Na tentativa de oxigenar sua campanha à reeleição e cicatrizar os danos da trágica gestão da saúde no início da pandemia, o presidente Jair Bolsonaro torce para virar o jogo no Supremo Tribunal Federal (STF) e emplacar o piso salarial para profissionais de enfermagem. O governo quer definir em R$ 4.750 a remuneração base da categoria, sendo 70% desse valor para técnicos de enfermagem e 50% para auxiliares e parteiras. Assim, conforme Jaqueline Mendes, da IstoÉ, Bolsonaro pode ampliar sua base de eleitores e buscará o simbólico perdão à classe que esteve na linha de frente do combate à Covid-19 enquanto o presidente chamava a doença de gripezinha, negava a gravidade da pandemia, boicotava vacinas e ironizava as mortes. Os enfermeiros se tornam, de certa forma, o terceiro grupo de trabalhadores — depois de caminhoneiros e motoristas de táxi — a receber a graça presidencial às vésperas do primeiro turno das eleições.
Nos bastidores de Brasília há a expectativa de que os ministros do STF definam o parecer sobre o tema nos próximos dias. Até o fechamento desta edição, na tarde da quinta-feira (15), o placar estava em 5 a 3 pela suspensão do piso — faltavam três votos. Pelas regras de julgamento no plenário virtual, os ministros devem publicar seus votos até o horário final do último dia, prazo que venceu na sexta (16), mas eles também podem alterar o voto ou solicitar a interrupção do julgamento.
Na Corte, o tema se tornou quase uma disputa pessoal entre a dupla Nunes Marques e André Mendonça, o amigo “terrivelmente evangélico” da família Bolsonaro, e o terrivelmente antiJair, Luis Roberto Barroso. “A demanda de um piso é muito justa, mas seria muito difícil tirar do papel sem fonte de custeio”, disse Barroso. “Estou empenhado em viabilizar a concretização desse piso.” Para Mendonça, há indícios de contaminação política na decisão. “É preciso que se verifique a conveniência política da suspensão [do piso].”
DECISÃO SUPREMA Oito ministros haviam votado até quinta-feira: Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia seguiram o posicionamento do relator, o ministro Barroso, e são contra a implantação do piso para enfermeiros até que seja esclarecido o impacto da lei nas contas de estados, municípios e hospitais privados. A divergência contra o voto de Barroso foi aberta por André Mendonça, seguido por Nunes Marques e Edson Fachin. Ainda faltavam votar os ministros Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux.