A ministra Rosa Weber vai tomar posse hoje como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) atenta à temperatura política do país e inclinada a manter sob seus cuidados casos que considera caros. Entre eles estão o processo que questiona o indulto concedido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) e a ação que contesta a legalidade do orçamento secreto, o instrumento pouco transparente de repasses de verbas de União a parlamentares. A ministra não pretende levar à pauta nenhum tema sensível até o fim das eleições. Ela chega ao comando da Corte a 20 dias do pleito e, como se aposentará em outubro ano ano que vem, só poderá cumprir pouco mais da metade do biênio de mandato.
O jornal O Globo apurou que Rosa avalia uma estratégia para manter sob sua relatoria esses dois processos, além do que questiona a proposta de emenda à Constituição que permitiu ao governo flexibilizar o teto de gastos e do que discute a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez. De acordo com as regras internas do tribunal, contudo, o ministro que assume a presidência não pode relatar ações e, automaticamente, todo o seu acervo é transferido ao colega que está deixando o comando da Corte; nesse caso, Luiz Fux. Antes de tomar posse, porém, Rosa deve liberar ao menos parte desses casos à pauta de julgamentos, etapa a partir da qual não é mais possível a troca de relator. Dessa forma, a ministra continuaria responsável pelas ações.
Responsável por determinar quais processos devem ser analisados pelo plenário em cada sessão, a nova presidente está decidida a controlar a agenda de julgamentos de acordo com o que ocorre também da porta do Supremo para fora. Ela pretende adotar uma metodologia pouco comum para elaborar o calendário de votações. A lista de julgamentos, normalmente divulgada para todo o semestre, deverá ser definida semanalmente, com o objetivo de não perder o pulso do mundo político. O STF é alvo constantes ataques por parte de Bolsonaro (PL) desde que ele assumiu a Presidência da República.
Já em sua primeira semana de gestão, a ministra irá pautar o julgamento, na quarta-feira, duas ações que questionam o compartilhamento de dados na administração pública federal, assim como a criação do Cadastro Base do Cidadão e do Comitê Central de Governança de Dados. O relator dos dois processos é o ministro Gilmar Mendes. Para a quinta-feira, Rosa vai levar a plenário um dos itens da chamada “pauta verde”, conjunto de ações que debatem a legalidade de políticas de proteção ambiental.
Rosa Weber tomará posse com o prédio do Supremo sob esquema de segurança de nível máximo, o mesmo usado durante o 7 de Setembro. Além dos próprios ministros da Corte e dos convidados de Rosa, foram chamados a comparecer o presidente Jair Bolsonaro; os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); e os candidatos ao Palácio do Planalto. São esperadas cerca de 1,3 mil pessoas.
Conhecida como a mais discreta dos integrantes do STF, Rosa terá uma solenidade sem o coquetel nem o tradicional jantar oferecidos por entidades que representam a magistratura. Após os cumprimentos, serão servidos café e água.
Antagonismo a Bolsonaro
Rosa vai ler o discurso elaborado por ela ao longo da última semana. Atendendo a um pedido da ministra, a preleção que será feita a ela, uma tradição das cerimônias de posse do STF, caberá a Cármen Lúcia. Rosa quis que viessem da amiga de tribunal as palavras que a receberão, uma forma de marcar a importância do protagonismo feminino.
Embora não seja uma das ministras mais visadas por Bolsonaro e os aliados dele, Rosa já proferiu decisões importantes que contrariaram os interesses do governo. Na quinta-feira, ela deu continuidade a um pedido de investigação feito por parlamentares de oposição contra Bolsonaro pela disseminação de informações falsas sobre urnas eletrônicas durante reunião com embaixadores, em julho, no Palácio Alvorada. Em 2021, ela suspendeu trechos de decretos presidenciais que facilitariam a compra e o porte de armas e, meses depois, mandou suspender a execução do orçamento secreto, usado pelo governo para turbinar as emendas parlamentares de aliados no Congresso.