio Gobetti, que estuda os modelos de regras fiscais em outros países e defende regras fiscais semelhantes à União Europeia, onde os resultados fiscais podem variar com o ciclo econômico e a despesa é limitada a crescer não mais do que o PIB de longo prazo.