Seja quem for o vencedor, o Brasil que emergirá das urnas no dia 30 de outubro próximo, será um país profunda e perigosamente dividido, como nunca ocorreu ao longo de nossa curta e periclitante história, em que ainda não acertamos o passo, na direção de um patamar civilizatório, minimamente compatível com nossas grandes possibilidades. Pensamos, mesmo, que, levando-se em conta o potencial dos povos, a partir do conjunto dos fatores naturais que lhe conferem competitividade geoeconômica, o Brasil seja o país de mais pobre desempenho, figurando Israel na liderança do mérito, avaliado por esse mesmo diapasão.
Não obstante a geral aceitação de que devemos ser uma República Democrática, importa acentuar o que caracteriza cada uma dessas dimensões. Enquanto a República prioriza a proteção dos indivíduos contra os excessos do poder do Estado, a Democracia busca as segurar a participação de todos na estrutura desse poder, de modo a fortalecê-lo, como queria Alexis de Tocqueville, ao sustentar: “Não acredito que a natureza de um poder democrático consista em sua falta de força e de recursos; penso, ao contrário, que a causa de seu fracasso seja o abuso no uso de suas forças e a má aplicação de seus recursos. A anarquia quase sempre resulta da tirania e da incompetência, e não da impotência. Nas repúblicas democráticas, o poder dirigente tem sua instabilidade derivada da mudança de comando e de rumos a serem seguidos. Onde quer que se instale, a força da democracia é predominantemente insuperável”.
Nossa Constituição confere a cada um de todos os cidadãos, no mais completo plano de igualdade, entre o mais modesto e o mais poderoso, a possibilidade concreta de participar do mais importante processo decisório, que é a eleição dos dirigentes da sociedade em cada um dos seus domínios, figurando a Presidência da República na curul dessas decisões coletivas. Esse é o elemento que confere inegável superioridade ontológica à sociedade aberta, chancelada pela experiência acumulada dos povos, alternativa confiável e preferível ao cassandrismo de filósofos e historiadores que, em muitos casos, conduziu a humanidade ao desespero e à morte, como foi o caso da bem intencionada proposição de Marx e Engels que resultou no genocídio de 139 milhões de pessoas, na Rússia e na China, segundo o historiador Orlando Figes, no seu livro Revolutionary Russia, 1891-1991. O fanatismo religioso na infalibilidade do marxismo conduziu aos maiores traumas da experiência humana. Apesar dos centros mais avançados considerarem o marxismo como uma ideologia que não funciona, pertencendo, portanto, ao patrimônio da história do pensamento, um pequeno percentual de ativos fanáticos continua atuando como se o comunismo estivesse ali na esquina, como observou Karl Mannheim no clássico Ideologia e Utopia.
Fugir a esse supremo dever-direito de escolher os seus dirigentes, portanto, corresponde a suicidar a própria cidadania.
Em apertada síntese, pensamos que a sociedade brasileira esteja dividida em três grandes segmentos: um terço composto por uma esquerda atrasada e intolerante, integrada por ingênuos, ignorantes e aproveitadores; um terço representado por uma extrema direita, tão intolerante quanto a extrema esquerda e, finalmente, o terceiro terço representado pelo centro democrático, integrado pela esquerda e a direita democráticas, que decidem acima das paixões, motivadas para alcançar o bem do Brasil. Presidirá o País, nos próximos quatro anos, o candidato que obtiver a maioria desse lúcido centro democrático que sofre ao ser convocado para fazer a escolha de Sofia, entre um candidato que, não obstante realizar um bom governo, com frequência, fala quando deveria manter-se calado, e outro que traiu a confiança popular, liderando o maior assalto aos cofres públicos de que se tem memória, tendo sido, por isso, condenado a cumprir pena, no mais público e famoso processo penal da história do Brasil.
O caminho da sensatez a seguir é: os vencedores evitarem provocações; os perdedores aguardarem o próximo pleito. Todos, porém, irmanados no propósito comum de ajudar o Brasil a superar sua medíocre trajetória histórica.
*Joaci Góes, advogado, jornalista, empresário, ex-deputado federal constituinte e presidente do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia (IGHB).