Começou a valer nesta última quinta-feira (4) uma reforma do papa Francisco que retira a parcial independência da Opus Dei. A medida, anunciada no final de julho, é apenas uma envolvendo a organização católica ultraconservadora.
Agora, a Opus Dei terá que informar ao Vaticano sobre a situação interna da organização e o desenvolvimento do seu trabalho apostólico. Antes, essa espécie de prestação de contas precisava ser repassada a cada cinco anos.
Na estrutura da Igreja Católica, a organização tinha o status de prelazia pessoal, que a permitia adotar uma hierarquia própria e expandir-se para vários territórios —o prelado, líder da organização, comanda o trabalho de sacerdotes e diáconos. Agora, porém, segundo a determinação de Francisco, o prelado será chamado de protonotário apostólico supernumerário (também designado como monsenhor) e estará impedido de ser considerado bispo e usar anel ou vestes episcopais.
Segundo o papa, o objetivo da mudança é tornar a Opus Dei uma organização “mais baseada no carisma do que na autoridade hierárquica”. O jornal espanhol El País noticiou que Francisco acredita que as mudanças estão em sintonia com as ideias do padre Josemaria Escrivá de Balaguer, fundador da organização.
Acusada por seus críticos de ser uma espécie de seita secreta que busca o controle do poder dentro e fora do Vaticano, a Opus Dei foi criada em 1928. Ela está presente em mais de 60 países e tem 2.000 sacerdotes e 90 mil membros, incluindo políticos e empresários —o presidente do Equador, Guillermo Lasso, é um deles.
Balaguer morreu em 1975. Quase 30 depois, ele foi canonizado pelo então papa João Paulo 2º, num processo criticado por alas da Igreja que associavam o nome do padre ao regime de Francisco Franco na Espanha (1939-1975). O ditador tinha em seu gabinete ao menos três ministros membros da Opus Dei.
Nesta quinta, o porta-voz da organização evitou criticar a decisão papal. “Alguns interpretaram as disposições da Santa Sé como se fosse um rebaixamento ou perda de poder. Não nos interessa esse tipo de dialética, pois para um católico não faz sentido o uso de categorias de poder mundanas”, declarou Manuel Sánchez à agência de notícias AFP.
“Acolhemos o que vem do Santo Padre, com o desejo de aprofundar o que é essencial.”
Ainda no final de julho, quando a medida foi inicialmente anunciada, o atual líder do Opus Dei, padre Fernando Ocáriz Braña, também a minimizou. Segundo El País, o dirigente reforçou para os fiéis que a atribuição de seu cargo como bispo não era essencial e que, para ele, sua principal tarefa era a de “ser um guia, e, sobretudo, um pai”.
O fim da parcial independência da Opus Dei vem dois dias depois de a BBC noticiar supostos crimes cometidos pela organização entre a década de 1990 e o início dos anos 2000. Segundo 43 mulheres espalhadas por Argentina, Bolívia e Paraguai, elas foram submetidas a servidão e exploração pelos padres.
A Opus Dei disse à rede britânica que não há notificação de denúncia por parte das autoridades eclesiásticas, mas anunciou a criação de uma comissão de escuta e estudo —embora tenha afirmado fazer isso por “motivação moral, não legal”.